Universidade pública, gratuita e de qualidade
Em meio à grave crise econômica, é comum que surjam discussões a respeito do orçamento público. Muitas são as medidas que, no último período, transformam direitos em gastos excessivos: a Emenda Constitucional 95, que congela os gastos nos próximos 20 anos; a reforma trabalhista; a reforma da Previdência etc.
Por Marianna Dias, Gabriel Beré e Sergio (Kyo) Kobayashi*
Publicado 29/12/2017 13:12
A educação superior pública e gratuita também está sob ameaça. Com problemas de financiamento, diretamente ligados à crise econômica, muitas universidades têm dificuldades em cobrir seus gastos.
Somam-se a isso as investidas da PF e Ministério Público contra as direções universitárias da UFMG e UFSC, esta última levando ao suicídio o ex-reitor Luiz Carlos Cancellier. Sob o pretexto do combate à corrupção, atacam a presunção da inocência e fortalecem o discurso daqueles que tentam deslegitimar as universidades públicas. Apesar disso, dentre as 30 melhores universidades do país, 28 são públicas, segundo ranking da própria Folha.
Nesse contexto, esta Folha lançou editorial em defesa da cobrança de mensalidades para estudantes de USP, Unicamp e Unesp como forma alternativa de financiamento. Proposta antiga, que remete ao período do regime militar com os Acordos MEC-Usaid (agência dos Estados Unidos para o desenvolvimento internacional).
Para discutirmos a crise de financiamento dessas universidades, é indispensável lembrarmos que sua principal receita advém do ICMS, imposto regressivo e que perpetua desigualdades. Também é preciso pensar mecanismos que deixem o orçamento menos sujeito às flutuações econômicas.
Repensar o financiamento da universidade por meio de uma reforma tributária progressiva, onde quem tem mais pague mais e quem tem menos pague menos é parte deste processo. A democratização do acesso por meio das cotas sociais e raciais e a garantia de instrumentos de permanência para esses estudantes são também essenciais na concretização do projeto de universidade pública que defendemos.
O discurso simplista de redução de desigualdades a partir da cobrança de mensalidades esconde um projeto de Estado, uma vez que essa alteração não acabaria com as injustiças históricas que se perpetuam no país, e teria até mesmo um efeito contrário. A resposta a qualquer período de dificuldade financeira passará a ser sempre a extensão da cobrança a ponto de se tornar barreira para a permanência de parte dos alunos.
É preciso pensar que o perfil dos estudantes de universidades públicas mudou nos últimos anos: atualmente, 85% têm renda familiar de até 3 salários mínimos.
Entendemos que é essencial aumentar o diálogo e a participação da sociedade nas instituições públicas de ensino. Apesar de o Datafolha apresentar que 57% da população paulista são contra a cobrança de mensalidades e que 55% achem o ensino dessas universidades bom ou ótimo, é preciso ir além.
Consagrada na Constituição, a gratuidade do ensino superior faz parte de um entendimento mais amplo do papel da universidade pública. Sua função não é só formar alunos para o mercado de trabalho.
Não se trata, portanto, de defender privilégios. A luta contra a cobrança de mensalidades e pelo fortalecimento das universidades públicas é uma luta em defesa do país que queremos: justo, soberano e democrático.
Marianna Dias é estudante de Pedagogia da Universidade Federal da Bahia e presidenta da UNE (União Nacional dos Estudantes)
Gabriel Beré é estudante da Faculdade de Direito da USP, é diretor do DCE-Livre (Diretório Central dos Estudantes) da USP – Alexandre Vannucchi Leme
Sergio (Kyo) Kobayashi é mestrando em Teorias do Texto e do Discurso, é diretor do DCE-Livre da USP