Mia Couto: 30 anos de vida literária
O escritor moçambicano Mia Couto é um dos principais autores de língua portuguesa. Nascido em 1955, ele se formou em biologia e enveredou para as letras, estudando não apenas o funcionamento da ciência, mas dos homens por meio da escrita e da imaginação. Neste ano, ele completa 30 anos de carreira.
Publicado 17/08/2018 13:58
Começou escrevendo poesia e conquistou prestígio com seus contos e romances, totalizando cerca de 30 obras publicadas. Recebeu o Prêmio Neustadt, tido como o Nobel Americano, além do Prêmio Camões. Seu romance Terra sonâmbula é considerado um dos dez melhores livros africanos do século XX.
Em muitas de suas obras, Mia Couto utiliza neologismos. Segundo ele, isso acontece porque a “narrativa pede”, tentando assim, transpor uma linguagem enraizada. Isso também acontece por meio da influência moçambicana com uso de léxicos de várias regiões do país. Contudo, não querendo cair em estereótipos, em seus últimos livros, Couto diminuiu o uso desse recurso literário.
O autor também é conhecido por estabelecer várias dimensões de leitura, alcançando notoriedade tanto na academia quando com o público geral. De acordo com a professora da USP, Rita Chavez, isso acontece porque o autor trabalha habilmente a imaginação que cativa os leitores fantasia que leva a pensar em coisas sérias, mas que não aprisiona.
Completando 30 anos de carreira, Mia Couto é homenageado pela voz Delmar Maia Gonçalves, Poeta e Presidente do Círculo de Escritores Moçambicanos na Diáspora.
Confira o discurso na íntegra:
Aproveito este momento solene, para parabenizar este ilustre Escritor filho de Moçambique que ganhou a admiração e o respeito do mundo pelos seus feitos nos seus já longos 30 anos de Vida Literária, recheados de sucessos. Depois saudar esta ilustre mesa de tanta gente que aprendi a admirar pela sua sólida obra e um respeitável percurso.
Relativamente ao homenageado, tive contato com a sua escrita primeiro nos jornais e revistas moçambicanas, nos anos quentes da revolução (em que sempre acreditei), pois, de necessária passou a ser imprescindível a independência sonhada e pretendida. Sou um filho da Revolução Moçambicana, mas retirem daí qualquer carga ideológica! Quando lia o jornal “Notícias” ou o Semanário “Domingo” ou ainda a revista “Tempo”, raramente não ensaiava o gesto de procurar um texto, uma crônica, um comentário, um poema, uma história do Mia. Ele desideologizou a palavra açucarando-a.
A escrita dele surge como algo novo e fresco num período conturbado com depressões, tristezas, euforias, alegrias, dramas, melodramas e comédias em simultâneo. E acabou deixando marcas nas águas Índicas.
Não posso deixar de estabelecer um paralelo entre o Mia escritor e o meu saudoso avô Armando Adão Lauchande, um ilustre desconhecido e exímio Contador de Histórias/Estórias Quelimanense. É que o meu avô que sempre foi um excelente anfitrião, bebia o seu óputo, ficava ébrio e tornava-se ainda mais sóbrio. Nunca vira ébrio tão sóbrio na minha vida!
O Mia vai namorando com as palavras, brincando, se divertindo, bamboleando, rindo com prazer, sem nunca deixar de estar sóbrio. Interessante, a literatura pode afinal ser séria e divertida ao mesmo tempo!
Sempre que o meu humilde avô bebia, fechava-se em casa e gritava aos sete ventos que os apologistas da revolução socialista em Quelimane, não tinham nada de socialistas e tinha razão, pelos vistos! Era muito sóbrio e sábio o meu avô!!!
Ainda vi nascer o livro de poemas “Raiz de Orvalho”, que li com muito interesse e que demonstra também que estamos perante um grande poeta de corpo inteiro, para além de romancista, cronista, contista e jornalista. E sabemos que na poesia não há impossíveis, na poesia cabe tudo.
Ficaram-me na retina alguns versos do Poema “Identidade” e que marcam o meu ainda modesto percurso literário “Preciso ser um outro/ para ser eu mesmo / … / Existo onde me desconheço / aguardando pelo meu passado/ ansiando a esperança do futuro/ No mundo que combato/ morro / no mundo por que luto / nasço”.
Seu trabalho de que muito me orgulho, tem sido de enorme inspiração para as novas gerações de moçambicanos no interior do país e nas diásporas, pretendentes a escritores, mas também para outros lusófonos. Seu eterno namoro com a palavra escrita e falada um exemplo.
Mia Couto, hoje tornou-se um Escritor universal, nunca mais será apenas mais um filho da prolífica Literatura Moçambicana. E ainda bem para a Literatura universal, ainda bem para a Literatura Moçambicana, ainda bem para as Literaturas Africanas.
Bem haja por tudo e continuação de muitos sucessos!