Publicado 19/11/2018 19:38
A reafirmação pelo presidente eleito Jair Bolsonaro de que "parte" da Petrobras pode ser privatizada é a confirmação de que essa estatal estratégica está, sim, sob ameaça. Ele falou em tom cauteloso sobre o assunto, tentando se equilibrar entre o que se anuncia com a política de privatizações selvagens do seu superministro da economia, Paulo Guedes, e um suposto conceito estratégico da empresa, que deve se limitar ao seu “miolo”, conforme declarou Bolsonaro em entrevista à TV Bandeirantes durante a campanha eleitoral.
O presidente eleito assumiu a agenda entreguista ao dizer que deu “carta branca” a Paulo Guedes para definir a equipe econômica. A indicação de Roberto Castello Branco para presidente da Patrobras faz parte dessa autonomia do chefe da área econômica, conforme admitiu o presidente eleito na entrevista nesta segunda-feira (19). Ele também relembrou que viu “lá atrás com muito bons olhos a questão da Embraer” — a entrega da empresa brasileira com excelência na tecnologia da indústria aérea para a Boeing, gigante monopolista do setor em âmbito mundial.
A convicção de Bolsonaro sobre o papel estratégico da Petrobras — assim como o da Embraer — se revelou totalmente inconsistente quando ele falou à rede de televisão GloboNews sobre o assunto, também durante a campanha eleitoral. Segundo ele, a empresa pode, sim, ser privatizada "se não tiver solução". "Acaba com esse monopólio estatal e ponto final", disse ele. É exatamente o pensamento de Paulo Guedes, o homem da “carta branca”, que em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo no dia 25 de fevereiro deste ano afirmou que a solução para zerar a dívida pública seria “privatizar tudo”.
Não por acaso, ele nomeou Castello Branco para a presidência da Petrobras, um militante da privatização da estatal. Em artigo publicado no jornal Valor em 8 de maio deste anos, intitulado "Privatizações envergonhadas", ele disse que “não faz sentido manter centenas de bilhões de dólares alocados no capital de estatais, exercendo atividades que poderiam ser desempenhadas com sucesso pela iniciativa privada”, exercitando a velha falsa retórica neoliberal de que as privatizações são necessárias para garantir investimentos “em saúde, educação, saneamento básico e segurança pública”.
Desmonte
O vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, também respaldou o anuncio privatista de Bolsonaro. “O núcleo duro, a prospecção e a fonte de inteligência, o conhecimento, não vão ser privatizados. Podemos negociar a distribuição e o refino”, disse ele ao elogiar a indicação de Castello Branco para presidir a Petrobras. “Ele vai manter essa gestão de recuperação que a empresa está passando”, acrescentou Mourão, referindo-se à política de ataques à estatal iniciada com o governo golpista do presidente Michel Temer.
A indicação de Castello Branco coincide com a tramitação no Senado do projeto que autoriza a Petrobras a transferir a petroleiras privadas até 70% de seus direitos de exploração de petróleo na área do pré-sal, que pode ser votado com urgência nesta terça-feira (20). A proposta é de autoria do deputado federal José Carlos Aleluia (DEM-BA). Como bem definiu a Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), num comunicado de agosto deste ano, “a estatal só esteve quebrada na mídia, que criou um clima para facilitar a entrega do pré-sal e o desmonte da Petrobras”.