Publicado 16/02/2018 10:58
O documento, publicado em dezembro do ano passado, aumenta o valor da diária de internação paga aos hospitais psiquiátricos e amplia de 15% para 20% o número de leitos psiquiátricos nessas unidades, entre outras mudanças.
Para o presidente do Conselho, Ronald Ferreira, a medida representa um “retrocesso” no tratamento dado aos pacientes da saúde mental porque incentiva a cultura da hospitalização.
“É uma lógica que já tinha sido descartada como absolutamente inefetiva, com sérios danos à saúde e à própria dignidade humana, que é a lógica da segregação”, complementa.
Ferreira acrescenta que, com a publicação da Lei da Reforma Psiquiátrica, em 2001, o Brasil vinha avançando na luta antimanicomial, que já dura 30 anos. Com base nisso, o país construiu a chamada Rede de Atenção Psicossocial (Raps), que se baseia na lógica do atendimento humanizado e multidisciplinar aos usuários dos serviços de saúde mental.
A Portaria 3588 interfere diretamente na Rede. Entre outras coisas, a medida exige uma taxa de ocupação de 80% dos leitos de saúde mental nos hospitais gerais como condição para que a instituição receba a verba de custeio do serviço.
O diretor da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Leonardo Pinho, destaca que esse seria um dos aspectos mais críticos da Portaria. A entidade reforça que a norma bate de frente com os princípios do tratamento humanizado porque incentiva as internações.
“A política moderna de saúde mental é pautada na inclusão social, na inclusão de sociabilidade, e num cuidado, num tratamento mais próximo ao local de moradia, evitando internações de longa permanência. O resumo do grande retrocesso [trazido pela Portaria] é este: o Brasil volta 30 anos pra trás”, afirma.
Pinho é membro do Conselho Nacional de Direitos Humanos, que, no mês passado, também recomendou ao Ministério da Saúde a revogação da portaria. Os dois conselhos afirmam que não foram ouvidos pelo governo a respeito das mudanças.
Outras entidades da sociedade civil organizada apontam o mesmo problema. A psiquiatra Miriam Aboud-yd, da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial (Renila), destaca que a alteração Polícia Nacional de Saúde Mental sem diálogo com outros atores fere a legislação vigente, inclusive a Constituição Federal, que garante o controle social.
“O que esperar de uma política construída sem parceria com todas as profissões que devem compor e sustentar essa política? Sem democracia, não existe politica de saúde mental”, afirma.
O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde a respeito da recomendação do CNS. Em resposta, o órgão não informou se pretende seguir a orientação do colegiado e disse apenas que “a portaria foi amplamente debatida com a sociedade, contando com o apoio de mais de 60 entidades”. O Ministério também argumentou que a medida traz melhorias para a rede de atendimento a pacientes com transtornos mentais.