Luiz Alberto: A legalidade de Sérgio Moro
Comparemos Flávio Dino e sua sensibilidade patriota, como juiz e governador, com seu companheiro de concurso, com menor pontuação, Sérgio Fernando Moro, ocupado na construção de uma Lava Jato moralista, que destrói um patrimônio industrial e não apenas prende empresários corruptos; e , além disso, sem demonstrar sensibilidade social alguma.
Por Luiz Alberto Gomez de Souza*
Publicado 13/08/2018 11:34
Fiel servidor do sistema. Álvaro Dias declarou, em debate, que gostaria de ter Moro como ministro da justiça. Moro saltaria assim do judiciário para exercer poder no executivo. Diante disso declarou ambíguo: “Reputo inviável no momento manifestar-me, de qualquer forma e em um sentido ou outro…” De Bolsonaro a Alckmin, possivelmente encontraria simpatias para participar de um futuro ministério.
Há bons indícios de que ele teve treinamento no exterior. Segue à risca uma certa legalidade. Qual legalidade? A que o sistema desenha. Dentro dela ele é totalmente coerente e legal. Só pode causar indignação e surpresa quem não percebe sua adequação perfeita a uma sociedade neoliberal. Há que denunciar o sistema, não seus lacaios isolados.
Esta sociedade é ilegítima porque injusta, mas construiu os muros de uma certa legalidade. Para trabalhar na sociedade há que conviver com essa legalidade dominante. É o que fazem os advogados de Lula. Sair dela poderia levar a dois caminhos. Um primeiro, não participar de ritos eleitorais, por exemplo. Seria colocar-se à margem e perder a ocasião de um trabalho educativo de cidadania, dentro do próprio sistema. A construção de uma nova hegemonia parte de uma negação dialética de dentro da hegemonia vigente. A partir dela e contra ela. Outra posição seria simplesmente querer derrubar o sistema. Estariam dando pretexto para os mourões da vida, que não esperam outra coisa para dar um golpe, que chamariam logo de contragolpe. Lembremos 1964.
A transição entre duas legalidades é complexa. Há que partir daquela vigente para superá-la. Nos tempos de nossa consciência histórica contemporânea temos, além disso, que descobrir avanços positivos que todo sistema, por pior que seja, produz. Hoje a ação tem de se fazer por meios democráticos e participativos. Uma eleição pode dar espaços para isso. Encerrar-se num radicalismo não dialético é fazer como o PT em alguns momentos, antes de entrar para o poder, expulsando Bete Mendes ou Luíza Erundina. Ou certas posições de setores do PSOL, mais interessadas em sua coerência, do que em enfrentar as ambiguidades de uma transição. O PC do B parece ter uma clareza maior, mesmo atropelado por um PT autosuficiente. A paciência e o cuidado de Manuela d’Ávila são uma lição nesse sentido. Na mesma direção, a história do Podemos espanhol é interessante. Partiu dos indignados da Catalunha e do M15 madrilenho. Mas logo se apresentou a eleições europeias e nacionais. Elegeu prefeitas de Barcelona e de Madri e hoje dá um apoio crítico ao titubeante PSOE. Ou Portugal e sua “geringonça”, onde os comunistas e a união de esquerdas apoiam o governo socialista. Difícil? Claro que sim, mas com mais futuro do que homiziar-se numa posição absolutista e anti-histórica; para, diriam os franceses, “acheter sa bonne conscience”. Faz uns anos escrevi sobre FHC, antes que entrasse na política, quando era apenas um pensador: a solidão infecunda dos que apenas querem ter razão.
Sintetizando, temos de distinguir entre a clara ilegitimidade do sistema e a legalidade que ele excreta. Nesse sentido, Moro é um caso exemplar. Legal no sistema, ilegítimo na grande história. Segue seu caminho implacável. Nos próximos dias trará o caso pequeno do sítio de Atibaia. Nada de Temer e o caso enorme das docas de Santos.