Projeto do governo impede acesso da população carente à Justiça
Caso a Câmara dos Deputados aprove o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257 no formato como se encontra, a população carente ficará sem ter acesso ao Poder Judiciário, desprovida, portanto, do almejado direito à justiça. Esse alerta tem sido dado por entidades de classe que atuam na advocacia pública.
Publicado 12/08/2016 12:22
A possibilidade de demissão em massa de servidores do Poder Judiciário e o fechamento de comarcas espalhadas pelo interior do Brasil, por conta de restrições orçamentárias impostas pela proposição, estão na contramão das necessidades do povo, que clama por melhor e mais célere andamento das ações judiciais.
O PLP 257 trata originalmente da renegociação das dívidas dos Estados e abarca outros temas polêmicos para além da falta de dinheiro dos entes federados. É parte integrante do chamado pacote de ajuste fiscal.
“Projeto do juízo final”
Esse diagnóstico preocupante do sistema judicial brasileiro foi feito ao jornal espanhol El País por sete especialistas e dirigentes de entidades de classe do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública. No meio judicial a proposta é conhecida como “o projeto do juízo final”.
“A situação é tão caótica que alguns dos Ministério Públicos Estaduais terão de demitir todos os seus servidores e mais de 30% de seus promotores”, afirmou a presidenta da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Norma Angélica Cavalcanti.
O PLP 257 modifica a Lei de Responsabilidade Fiscal e transfere para a rubrica “despesas com pessoal” algumas contas que antes não estavam previstas, como valores das gratificações, gastos com funcionários terceirizados, salários de estagiários e pagamentos de pensões e aposentadorias.
Dessa forma, ao menos 15 Ministérios Públicos (MPs) e 23 Tribunais de Justiça (TJs) deixariam de cumprir o limite previsto na legislação atual. Todos teriam um prazo de até dez anos para se adequar. Porém, já calculam que uma série de cortes ocorreria imediatamente.
Sem defensores
O caso das Defensorias Públicas é diferente dos outros dois órgãos porque, atualmente, não há nenhuma limitação para gastos com pessoal. A proposta definiria esse teto em 0,7% da receita corrente líquida de cada Estado. Ocorre que 16 das 27 unidades da federação já extrapolam esse patamar, que é considerado baixo. Caso o projeto seja aprovado, todas elas também teriam de demitir parte de seus quadros.
Dois estados simbolizam bem esse problema: Mato Grosso do Sul (que gasta 1,8%) e Tocantins (1,2%). O primeiro estima que apenas 35 dos 173 defensores públicos continuariam em suas funções. O segundo, prevê o fechamento de 39 dos 42 núcleos espalhados pelo interior tocantinense.
“Hoje, 69% das comarcas do país não têm defensores. Se o projeto for aprovado, alguns Estados ficarão com 10 ou 15 defensores para atender toda a população pobre. Estamos diante de um retrocesso incomensurável”, afirma o presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), Joaquim Neto.
Votação e protetos
Para tentar contornar a situação, os representantes de classe tentam ampliar o diálogo com os parlamentares. Estão mobilizados e ocupando os corredores do Congresso Nacional desde a retomada dos trabalhos após o recesso parlamentar.
Na última semana, um grupo deles foi recebido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se comprometeu a debater melhor o assunto com seus pares. Porém, foi o próprio Maia quem convocou uma sessão extraordinária para votar a proposta, considerada essencial pelo governo ilegítimo de Temer para equilibrar as contas do país, cujo deficit para este ano está previsto em 170 bilhões de reais.
“Entendemos que a crise econômica é grave, mas queremos ao menos ser ouvidos para que possamos mostrar que, para o Judiciário, essas mudanças são gravíssimas e comprometem o funcionamento de todo o sistema”, afirmou o vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Paulo Feijó.