PM acusado de matar sem terra com tiro pelas costas em 2009 é julgado
Trabalhador rural foi morto com um tiro pelas costas em agosto de 2009, durante ação de reintegração de posse.
Publicado 22/09/2017 10:01
Começou na manhã desta quinta-feira (21) o júri popular do policial militar Alexandre Curto dos Santos, acusado de assassinar com um tiro pelas costas o trabalhador rural do Movimento dos Sem Terra Elton Brum da Silva em 21 de agosto de 2009, durante uma ação de reintegração de posse da Fazenda Southall, em São Gabriel.
O julgamento iniciou por volta das 9h30 com a seleção do júri do brigadiano e deve se estender até esta sexta-feira (22). Integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) se concentraram em frente do For Central com faixas e bandeiras.
Em conversa com a imprensa antes do julgamento, o advogado do brigadiano, Jabs Paim Bandeira, afirmou que o argumento da defesa é que houve uma troca de munição por engano “em um clima de guerra”, de desobediência de uma ordem judicial e de agressões dos sem-terra. O brigadiano que fez o disparo teria visto um vulto se dirigindo a um brigadiano a cavalo e fez o disparo sem saber que estava com munição letal.
O promotor Eugênio Paes Amorim, entretanto, contesta essa versão, dizendo que a vítima estava sendo agredida e que o disparo teria matado o sem-terra mesmo que tivesse sido com bala de borracha, pois foi efetuado a uma distância entre 3 e 5 metros, conforme a perícia, contrariando as normas da própria Brigada Militar.
A viúva de Elton esteve presente no Foro para acompanhar o julgamento.
O assassinato
O assassinato de Elton Brum da Silva ocorreu durante uma violenta e arbitrária reintegração de posse da Fazenda Southall, um latifúndio com cerca de 10 mil hectares localizado em São Gabriel, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. A ação truculenta da Brigada Militar contra cerca de 500 famílias do MST resultou em dezenas de feridos e na morte Brum, aos 44 anos. Ele deixou a esposa e uma filha menor de idade.
O assassinato do Sem Terra ocorreu à queima roupa, com um tiro pelas costas de espingarda calibre 12. À época, o policial militar Alexandre Curto dos Santos, que agora vai a júri popular, atuava no Pelotão de Operações Especiais do 6° Regimento de Polícia Montada (RPMon) do município de Bagé. Durante o processo, Curto assumiu ter sido o autor do disparo.
O comando da BM teria recomendado aos policiais prudência e o uso de munição não-letal. O disparo fatal, no entanto, foi efetuado com munição real, a curta distância e pelas costas, ou seja, tornando impossível a defesa da vítima. Conforme os advogados da assistência da acusação, “é expressamente proibido pelos regulamentos internos da polícia, por ordenamento jurídico e pelos tratados internacionais a utilização de munição letal durante a realização de despejos forçados de famílias e movimentos sociais”. O policial militar alegou ter agido em legítima defesa e ter trocado acidentalmente sua arma com a de um colega, que possuía a munição letal.
No ano passado, o Estado do Rio Grande do Sul foi condenado a indenizar a família de Brum, por danos morais, e com uma pensão de um salário mínimo regional à filha até a sua maioridade. Porém, passados mais de oito anos do assassinato, a mãe, a filha e o pai da vítima ainda aguardam o pagamento por precatório.
Desapropriação
Após várias lutas do MST na região da Fronteira Oeste, parte da fazenda Southall, que não cumpria sua função social, foi desapropriada para assentar famílias acampadas no Estado. A área onde Brum foi assassinado recebeu o nome de Assentamento Conquista do Caiboaté e hoje abriga 225 famílias, sendo referência na produção agrícola da região.