Publicado 29/08/2016 17:24
Acusada de crime não cometido, e sem provas, Dilma enfrentará um tribunal político, que não tem pejo de dar as costas à Constituição.
O que está em causa não é a hipocritamente propalada defesa da moralidade administrativa.
O que está em causa é a interrupção do ciclo de mudanças iniciado desde o primeiro governo Lula, de alcance político e social de grande envergadura. E o retorno às políticas neoliberais, que já se dá a toque de caixa pelo espúrio presidente interino Michel Temer e seu grupo.
Agora, ao “mercado”, tudo!
Ao povo, piora das condições de existência.
É fato que o PT e aliados cometeram muitos erros, inclusive pelo uso nada republicano das relações entre o poder público e interesses privados.
Também é fato que a presidenta jamais exibiu paciência e habilidade para lidar com os atores políticos. Permitiu-se isolar.
Na condução da economia, sob o cerco cerrado das implicações da crise global sobre o Brasil, Dilma também cometeu erros cruciais.
Nem Dilma nem Lula jamais foram capazes de reunir forças, incluindo a mobilização ampla da sociedade, para arrostar o capital financeiro, que determina, em última instância, o funcionamento de nossa economia e tem o apoio unânime do complexo midiático.
Porém Dilma não cometeu crime de responsabilidade!
E se não cometeu crime, é vítima de um golpe institucional. À semelhança dos que ocorreram no Paraguai e em Honduras.
A democracia brasileira é rebaixada perante a comunidade internacional.
A República é submetida a uma das suas piores fases.
No Senado, como na Câmara, a desfaçatez impera. Muitos dos que até ontem participavam do governo e o defendiam com ardor mudaram de lado e, com semelhante retórica, agora defendem o impeachment.
A grande maioria dos brasileiros e brasileiras a tudo assiste perplexa. Não parece ter compreendido plenamente o que se passa, ou se queda enfraquecida pelos laços tênues que guarda com os que a deviam liderá-la.
O próprio partido da presidenta Dilma, acuado, titubeou muito durante o processo do impeachment.
Aguçou o exclusivismo e abusou de erros táticos que se acumulavam desde antes.
Agora que a presidenta anuncia a convocação de um plebiscito caso não se consuma o impeachment, como saída para o impasse institucional, o PT lhe nega apoio. Insiste numa suicida tática do “tudo ou nada”, muito mais retórica do que concreta.
Assim, a História do Brasil haverá de registrar o dia de hoje como o confronto entre democratas e pusilânimes, sob a omissão ou a conivência de alguns a que caberia um ato de resistência; entre os interesses da nação e do povo versus o conluio entre rentistas e setores mais retrógrados da elite dominante.
Que sirva de referência para a luta que seguirá sempre – por um Brasil democrático, socialmente justo e soberano.
* Luciano Siqueira é Médico, vice-prefeito do Recife, membro do Comitê Central do PCdoB