Prisão após segunda instância viola a Constituição, diz jurista
Advogado criminalista, Alamiro Velludo Salvador Netto, professor titular do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, afirma que “esse debate que agora está sendo equivocadamente vinculado de maneira exclusiva ao ex-presidente Lula, no fundo, é sobre qual o limite do poder do Estado brasileiro para começar a punir uma pessoa”.
Publicado 21/03/2018 15:17
“O grande problema é quando o Judiciário, talvez atendendo ao clamor social, resolve passar por cima do texto legislativo e – mais do que isso – do texto da Constituição”, afirma. A entrevista foi concedida ao Blog do Sakamoto.
Segundo ele, “do ponto de vista social, é óbvio que a sociedade pode ter um sentimento de que é preciso cumprir a pena antes. É um sentimento até aceitável em razão da criminalidade brasileira. Mas esse tipo de sentimento tem que se infiltrar na racionalidade jurídica por meio de uma alteração legal e não por meio de uma decisão de uma corte constitucional, que – neste caso – entende contrariamente àquilo que o próprio texto constitucional diz”.
Ela frisa que, “ao contrário de outros países, a exemplo da Espanha e da Itália, que falam simplesmente em garantir a presunção de inocência, no Brasil, a literalidade constitucional fala de trânsito em julgado”.
De acordo com o defensor, “quando o novo debate do Supremo Tribunal Federal ocorre em cima da discussão sobre o ex-presidente Lula dá a impressão que tudo se volta à questão de sua condenação”. “Mas existe uma série de pessoas no Brasil que está nessas condições, que está cumprindo penas antecipadas, pelo menos, ao meu ver, de forma contrária à Constituição”.
“É importante destacar que a decisão originária do Supremo Tribunal Federal sobre a prisão em segunda instância, em 2016, se deu no debate de um habeas corpus que julgava um roubo em Itapecerica da Serra. Portanto, não tinha nada haver com corrupção ou crime do colarinho branco [Um homem, filho de uma trabalhadora empregada doméstica e que trabalhava como assistente de garçom, foi acusado de roubar R$ 2.600,00 de outra pessoa na rua e jurava inocência nesse município da Grande São Paulo]”, diz. “O problema é se, de fato, a sociedade brasileira está disposta a romper com a dimensão de presunção da inocência. De romper com aquele pacto constitucional de 1988.”