Chioro: Quem apoiou o golpe, cobra a conta no Ministério da Saúde
O ex-ministro da Saúde, Arthur Chioro, participou do debate “SOS SUS – O Desmonte da Saúde Pública“, no primeiro dia de debates do 64º Conselho Nacional de Entidades Gerais da União Nacional dos Estudantes (Coneg da UNE) , realizado na última sexta-feira (15), na capital paulista. Chioro aproveitou a oportunidade para denunciar a agenda nociva implementada pelo governo ilegítimo Temer.
Publicado 20/07/2016 12:00
Para Arthur Chioro, este talvez seja o momento mais dramático desde a criação do SUS para a saúde pública no país.
“Os interesses daqueles que apoiaram o golpe do Temer e que hoje cobram a conta não são somente aqueles que tem um interesse na privatização da saúde, mas também outros setores do chamado complexo médico industrial”, diz.
Por isso, diz Chioro, é preciso que a sociedade brasileira lute pelo SUS constitucional, aquele que garante a saúde como um direito de todos.
Confira a entrevista na íntegra:
UNE- Quais são os desafios para a saúde no atual governo ilegítimo?
Chioro- Esse talvez seja o momento mais dramático desde a criação do SUS, mais do que quando nós vivemos o enfrentamento com o Collor, que não queria o SUS, quando nós tivemos o plano real e toda a dificuldade de avançar, a ameaça do Fernando Henrique na época de regulamentar a lei orgânica da saúde e a própria constituição para restringir direitos com a reforma Bresser. Acho que a gente nunca viveu um momento tão grave como esse.
O que o ministro interino apresenta é um debate desqualificado, um desrespeito às decisões da última Conferência Nacional de Saúde, do Plano Nacional de Saúde, dos princípios do SUS de universalidade, integralidade, controle social e equidade, e que apontam para um desmonte do SUS, para uma privatização por meio de planos populares.
É difícil até compreender o que seria isso num contexto de diminuição de gastos. É uma grande precarização da estrutura do SUS. Então, eu acho que se a sociedade brasileira não fizer um grande enfrentamento nós podemos perder essa grande conquista civilizatória, que a constituição de 1988 trouxe, que é o SUS.
O SUS tem problemas que precisam ser enfrentados, mas ele foi capaz de produzir muito mais vida, muito mais saúde para a população brasileira. Sem ele, sem dúvida nenhuma, nós viveríamos uma verdadeira barbárie.
Muita gente aponta que são apenas os planos de saúde, mas, o senhor aponta também as industrias farmacêuticas como parte do problema.
Na verdade, os interesses daqueles que apoiaram o golpe do Temer e que hoje cobram a conta de forma bastante importante no Ministério da Saúde não são somente aqueles que têm um interesse na expansão do mercado de planos de saúde. Outros setores do chamado complexo médico industrial estão muito interessados na privatização da saúde, seja na gestão, na área de tecnologia de informação, na área de medicamentos.
É preciso ter claro que a saúde envolve quase 10% do PIB brasileiro. Ela é uma força econômica que vai muito além simplesmente da prestação de serviços à população e é portanto uma área de grande interesse e disputa.
Por isso, é preciso que a sociedade brasileira lute pelo SUS constitucional, aquele que garante a saúde como um direito de todos, o sistema universal, e como uma obrigação do Estado, para que a gente não volte a ter como no passado, um sistema para distintas categorias sociais orientada pela lógica do mercado, em que os mais pobres eram tratados como indigentes, aqueles que não têm acesso a nada.
Como as medidas que o atual ministro ilegítimo da saúde já apontou afetam o "Mais Médicos" ?
Eles apontam em primeiro lugar no sentido de não dar a garantia da manutenção do programa. Em nenhum momento eu vi ainda ou ouvi ele anunciando que vai desmontar o Mais Médicos, até porque daqui a pouco haverá eleições e o programa é hoje muito bem avaliado não apenas pelos prefeitos e pelos secretários municipais de saúde, mas principalmente pela população.
Eu temo muito, a partir do processo eleitoral das eleições municipais, que comece uma precarização. Mais ou menos o seguinte: começa a não substituir os médicos que terminam o período de três anos, ou que adoecem ou que deixam o programa e com isso, aos poucos, o programa vai sendo desmontado.
Mas, a face mais importante diz respeito aos outros dois componentes: porque o Mais Médicos também tem um investimento de reforma, construção e ampliação de 27 mil Unidades Básicas de Saúde (UBS), e com a diminuição do gasto público que vem por aí as prefeituras não terão condições de fazer as melhorias nos postos de saúde que a população usa. E o principal risco diz respeito à desmontagem do componente do Mais Médicos, que é coordenado pelo Ministério da Educação, que diz respeito à ampliação das faculdades de medicina e das residências médicas.
Se simplesmente não forem abertas novas faculdades, ampliadas vagas de medicina e de residências médicas pelo Brasil como havia sendo planejado nós voltaremos a ter num curto espaço de tempo a falta de médicos agravada novamente. Ou seja, todo aquele resultado positivo que nós conseguimos com o Mais Médicos vai se perder e nós deixaremos de cumprir a meta que era em 2026 ter uma quantidade de médicos brasileiros suficientes para a população brasileira.