O que Bolsonaro, EUA e o FMI têm em comum?
Com sede em Washigton, nos Estados Unidos, o Fundo Monetário Internacional (FMI) é o órgão que permite o funcionamento do sistema capitalista, de acordo com os interesses das potências imperialistas, em todo o mundo.
Por Diego Nogueira*
Publicado 27/11/2018 11:06
O fundo foi criado no ano de 1944 com a finalidade inicial de reconstruir países depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Dentre os principais eixos de intervenção, estavam o fomento à cooperação monetária internacional, a estabilidade financeira, o crescimento econômico, a geração de empregos e a diminuição da pobreza.
No entanto, a verdadeira função do FMI tem se revelado evitar que as crises econômicas de distintos países do mundo coloquem em risco os negócios de grandes empresas imperialistas. Os países que compõem o sistema econômico capitalista encontram-se em diversas etapas de desenvolvimento, das quais podem ser classificadas em países desenvolvidos com indústria forte e com grandes multinacionais, países semi desenvolvidos e dependentes e países semi coloniais.
O FMI permite a extração de recursos e riquezas sociais de países dependentes através do empréstimo de grande quantia de dinheiro que superam as condições financeiras dos países devedores. Dessa maneira, o pedinte – sempre país de terceiro mundo – é forçado pelas circunstâncias a adquirir um novo empréstimo para o refinanciamento da dívida, gerando uma relação de dependência com o fundo.
No período das ditaduras militares, a partir da década de 1970, o FMI passou a emprestar para países latino americanos para que pudessem refinanciar suas dívidas externas e construções de obras. Esse processo foi responsável por gerar um ciclo virtuoso de crescimento das dívidas.
Nas décadas seguintes, os países latino americanos tiveram que recorrer a empréstimos de emergência em troca da realização de planos de ajustes. O plano consistia no comprometimento com a política de privatização de suas empresas estatais e a submissão à abertura do livre comércio, ao consumo de produtos do primeiro mundo causando, por fim, terrível desemprego e precarização de serviços públicos como segurança, educação, saúde, etc.
Durante a década de 1990, o FMI impulsionou políticas neoliberais, agravando ainda mais esse brutal quadro de dívidas na América Latina. Esse processo gerou exorbitante pobreza em países como Argentina, Brasil, Bolívia, Equador e Venezuela. Todos esses países, posteriormente, venceriam a agenda neoliberal.
Depois do fracasso causada na América Latina e da crise econômica em 2008 o FMI mudou seu discurso para o público. Empossou uma mulher como presidente, aumentou os recursos para seus empréstimos e renovou o marketing da instituição. O novo discurso consistia na defesa dos mais pobres.
Na prática, o esforço de mudança de imagem do FMI não passava de uma maquiagem. A política seguiu com as afirmações de que são necessários a concessão de maior flexibilidade ao mercado de trabalho, ao aprofundamento das reformas trabalhistas e o ataque aos sindicatos, evidenciando que a dívida é um mecanismo de dominação das potências imperialistas.
A atual crise que vive a Argentina é fruto da política econômica aplicada pelo governo Macri, ajustada aos interesses dos EUA através do FMI. Nesse momento, o país está enfrentando greves de transporte público e aeroportos paralisados. Os organizadores dos protestos calculam que pelo menos um milhão de trabalhadores aderiram à greve com uma única pauta: “Não ao FMI.”
O crédito tem vigência de três anos e, em troca, a Argentina se compromete a reduzir a zero em 2020 seu déficit fiscal, que, no ano passado, foi de 3,9% do PIB. Para atingir essa meta, é necessário interromper as obras públicas, reduzir o tamanho do Estado e limitar as transferências às províncias. Isso significa, novamente, a precarização dos serviços públicos e não garantia de direitos sociais com o objetivo de quitar uma dívida externa criada por uma política de governo retrógrada e alinhada aos interesses do império.
Quem vai suprir a falta do Estado são as empresas privadas estrangeiras, vendendo seus planos de saúde, privatizando cadeias, criando escolas, universidades privadas, enfim, necessidades básicas da população.
Ao que tudo indica, iremos seguir no Brasil a mesma receita do governo Macri. Já existem demonstrações de submissão aos EUA, como ocorreu no caso da declaração de Bolsonaro de que iria transferir a embaixada do Brasil de Tel Avive para Jurusalém. Essa declaração já causou efeitos comerciais negativos com a ameaça de retaliação dos árabes ao comércio dos produtos brasileiros. Outra forte evidência é o distanciamento do Brasil em relação aos parceiros comerciais do Mercosul e China.
Na ditadura, o Brasil cresceu com o endividamento externo. Os débitos nacionais com o FMI somavam US$ 3 milhões no momento em que o primeiro militar assumiu o poder e alcançou a marca de US$ 95,856 milhões em 1985. Com isso, a ditadura fez a economia crescer, principalmente nos anos de governo Geisel (1974-1979).
O Brasil saiu dos anos 1980 como uma potência, porém em crise. Isso quer dizer que a dívida era em dólar e, quem controla essa moeda, não é o Brasil. Com a moeda nacional fraca, a dívida fica cada vez maior. Esse ciclo terminaria com Lula pagando a dívida total com o FMI e deixando uma reserva cambial aproximada em meio trilhão de dólar.
O que faremos com essa reserva no novo governo? Bolsonaro fará o sonho da classe média com o ‘’Bolsa Miami’’, ou seja, valorizará o real, ficará mais barato viajar pra Miami do que para Bahia. Gastar no Brasil ficará mais caro, ou seja, o novo presidente irá quebrar a indústria nacional, esvaziando nossa reserva e desequilibrando a balança comercial. Recentemente, Bolsonaro anunciou que não vai taxar produtos importados, o que levou os industriais brasileiros a um estado de alerta.
Caso o cenário internacional continue com a atual tendência, Bolsonaro fechará o ciclo de oito anos com tranquilidade. Poderá diminuir as nossas reservas para gerar emprego junto às multinacionais ao mesmo tempo que sucateia as estatais e aumenta as empresas privadas do primeiro mundo no Brasil. Quem mais perderá caso essa hipótese se confirme será a indústria nacional.
Conforme o discurso de Paulo Guedes, a prioridade não é o Mercosul. Não iremos priorizar importações e, consequentemente, teremos menos emprego na indústria brasileira.
No entanto, temos muita instabilidade no percurso devido à geopolítica, que não é mais homogênea e comandada pelos EUA. Temos, hoje, uma guerra comercial global contra a Rússia e China impetrada pelos EUA.
Portanto, até mesmo Bolsonaro volta atrás em muitos discursos contra os comunistas chineses, já que qualquer rompimento comercial com a China pode culminar em um rombo comercial.
Essa prosperidade não vai servir de nenhuma maneira para desenvolver e diversificar o país. Ao contrário, só servirá para acentuar suas deformações estruturais, pois esse processo não nos levará a reencontrar a saída da crise.
Como dizia Bolívar numa certeira profecia, os Estados Unidos pareciam destinados pela providência divina a encher a América de misérias em nome da liberdade.
Não será a General Motors e nem a Apple que farão a gentileza de nos levantar novamente como nação soberana e independente.