Ieda Castro: O golpe e o desmonte social caminham a passos largos
O governo interino de Michel Temer avança a cada dia no seu projeto de desmonte das políticas públicas no Brasil, que atacam, especialmente, a área social. Só nesta semana, já são 187 exonerações de servidores.
Por Ieda Castro*
Publicado 02/08/2016 10:17
O governo interino de Michel Temer avança a cada dia no seu projeto de desmonte das políticas públicas no Brasil, que ataca, especialmente, a área social. Só nesta semana, já são 187 exonerações de servidores públicos que trabalhavam nos Ministérios da Cultura, da Saúde e do Desenvolvimento Social e Agrário.
Na sexta-feira (29), o Diário Oficial da União registra 33 exonerações no MDSA sem novas nomeações de substituição, desfalcando as secretarias de Segurança Alimentar e Nutricional, de Assistência Social e Avaliação e Gestão da Informação, trazendo prejuízos, principalmente, para o Sistema Único de Assistência Social e Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional.
O que poderia ser uma medida de rotina em um governo montando a sua equipe, transforma-se em um esvaziamento da capacidade do governo federal de assumir suas atribuições legais na coordenação nacional das políticas de assistência social e segurança alimentar e nutricional. As condições em que a avalanche de demissões ocorrem, estrategicamente definidas pelo centro de um governo golpista, sob pretexto de “desaparelhar” os ministérios de cargos políticos, estão criando desertos técnicos, acabando com a memória institucional, com o conhecimento acumulado e a especialização de políticas e programas que transformaram o país nos últimos anos em referência mundial no enfrentamento à fome e à pobreza.
Tem-se conhecimento que muitos desses cargos serão extintos ou deslocados para outras áreas priorizadas pelo governo interino, deixando, portanto, lacunas profundas e inviabilizando a continuidade das ações, em sua maioria previstas no 2º Plano Decenal de Assistência Social, recentemente aprovado pelo Conselho Nacional de Assistência Social.
São esvaziamentos de estruturas essenciais ao funcionamento de serviços e programas que têm dado resposta efetiva às necessidades das populações mais vulneráveis, a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos, do Programa de Cisternas que viabiliza o acesso à água para consumo e produção, beneficiando famílias que convivem no Semiárido e dos serviços de proteção básica e especial de atendimento às famílias em situação de vulnerabilidade e risco social.
Conheça aqui os prejuízos causados com as exonerações
A Política Nacional de Educação Permanente do SUAS – CapacitaSUAS, curso técnico, especialização e mestrado – fica inviabilizada pela insuficiência de estrutura e pessoal devidamente qualificado.
Os Programas CapacitaSUAS e Capacita SAN serão afetados, reduzindo em 100% a capacidade de oferta de cursos à distância e até 30% dos cursos presenciais.
A área de avaliação e monitoramento, que tem vasta e consistente produção de estudos e pesquisas necessárias à qualificação da gestão a exemplo do Censo Suas, também sofre um baque com as demissões.
A capacidade de elaboração de indicadores de monitoramento dos programas e a realização de análises de políticas por meio de cruzamento de bases de dados, tarefa que vinha sendo desenvolvida pelas equipes da SAGI, também é anulada pelas recentes demissões.
As linhas editoriais que davam transparência às ações do MDS também ficaram comprometidas, visto que não há previsão de manutenção da estrutura anteriormente existente na SAGI.
O apoio técnico do governo federal ao trabalho social com família no Programa de Atenção Integral à Família será comprometido pela ausência de liderança e coordenação estratégica da proteção básica, numa conjuntura em que as equipes dos 5.565 municípios que receberam as recentes orientações técnicas para trabalho com famílias indígenas e quilombolas necessitam ser acompanhadas pelos estados e pelo governo federal.
O suporte técnico que o governo federal deve oferecer aos estados e municípios no monitoramento do serviço de convivência e fortalecimento de vinculo também pode ser interrompido em virtude da ausência de coordenação e orientação do governo federal.
O monitoramento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI em curso e o apoio técnico aos municípios para a oferta do serviço de acompanhamento das medidas socioeducativas em meio aberto também fica ameaçado com a ausência de coordenação nacional.
A articulação interfederativa mediada pela relação com Fórum Nacional dos Secretários de Assistência Social e Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social, o apoio ao controle social e à gestão descentralizada, responsabilidades legais atribuídas ao governo federal, também foram profundamente afetadas com o afastamento da coordenação, facilitadora da interlocução entre União, DF, estados e municípios, CIT e CNAS. O apoio à gestão compartilhada e aprimoramento da gestão tão caros ao SUAS ficam comprometidos com o esvaziamento da coordenação.
Esse quadro demonstra a falta de compromisso de um governo interino, que não têm a legitimidade de fazer mudanças tão bruscas, com a continuidade e o avanço nas políticas de combate à pobreza, de segurança alimentar, de assistência social, entre outras.
O país que saiu do Mapa da Fome das Nações Unidas e que tinha diante de si o desafio da promoção da alimentação saudável, principalmente entre as famílias de baixa renda, agora está mais frágil em suas políticas.
É preciso que as instâncias de pactuação, os órgãos de controle social e a sociedade civil organizada estejam mobilizados, façam cobranças a esse governo, exijam esclarecimentos, denunciem e manifestem-se contra qualquer retrocesso na estruturação dos sistemas protetivos no Brasil.