Imperatriz e a crítica ao agronegócio são destaque no carnaval carioca
Terceira a desfilar neste domingo (26) na Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro, a Imperatriz Leopoldinense leva para a avenida o polêmico samba-enredo Xingu, o Clamor que vem da Floresta. O tema desperta a ira dos ruralistas desde o início de janeiro, quando foi anunciado.
Publicado 27/02/2017 09:44

Em meio críticas, reclamações, campanhas de difamação e até ameaças, como do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), de abrir CPI para apurar irregularidades na escola, não faltou apoio à agremiação, vinda de organizações indigenistas, ambientalistas, de combate aos agrotóxicos e transgênicos e em defesa da agroecologia e da reforma agrária.
A Comissão Pastoral da Terra (CPT), foi a última a se manifestar. Na última quarta-feira (22), divulgou nota assinada em conjunto com o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e o Serviço Pastoral do Migrante (SPM) destacando que os ruralistas estão se sentindo agredidos pela temática da escola, sobretudo com a ala "Os fazendeiros e seus agrotóxicos".
Confira a íntegra da carta de apoio do CPT:
O carnavalesco Cahê Rodrigues, ao responder às críticas, diz que o samba quer simplesmente defender o indígena, dar voz a ele, por isso“ tudo que agride a floresta, o meio ambiente e, diretamente o índio, nós precisamos citar. Porque o enredo não é um conto de fadas. É uma história real”.
Como se pode entender tamanha celeuma em torno a um tema de escola de samba?
O fenômeno encontra na história suas raízes mais profundas. Desde a invasão portuguesa o território brasileiro tem sido considerado propriedade exclusiva dos invasores.
Os povos indígenas e, posteriormente, os descendentes de escravos libertos, os quilombolas, e outras comunidades de pobres no campo, que ocupam parcelas do território nacional, têm sido até hoje sistematicamente invisibilizados, como se não existissem. E no decorrer da história foram arrancados de seus territórios por diversos mecanismos de espoliação.
Os que tentam resistir são tratados como empecilhos ao desenvolvimento e progresso de nosso país, sofrem perseguições e violências e, muitas vezes, perdem a própria vida, como as 61 pessoas que foram assassinadas devido aos conflitos no campo em 2016, segundo dados parciais da CPT, o maior número de assassinatos desde o ano 2003. Deste total, 12 são indígenas.
Somente com muita luta e determinação é que os indígenas e quilombolas conseguiram introduzir na Constituição Federal de 1988 dispositivos que reconhecem sua existência e os direitos sobre seus territórios, sua cultura e seus modos de viver.
As entidades que reagiram contra o enredo da escola de samba defendem um agronegócio apresentado como pop pela grande mídia. Mas, um pop que mata! Mata a terra e os demais seres que dela vivem. Inúmeras situações no Brasil denunciam os impactos nocivos das atividades do agronegócio sobre o meio ambiente, a saúde humana e a violação aos direitos básicos das pessoas.
A escola de samba Imperatriz Leopoldinense já se pode considerar vencedora do carnaval carioca de 2017, por estar resgatando da invisibilidade histórica os povos indígenas do Brasil e denunciando as agressões constantes que sofrem em seus territórios, em seus modos de vida e cultura.
As pastorais do campo, que buscam através de suas ações valorizar as comunidades com as quais trabalham, escutando suas histórias, seus apelos, seus sonhos, querem parabenizar a Escola e o carnavalesco Cahê Rodrigues por esta escolha histórica.