Realidade contradiz discurso de Temer, aponta economista
A atividade econômica no país continua a cair, agora em ritmo ainda mais acelerado. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) teve retração de 0,91% em agosto – a maior queda em 15 meses – e de 5,6% nos últimos doze meses. Trata-se de mais um indicador negativo, que contradiz o discurso de Michel Temer de que já há uma recuperação. Para o professor de Economia da PUC-SP, Antonio Corrêa de Lacerda, os dados mostram que o diagnóstico do governo não bate com a realidade.
Publicado 20/10/2016 17:45
O IBC-Br foi criado para tentar antecipar o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) e incorpora informações sobre o nível de atividade dos três setores da economia: indústria, comércio e serviços e agropecuária, além do volume de impostos.
O resultado divulgado nesta quinta (20) se soma a outros, também negativos, que apontam quedas na produção industrial, no comércio, na arrecadação e no emprego.
“Há uma clara contradição, porque o discurso do governo é de que, em função da posse do Temer, do envio da PEC 241, do advento de políticas neoliberais, se criaria um clima de confiança, que traria a recuperação. No entanto, os dados têm revelado que isso se transforma muito mais em um desejo que efetivamente em uma realidade. Os dados não comprovam a tese da recuperação, mas a continuidade da crise”, disse Antonio Corrêa de Lacerda ao Portal Vermelho.
Em discurso para chefes de Estado e de governo do Brics, por exemplo, o presidente Michel Temer disse que as previsões para a economia brasileira melhoraram, há elevação nos níveis de confiança e que o Brasil “começa a entrar nos trilhos”.
De acordo com Lacerda, no entanto, “os fundamentos da economia, na verdade, estão muito ruins. A taxa de juros continua muito alta, o desemprego elevado, o salário real em queda, o crédito travado, não há espaço para as atividades econômicas”, enumerou.
No dia seguinte à decisão do Banco Central de reduzir em apenas 0,25 ponto percentual a taxa básica de juros – agora fixada em 14% ao ano –, o professor avaliou que o recuo foi “muito aquém do necessário” para estimular a atividade no país. “O juro real continua absurdamente elevado e, por isso, é tão difícil iniciar o processo de recuperação”, analisou.
Em entrevista à revista Época, ele defendeu que há espaço para que a Selic caia, nos próximos 12 meses, para 9,25% ao ano. “A justificativa de combate à inflação tem mantido a política monetária excessivamente apertada e isso asfixia a atividade econômica, portanto adia a retomada”, afirmou à reportagem do Vermelho.
Em um governo com foco no ajuste fiscal, outra contradição é que a taxa básica de juros se mantenha como a mais alta do mundo, elevando, assim, os gastos com o financiamento da dívida pública. De acordo com o Banco Central, no acumulado no ano, os juros nominais totalizaram R$ 254,6 bilhões e, em doze meses, atingiram R$ 418 bilhões – ou 6,86% do PIB.
Questionado se enxerga que as medidas anunciadas pelo governo terão a capacidade de tirar o país da recessão, Lacerda respondeu: “É muito difícil que haja uma recuperação, dado que você não tem nenhum vetor que possa reverter o quadro atual da economia. A recuperação provavelmente começará a vir em 2017, porém de uma forma muito lenta, e o crescimento ao longo do ano deve ser apenas residual”.
Segundo ele, a PEC 241 – que limita o crescimento dos gastos públicos primários à variação da inflação do ano anterior e é a principal medida apresentada pela equipe econômica de Temer – não tem o poder de fazer crescer a economia. “Ela, por si só, não garante a retomada. Pelo contrário, na verdade, por impedir o Estado de fazer política fiscal contracíclica, principalmente”, apontou.
Lacerda tem defendido que, em especial durante um momento de crise internacional e recessão interna, ao invés de cortar gastos, é preciso que o Estado amplie seus investimentos, estimulando, assim, o investimento privado.
Em relação ao crédito, ele avaliou que a situação atual também não ajuda a economia. “Há inadimplência elevada, e o que acaba acontecendo é que os bancos são muito seletivos. Há um ‘empoçamento’ do crédito, não há crédito disponível e isso faz com que a economia não ande. A economia fica numa situação paralisada, em que todos que têm recursos aplicam no mercado financeiro, porque a rentabilidade é muito alta e ninguém quer correr risco”, encerrou.