Vanessa vota contra o golpe e denuncia desrespeito à Constituição
"Não houve surpresa. Quem acompanhou na madrugada desta quarta-feira (10) a votação do Senado na qual foi admitida a denúncia contra a presidenta Dilma percebeu que estão levando a julgamento uma pessoa que não cometeu nenhum crime, fato comprovado pela perícia técnica e Ministério Público Federal. Estão rasgando a Constituição para legitimar um interino usurpador, rejeitado pela maioria do povo brasileiro que engrossa o coro de “Fora Temer”.
Publicado 10/08/2016 11:19
A avaliação é da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) após o resultado da votação no senado que aprovou, por 59 a 21, a continuidade do processo de impeachment contra a presidenta eleita Dilma Rousseff.
Segundo a senadora, “os senadores que denunciam o golpe se mantiverem firmes nas suas posições. Vamos continuar assim até o julgamento final, convictos de que vamos conquistar os votos necessários para a volta de Dilma e a convocação de um plebiscito. O momento é de mobilização de todos em defesa da democracia."
Leia a seguir a íntegra do voto da senadora:
Vanessa Grazziotin (PCdoB – AM): Srªs Senadoras, Srs. Senadores, companheiros e companheiras, eu quero que minhas palavras sejam, Sr. Presidente, para registrar que nós vivemos, talvez, um dos piores momentos por que passa o nosso País.
Hoje é um dia muito triste para a Nação brasileira, hoje é um dia muito triste para o povo brasileiro, porque nós estamos aqui, Sr. Presidente, já há alguns meses, e hoje votando uma parte importante deste tal processo de impeachment – que não é impeachment porque é golpe, e não é impeachment porque não há crime –, que é a parte da pronúncia, em que nós deveremos dizer se há ou não elementos suficientes de prova que devam levar a Senhora Presidente Dilma Rousseff a julgamento neste plenário do Senado Federal.
E eu, Sr. Presidente, penso que a Presidenta Dilma Rousseff, cujo nome não apareceu em nenhuma lista, em nenhuma denúncia dessas tantas dezenas e centenas de denuncias a que o Brasil inteiro assiste, perdeu algo fundamental, que foi o apoio da maioria dos membros do Congresso Nacional. Não tendo como tirar a Presidenta Dilma, decidiu a maioria que se formou circunstancialmente neste Congresso Nacional abrir este processo de impeachment.
E eu fico muito feliz, Presidente Lewandowski, de ter a oportunidade de falar na presença de V. Exª, porque aqui nós assistimos, nos desfiles dos pronunciamentos, Parlamentares, inclusive, que vieram com a Constituição na mão: "Isto aqui é legal, isto aqui é constitucional, porque o impeachment está previsto na Constituição Federal".
De fato, o impeachment está previsto na Constituição Federal, mas a Constituição Federal diz que só é possível uma Presidenta, um governante máximo de um país perder o seu mandato se atentar contra a Constituição. Só é possível perder o seu mandato se cometer grave crime de responsabilidade, em que esteja caracterizado o dolo.
E eu lamento muito ter que repetir que o relatório, infelizmente, apresentado por um relator que é do mesmo partido da denúncia, é um relatório fraudulento.
Desculpe-me, não estou aqui ferindo ninguém, estou aqui falando do conteúdo do relatório, porque é um relatório que faz mil e um malabarismos, mas não consegue responder o mais simples. Não consegue, por exemplo, na parte das tais "pedaladas fiscais" – apelido que alguém inventou, não sei exatamente quem –, que isso nada mais é do que a operacionalização de uma política de governo, ou seja, do Plano Safra. Eles inventaram que o Plano Safra e uma dívida que o governo tinha perante o Banco do Brasil era operação de crédito.
Mas qual é a lei que diz que era operação de crédito? Qual é o artigo da lei que diz que era operação de crédito? Não há, porque lei não existe, porque o crime não está tipificado.
E o que disse a Perícia, que, aliás, só foi constituída no âmbito do Senado Federal por uma decisão do Supremo? Eu nunca vi, eu nunca vi, no âmbito de um processo, os acusadores – os acusadores – fugirem da produção de provas. Mas é isso o que está acontecendo neste momento.
Por que estão abrindo mão dos seus pronunciamentos? Porque não têm o que dizer, porque eles só sabem falar do conjunto da obra. E eu vou encerrar falando do conjunto da obra e mostrando quem destruiu a Nação e a Pátria brasileira.
Então, não há pedalada fiscal. A Perícia do Senado Federal disse isto: que não há nenhuma participação da Presidente Dilma, da Senhora Presidenta, porque esse programa é operado exclusivamente pelo Banco do Brasil e pelo Ministério da Fazenda, por força de lei. Mas veio o Ministério Público e disse o seguinte: que isso é um inadimplemento. Eu estou aqui com o que disse o Ministério Público, senhoras e os senhores. Não adianta falar palavras bonitas. Palavras bonitas o vento leva. Vamos ler a lei.
