Publicado 29/11/2017 13:34
“Como tem sido recorrente nas posições doutrinárias do Banco (Mundial) e de seu coirmão neoliberal, o Fundo Monetário Internacional (FMI), estamos diante de mais uma explícita manipulação ideológica para empurrar goela abaixo da sociedade brasileira a reforma previdenciária imposta pelo governo Temer, e cuja consequência inexorável seria ferir de morte, mais do que já se feriu, a dinâmica da economia.”
É assim que os autores do documento A Reforma Previdenciária Querida do Banco Mundial (leia abaixo), editado pela Fundação Perseu Abramo e divulgado nesta terça-feira (28), iniciam a coletânea de quatro artigos que refletem a percepção comum em relação ao recente estudo anunciado pelo Banco Mundial na semana passada, “Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”.
O caderno traz artigos de Márcio Pochmann, Reginaldo C. Moraes, J. Carlos de Assis e Luiz Gonzaga Belluzzo. Em comum, os autores abordam as questões da rejeição da maior parte da reforma previdenciária proposta por seu caráter iníquo.
De acordo com o documento, questões mais fundamentais como a política financeira (juros básicos sobre a dívida pública), a política tributária (tributar mais os mais ricos) e a questão financeira dos estados federados, que estão sendo expropriados pela União, deveriam ser resolvidas antes daquilo que chamam de reforma previdenciária.
O primeiro artigo, “Gasto público, Justiça Tributária e Desigualdade”, assinado por Pochmann, afirma que a tese do Estado abusivamente arrecadador e excessivamente gastador não passa de uma ilusão inventada pelos inimigos do poder público no Brasil. “Ao se considerar, por exemplo, as últimas quatro décadas, constata-se o avanço inegável da contradição entre a evolução da receita tributária bruta e líquida do Estado brasileiro”, afirma.
O economista afirma, ainda, que hoje, guardada a devida proporção, o condomínio privilegiado de interesses que sustentam o governo Temer adota uma cantilena ao propagar que o Brasil somente sairá da grave situação nacional pela redução dos gastos públicos não financeiros. “Com isso, o segmento majoritário dos brasileiros que forma a base da pirâmide social vem sendo excluída das políticas públicas diante do desmoronamento do Estado de bem-estar social.”
O segundo artigo, “Os urubus do Banco Mundial estão de volta. E daí?”, de Reginaldo Moares, questiona a relevância de estudos nos moldes do Banco Mundial para a formulação de políticas públicas brasileiras. Para o autor, a relevância é nula.
“A não ser para funcionar como um carimbo de ‘autoridade científica’ badalada por uma imprensa subalterna e desmiolada. Qualquer bula papal de antanho, calcada em ortodoxia autodemonstrada, tem mais consistência do que esses ‘estudos’. Como as bulas papais e as sentenças dos juízes, esses papéis do Banco Mundial vêm rotulados como a voz da verdade – daí sua relevância para a propaganda. De fato, porém, não são mais do que a voz dos donos”, afirma o autor.
O próximo artigo do documento é do economista Carlos de Assis. Com o título “O que falta no relatório do Banco Mundial”, o autor critica o banco por “ao lado dessa infâmia, o Banco Mundial sequer menciona a possibilidade de queda da taxa de juros básica. (…) Ao contrário, concentra-se nas recomendações na redução dos custos da Previdência, usando uma linguagem ambígua perfeitamente aceitável de redução de privilégios dos ricos, porém para cortar benefícios também de pobres, sabendo que a primeira terá resistências políticas mas a última não”.
Para o autor, apenas a omissão do peso dos juros nas contas públicas já serviria para desqualificar tecnicamente o relatório do Banco Mundial. A conta de juros, de 5 a 6% do PIB, é justamente o que propõe o banco em termos de cortes nas despesas governamentais, 7% do PIB, inclusive dos entes subnacionais. “Especificamente neste caso, o relatório omite também que a crise previdenciária dos estados, onde existe, se deve essencialmente à dívida junto ao governo federal imposta indevidamente aos entes federados desde 1997”, afirma o texto.
Encerra o compilado o texto “Ascensão e queda da ideologia neoliberal”, de Luiz Gonzaga Belluzzo.
No artigo, o economista avalia que “no admirável mundo novo, de ajustamentos rápidos e alta volatilidade de preços dos ativos, países dotados de moedas frágeis, com desprezível participação nas transações internacionais, encontram-se diante do risco de uma procissão de desgraças: valorização indesejada da moeda local, operações de esterilização dos efeitos monetários da expansão das reservas (explosão da dívida pública), deficits insustentáveis em conta corrente e finalmente crises cambiais e financeiras”.
“Em um sistema internacional ‘regulado’, como o desenhado em 1944, em Bretton Woods, as regras do jogo eram as seguintes: taxas fixas, mas ajustáveis, de câmbio, limitada mobilidade de capitais e cobertura de deficits em transações correntes atendida por uma instituição pública multilateral.”
“Agora, o que está se vendo é uma recorrência retardada de um discurso que fracassou de forma absoluta nos últimos anos, seja do ponto de vista da própria ideologia, seja do ponto de vista histórico. Agora não são apenas os oponentes do neoliberalismo que apontam suas inconsistências teóricas e práticas, mas também antigos proponentes dessa doutrina – seria muito falar em teoria –, como se vê num recente ensaio de Olivier Blanchard e Lawrence Summers (“Rethinking Stabilization Policy. Back to the Future”), campeões arrependidos do neoliberalismo.”
O objetivo do documento, segundo seus editores, é prover informações suficientes para que o leitor possa tirar conclusões equilibradas sobre a reforma da Previdência. “Do nosso ponto de vista, e com base nos argumentos rigorosos e científicos que estamos apresentando, ela [reforma da Previdência] não se justifica, mesmo que tenha alguns poucos pontos defensáveis, mas pelos quais o relatório passa rápido, por ameaçar interesse dos ricos.”
Ainda de acordo com os editores do material, questões mais fundamentais como a política financeira, a política tributária e a questão financeira dos estados federados, que estão sendo expropriados pela União, deveriam ser resolvidas antes daquilo que chamam de reforma previdenciária.
Confira a íntegra do documento: