Bolsonaro pode sim ser alternativa para o mercado
“A agressividade do discurso de Bolsonaro é a aparência de uma agressividade muito maior contra o povo, que é seu projeto de austeridade e privatizante, a serviço dos interesses do grande capital financeiro internacional”.
Por Flávia Calé*
Publicado 06/09/2018 22:07
O tema da igualdade entre homens e mulheres, evidenciado na repercussão da resposta da jornalista Renata Vasconcelos ao candidato Jair Bolsonaro, durante entrevista ao Jornal Nacional, tem ganhado terreno por força do feminismo e das novas gerações que se engajaram profundamente com a pauta de gênero. Essa força social em ascensão, nova, será fundamental para derrotar o conservadorismo do projeto defendido pelo representante da extrema direita na disputa presidencial.
Mas apenas isso não resolve nosso problema. O debate oculto, que não emerge diante do estridente discurso machista, racista e homofóbico é o projeto econômico para o Brasil de Bolsonaro. O discurso de ódio, o jeito agressivo, a defesa do armamento da população dialogam, na aparência, com os anseios de uma sociedade em pânico com a insegurança e o aumento da violência. O que não estamos discutindo é se o projeto para o Brasil que ele defende é a resposta mais eficaz para a defesa da vida e como retomar a geração e o crescimento econômico, esse sim, vetor principal do combate a violência.
O discurso militarista que o candidato encampa destoa do compromisso das Forças Armadas com o projeto nacional. Bolsonaro aderiu integralmente ao projeto ultraliberal defendida pela Escola de Chicago, fortemente representado por Paulo Guedes, seu assessor para temas da economia e principal fiador da sua candidatura frente ao mercado financeiro.
Eles defendem a radicalização do processo desencadeado por Temer após o golpe de 2016. Fundador do Instituto Millennium – instituição criada por setores empresarias e midiáticos para defender a privatização das estatais e a redução dos direitos sociais, combater as políticas afirmativas e de inclusão social e a regulamentação das comunicações – , Paulo Guedes defende a consolidação de uma aliança entre liberais, conservadores e centro-direita para construção de um estado mínimo para o povo e perfeitamente adequado para o mercado. O estado, para eles, tem como sua função principal a defesa da propriedade e não o oferecimento de serviços públicos de qualidade como saúde, educação e investimentos em ciência e tecnologia.
Se a resistência dos movimentos populares contribuiu para barrar a aprovação do fim da aposentadoria com a Reforma da Previdência, a privatização da Petrobras e da Eletrobras, essas propostas voltariam a ganhar força se legitimadas nas urnas, ainda que pela ausência de debate.
A fórmula do congelamento de investimentos, promovido pela Emenda Constitucional 95, já se demonstrou fracassada diante da tarefa principal de qualquer governo que tenha por objetivo tirar o Brasil da crise: a retomada da geração de emprego, dos investimentos e da distribuição de renda. Seu compromisso é com a continuidade desse legado draconiano de Michel Temer, e pior, o seu aprofundamento.
O compromisso com programa ultraliberal de Bolsonaro não causaria nenhum embaraço ao desembarque das elites financeiras nessa candidatura. A agressividade do discurso de Bolsonaro é a aparência de uma agressividade muito maior contra o povo, que é seu projeto de austeridade e privatizante, a serviço dos interesses do grande capital financeiro internacional. A agressividade do discurso da antipolítica é parte da construção da legitimidade necessária para aprofundar o projeto antinacional e antipopular em curso.
Não podemos nos perder na aparência do discurso autoritário de Bolsonaro. Já vencemos o debate sobre armamento no referendo de 2005, e com os argumentos corretos, podemos vencer de novo. É preciso desnudar o programa de Brasil que Bolsonaro e Paulo Guedes defendem e sua ineficácia em promover soluções concretas para os problemas brasileiros.