O que disse o Ministério Público? Que na questão do Plano Safra há um simples inadimplemento contratual, quando o pagamento não ocorre na data devida, não se tratando de operação de crédito. Isso disse o Ministério Público Federal.
Disse mais ainda: que não há que se concordar com a afirmação do Tribunal de Contas da União de que seria a reiteração do atraso, aliado a um montante de valores, que transformaria um contrato da União em operação de crédito.
E disse mais, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, disse mais: disse que se, por acaso, tivesse havido algum crime nesse aspecto, todos, desde o ano de 2000, teriam que ser penalizados. E disse o Procurador: "Ou todos são penalizados ou ninguém será penalizado". Mas a Presidenta Dilma pode perder o seu mandato, dado por 54 milhões de brasileiros, por conta disso. E por conta de que mais? Por conta de três decretos – aliás, um do Supremo Tribunal Federal, aprovado e enviado para esta Casa por V. Exª, que disse lá que tem fonte própria, que tem fonte própria. Mas não, querem cassar uma Presidente por causa desses três decretos.
E onde é que se está infringindo a lei? Disseram o seguinte: que não havia autorização. Nós lemos o art. 4º da Lei Orçamentária Anual. E o que diz o art. 4º da Lei Orçamentária Anual? O art. 4º diz que é possível, sim; ele dá autorização para a abertura de crédito suplementar, contanto que haja compatibilidade – compatibilidade –, contanto que sejam compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário estabelecida para o exercício de 2015. Aí, o que eles inventaram? Uma outra figura jurídica inexistente no arcabouço legal – porque a Constituição brasileira diz que a meta a ser perseguida é anual, porque o exercício é anual; a Lei de Responsabilidade Fiscal fala a mesma coisa; a Lei de Diretrizes Orçamentárias, idem; a lei do orçamento anual, idem; mas eles, não: "Feriu-se a meta na hora em que se abriu o crédito suplementar". Em julho, em agosto? Ninguém mede meta, o cumprimento de meta, em julho e agosto. Mas digamos que a meta fosse medida e digamos que a meta não fosse cumprida.
Pergunto a V. Exªs: qual é a lei que diz que é grave o crime de não cumprimento de meta? Nenhum presidente do Banco Central ficaria em pé, porque a lei também fala das metas de inflação, que não são cumpridas.
Então, estamos diante de um processo que é político, não é jurídico. E se é político não é jurídico. É, sim. E perdoem-me as palavras duras, mas precisam ser ditas e precisam ficar registradas na história. Não é um processo normal, legal, como tentam dizer. Quando eu ouvi entrevistas de alguns ministros, todos eles falaram a respeito do rito e não sobre o conteúdo da matéria.
Espero, espero com muita, com muita esperança. Tenho muita esperança de que se, infelizmente, esse processo seguir aqui, o Supremo Tribunal Federal analise o conteúdo, porque uma Presidenta inocente está sendo retirada do poder por mera decisão política de uma maioria circunstancial, que está transformando esta Casa num verdadeiro colégio eleitoral de exceção. Então nós afirmamos, sim, que há um engodo e que esse engodo existe para dar um ar de correção a um processo por inteiro sem fundamento – um processo que tem forma, mas não tem miolo. Eles querem substituir a vontade popular.
Foi um colega nosso, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, que falou dos objetivos desse processo – um colega nosso, que nunca subiu à tribuna para dizer que aquilo não era verdade, que era invenção, que era montagem. O que ele disse, numa gravação divulgada, é que era preciso sair a Presidenta Dilma primeiro para se estancar a sangria da Lava Jato; segundo, para aprovar medidas contra o povo brasileiro, medidas essas que um Governo eleito democraticamente não teria condições de aprovar no Congresso Nacional.
Este é um objetivo: trazer para o centro do País um projeto de nação derrotado nas quatro últimas eleições, um projeto de nação nocivo para o nosso País, nocivo para os trabalhadores brasileiros, nocivo para a Nação como um todo e, sobretudo, para o seu princípio de soberania. Querem fazer uma reforma previdenciária, tirar direito dos trabalhadores.
É por isso, Presidente, que, com muito orgulho, eu venho aqui a esta tribuna e digo: não ao golpe! Porque isso não é impeachment, isso é um golpe contra quem foi eleita pelo povo brasileiro. E o conjunto da obra… Que conjunto da obra é esse? Estão aqui os números para quem quiser ver. Números de Fernando Henrique Cardoso, muito piores do que os de hoje.
Muito obrigada.