Governo usa manobra regimental para votar privatização da Eletrobras

Sem votos suficientes, a base do governo na Câmara dos Deputados utilizou uma manobra regimental para votar o requerimento de urgência que permitirá votar o Projeto de Lei 10.332/2018, que cria condições para privatização de seis distribuidoras da Eletrobras. A votação do requerimento recebeu 226 votos favoráveis, 48 contrários e seis abstenções.

Jandira Eletrobras - Reprodução

“Esse requerimento não tem validade presidente. Isso é uma manobra regimental e não podemos admitir que parte do setor elétrico brasileiro seja vendida dessa forma”, denunciou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), vice-líder da oposição, apontando que, apesar da Câmara ter 513 deputados, o requerimento foi aprovado com maioria simples por 130 parlamentares.

“Não vemos legalidade no requerimento feito. Somando aqui o número de deputados pertencentes aos partidos que assinaram, não há 50% mais 1”, afirmou Jandira, reforçando que a manobra não tinha legitimidade, assim como o governo de Michel Temer.

“Um governo que está na margem de erro das pesquisas, ou seja, pode ter zero. E ainda tem aqui uma base em que alguns têm algum suspiro de capacidade de defesa, porque a base do governo não defende aqui mais nem esse governo, não tem mais coragem”, afirmou.

De fato, o governo percebeu que não tinha condições de passar o projeto nas comissões e sem ter os 257 votos necessários para aprovar decidiu apelar para o regime de urgência e com o aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o requerimento utilizado foi o que exige apenas maioria simples, isto é, apoio de metade dos presentes, com quórum mínimo de 257, o que pode, no limite, ser apenas 129 votos a favor de acelerar a matéria.

Sem a medida, o projeto teria que passar pelas comissões, o que praticamente inviabilizaria a realização dos leilões ainda este ano, como planeja Temer.

Resistência

A oposição já anunciou que vai barrar a manobra. Deputados dos estados das seis distribuidoras que serão privatizadas prometem resistência à proposta e o quórum está baixo por causa da proximidade da eleição e a Copa do Mundo.

O projeto trata de seis distribuidoras: Amazonas Energia, Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron), Companhia de Eletricidade do Acre (Eletroacre), Companhia Energética de Alagoas (Ceal), Companhia de Energia do Piauí (Cepisa) e Boa Vista Energia, de Roraima.

Para o líder do PCdoB na Câmara, deputado Orlando Silva (SP), a manobra feita para aprovar o requerimento empobrece o debate político e a condução política do Parlamento, subordinando a Câmara dos Deputados a um governo que persegue o desmonte do Estado.

“Uma empresa como a Eletrobras, com a capacidade instalada que possui, é fundamental para que o Brasil alcance um patamar superior de desenvolvimento. Liquidar a Eletrobras, assim como desejam no limite liquidar o polo público bancário – Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal – ou mesmo a Petrobras e outras empresas estatais estratégicas, significa renunciar à possibilidade de o Brasil afirmar um projeto de nação”, completou.

Apesar da aprovação do requerimento de urgência, a dificuldade do governo será garantir o quórum. A oposição informa que vai obstruir a votação e a base aliada tem divergências sobre o texto. Além disso, o governo precisará convencer o Senado Federal a aprovar o texto em menos de uma semana para garantir a o leilão, previsto para 26 de julho.

O objetivo é votar o projeto ainda nesta quarta-feira (4), na sessão extraordinária, já que a proposta é um projeto de lei ordinária e depende apenas de maioria simples.

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) classificou a manobra como “vergonhosa”. “Querem colocar à venda o setor elétrico brasileiro com apenas 130 votos”, disse o deputado.

Para a deputada Erika Kokay, a venda das distribuidoras vai penalizar a população e o desenvolvimento social e econômico dos estados de atuação das estatais. “Por que penalizar os estados do Norte? A iniciativa privada que tem sob seu patamar apenas o lucro não vai querer levar energia barata para essas comunidades. É um crime contra a nação o que está acontecendo aqui”, afirmou Kokay.

Animado

A manobra deixou o presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr., empolgado. Em entrevista à rádio CBN, nesta quarta-feira (4), ele disse que está otimista sobre a votação pela Câmara.

“O projeto é muito curto e apenas dá de fato as condições necessárias para que todas as distribuidoras sejam colocadas nesse leilão”, afirmou.

Com a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que entende que privatizações precisam ser aprovadas pelo Legislativo, a distribuidora de Alagoas deve ficar de fora do leilão. Segundo Ferreira Júnior, será preciso esperar o retorno do STF do recesso. “Teremos de esperar o mês de agosto, quando o STF retoma suas atividades, para poder encaminhar os procedimentos determinados pelo ministro Lewandowski”, afirmou. A distribuidora de Piauí, entretanto, deve integrar o leilão.