América Latina resiste: o neocolonialismo e a educação
A questão educacional, neste momento de crise civilizacional, é de grande complexidade e coloca novos desafios para o movimento sindical dos trabalhadores em educação-docentes e técnicos administrativos.
Por Maria Clotilde Lemos Petta*
Publicado 23/10/2017 19:03
A globalização neoliberal resulta na nova divisão internacional do trabalho, cabendo às economias periféricas franquear seu espaço econômico à penetração das grandes empresas transnacionais. De forma crescente, verifica-se a presença do capital especulativo internacional na compra de instituições privadas de educação e na gestão de instituições públicas de ensino dos países periféricos. Cabe também destacar as ações das grandes corporações, que, sob a hegemonia dos EUA, transitam e se articulam na esfera transnacional, realizando acordos comerciais internacionais para incluir a educação e outros serviços públicos como serviço/mercadoria.
Na segunda década do século XXI, esse processo de reversão colonial atinge a América Latina e o Caribe, provocando retrocessos no movimento progressista e democrático, e de integração dos países do continente e suas instituições (Alba, Unasul, Celac, Mercosul). Este processo reforça a crescente privatização e financeirização da educação, colocando grandes entraves para a concretização de um projeto de educação latino-americano e caribenho, comprometido com o desenvolvimento soberano, sustentável e de integração do continente.
Nesse contexto, crescem os movimentos de resistência dos trabalhadores ao processo de globalização neoliberal que atinge o continente. As organizações sindicais dos trabalhadores em educação têm desempenhado importante papel nesse processo. No entanto, permanece o grande desafio da construção da unidade das diversas organizações sindicais dos trabalhadores em educação em torno de plataformas de resistência contra o projeto neoliberal no continente.
A Contee tem priorizado na sua política internacional a participação nos fóruns e espaços do movimento sindical dos trabalhadores em educação, vinculados à luta anti-hegemônica na América Latina e no Caribe. Nessa perspectiva, na primeira semana de outubro, como representante da Contee, integrei a delegação brasileira no encontro que ocorreu no marco da reunião da Executiva da Confederação dos Educadores Americanos — CEA e do Congresso da Federação Nacional dos Docentes das Universidades Nacionais — Fedun (Argentina). Além de diretores da CEA e da Federação de Sindicatos de Docentes Universitários da América do Sul — Fesiduas, estiveram presentes representantes sindicais das organizações do Brasil (Contee e APUBH), Venezuela (FTUV), Cuba (SNTED), Colômbia e México (Stunam e SNTE), Panamá (Frep), Peru (Fendup) e Equador (Fenapupe), bem como dezenas de organizações por local de trabalho da educação superior.
O debate ocorrido nesse encontro foi muito rico. As experiências e relatos sobre a situação da educação nos países da América Latina e do Caribe reforçam a compreensão de que a ofensiva do capital contra o trabalho impacta de forma perversa na educação e coloca grandes obstáculos à organização das lutas dos trabalhadores no continente. Um destaque nesse debate foi a compreensão de que a luta pela descolonização da educação deve integrar a pauta não somente dos trabalhadores em educação, mas ser assumida pelo conjunto do sindicalismo classista dos trabalhadores do continente.
Nesse encontro foi aprovado um manifesto e uma agenda para o próximo período Destacamos nessa agenda eventos de muita importância que estão programados para o próximo ano. Neste ano, em novembro, reunião da Assembleia Geral do Parlamento Latino-americano e Caribenho — Parlatino, na Cidade do Panamá (República do Panamá) nos dias 23 e 24 de novembro. De 12 a 16 de fevereiro de 2018, o Congresso Internacional da Educação Superior “Universidade 2018”, sobre o tema “A Universidade e a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável”, em Havana (Cuba). Entre os dias 11 e 15 de junho de 2018 será realizada a Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e no Caribe 2018 – Cres 2018, na Universidade Nacional de Córdoba (Argentina), no marco das comemorações dos cem anos da Reforma de Córdoba.
Cabe também registrar que, além dessa agenda aprovada na reunião da CEA, outras organização têm eventos marcados. De 16 a 18 de novembro, em Montevidéu (Uruguai) haverá a Jornada Continental pela Democracia e contra o Neoliberalismo e, no Brasil, em Belo Horizonte, o VI Encontro Movimento Pedagógico Latino-Americano, coordenado pela Internacional da Educação da America Latina (Ieal). Para o próximo ano, já está programado o Congresso Internacional da Federação Internacional dos Sindicatos dos Educadores (Fise/FSM), em março, na Cidade do México, organizado em parceria com a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE/SNTE).
Esses diversos eventos organizados por diferentes organizações demonstram que, em que pesem todos os desafios, os trabalhadores em educação têm resistido no enfrentamento ao processo de reversão colonial que atinge todo o continente. O desmantelamento da educação pública, o rebaixamento da qualidade da educação, a precarização das condições de trabalho e do salário dos trabalhadores em educação e o perverso processo de desprofissionalização docente devem ser compreendidos nesse contexto, assim como as lutas educacionais e trabalhistas dos trabalhadores em educação devem se vincular às lutas nacionais de caráter anti-imperialista, assumindo necessariamente uma dimensão internacional.
Nesse quadro, é preciso avançar na organização e mobilização dos trabalhadores em educação na resistência contra a ofensiva da política imperialista — o neocolonialismo do século XXI — na educação latino-americana e caribenha.