Publicado 22/11/2016 08:32
Era 21 de novembro de 1962, às 20:30hs, Carnegie Hall, Nova York, quando uns meninos subiam ao palco para mostrar um tal balançado da New Brazilian Jazz, como os americanos gostavam de dizer. Quem eram estes meninos? Ninguém menos do que Oscar Castro Neves, Sérgio Mendes, Roberto Menescal, Carlinhos Lyra, Chico Feitosa, Milton Banana, Caetano Zama, Sérgio Ricardo, Normando Santos, Dom Um Romão, Luiz Bonfá, Agostinho dos Santos, João Gilberto e Antonio Carlos Jobim, que à época já era famoso nos Estados Unidos como o compositor de “Desafinado”; enfim, o fino da bossa tinha a missão de provar que o Brasil era capaz de produzir música sem pandeiro.
É claro, reunir tantas estrelas principiantes geraria muita desconfiança até nos próprios músicos. O concerto só foi possível diante de uma parceria entre a gravadora americana Audio-Fidelity e o Itamaraty. Mas foi justamente na escolha do elenco que começou a confusão. Muita gente boa ficou de fora, como João Donato (e sua “Rã”) e Johnny Alf, que em 61 já havia gravado seu sucesso “Rapaz de bem”. Alguns que se achavam bambas no violão não foram convidados pela induvidosa ausência de qualidade. Inclusive, apareceu gente ressentida que bateu o pé, alegando que Bossa Nova não se misturava com passistas e ritmistas.
Por sua vez, a imprensa brasileira fez pouco caso e foi muito cruel na cobertura, exagerando nas piadas. O fato é que era esperado um verdadeiro desastre na apresentação dos brasileiros, coisa que preocupava principalmente Tom Jobim, João Gilberto e Luiz Bonfá, nomes que já corriam por ouvidos estrangeiras. Tanto é verdade que Tom Jobim só embarcou depois de ser enfiado à força dentro de um avião pelo amigo e escritor Fernando Sabino: “Você vai vencer, Tom”.
Muitos deslizes aconteceram de verdade, como Normando Santos cantando com o microfone desligado, Roberto Menescal escorregando na letra de “O barquinho” e o próprio Tom pedindo um minutinho para recomeçar “Corcovado”. Por uma razão apenas as suspeitas de Tom não se transformaram em sua tragédia pessoal: quando “Corcovado” entrou nos eixos, e ele cantou a letra toda, em português e inglês, a plateia só faltou se jogar aos seus pés. E é válido ressaltar que no distinto recinto estavam Tony Bennett, Dizzy Gillespie, Miles Davis, Gerry Mulligan, Herbie Mann, entre outros que também queriam escutar de perto o violão de João Gilberto. Por esta razão, este foi o escolhido para encerrar o concerto, deixando Sérgio Mendes responsável pela abertura. Com certeza, ficaram bastante impressionados com “Samba da minha terra”, “Desafinado” e “Outra vez”.
Alguns só voltaram para casa muito tempo depois, como foi o caso de João Gilberto, Tom Jobim, Sérgio Ricardo e Oscar Castro Neves, para citar alguns. A partir desta noite, a vida da Bossa Nova mudou completamente. A música “Desafinado”, por exemplo, foi gravada onze vezes nos Estados Unidos no mesmo ano, sendo uma delas com tiragem de um milhão de discos. Durante anos, o áudio do espetáculo (fita-pirata) permaneceu como moeda rara nas mãos de colecionadores. Hoje em dia já é possível ser encontrado em versões modernas de gravação, com o charme dos aplausos e todo o resto de um show ao vivo, mas a dificuldade de encontrar é a mesma. Qualquer esforço neste sentido vale, pois estará lá parte da história da música brasileira, pérolas, por assim dizer, como “Manhã de Carnaval” (com Agostinho dos Santos, Luiz Bonfá e Oscar Castro-Neves), “Zelão” (com Sérgio Ricardo e Milton Banana), “Passarinho” (com Chico Feitosa), “Amor no samba” (com Normando Santos e Oscar Castro-Neves) e “Influência do Jazz” (com Carlinhos Lyra e Oscar Castro-Neves. Como disse Vinicius de Moraes, “a Bossa Nova voltou mais uma vez para ficar por toda a vida”. Que assim seja, poetinha.