De escudo, Romero Jucá vira teto de vidro estilhaçado do golpe
Durante a reunião com parlamentares da base aliada o golpe nesta terça-feira (24), Michel Temer demonstrou que sentiu o baque provocado pela divulgação da conversa de seu escudeiro, Romero Jucá (PMDB-RR), até então ministro do Planejamento, e Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro. Irritado, Temer disse que sabe governar e não é "coitadinho". Disse que já "tratou com bandidos" quando foi secretário de Segurança Pública de São Paulo, e por isso sabe governar.
Por Dayane Santos
Publicado 25/05/2016 11:13
A irritação de Temer é porque o golpe está nu. O que antes a direita golpista dizia se tratar apenas do “choro de derrotados” da esquerda se confirmou como fato com a revelação da conversa de Jucá com um dos braços do PMDB na Transpetro que, ao que tudo indica, teve sua delação premiada homologada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), segundo reportagem do Valor. O acordo contém conversas que Machado gravou por telefone envolvendo lideranças do PMDB. Ele teria feito a delação após a revelação, por outro delator, de uma conta secreta pela qual ele recebia dinheiro de propina.
Diferentemente do que alguns tentam afirmar, Machado não é só um delator desesperado. Ele foi presidente da Transpetro entre 2003 e novembro de 2014 por indicação do PMDB. Foi demitido justamente por seu envolvimento com a Lava Jato.
A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), reforçou que a gravação de Jucá é a prova do golpe contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff. "Não precisamos mais explicar o golpe. Quem explicou o golpe perfeitamente, quem falou de todas as artimanhas do acordo e da única forma capaz de parar a Operação Lava Jato foi o senador Romero Jucá, conversando com seu companheiro de partido Sérgio Machado, que disse que só havia uma forma de parar a Lava Jato, tirando a presidente Dilma do poder, e que haveria um acordão envolvendo inclusive o Supremo Tribunal Federal", enfatizou.
"Jucá era o maior articulador do impeachment no Senado. Era Eduardo Cunha na Câmara e ele no Senado", salientou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). "Parece uma quadrilha parlamentar tentando afastar uma presidenta honrada, honesta", salientou.
Lindbergh também comentou a declaração de Temer, sobre sua experiência em "tratar com bandidos" quando foi secretário da Segurança. "Nós estranhamos a declaração, foi quase que uma autoconfissão", disse Lindbergh.
Operação abafa Jucá
O consórcio golpista corre para tentar transformar o fato em uma ação individual de Jucá ou numa simples conversa que não configuram prova. A primeira ação nesse sentido foi imediatamente afastar Jucá do Ministério do Planejamento para, assim, tentar executar a segunda operação – que já conta com amplo apoio da mídia – que é abafar o caso.
Para tentar sustentar essa tese botaram o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, para dizer que a conversa foi apenas uma "impropriedade" de Jucá e que não viu tentativa de obstrução da Operação Lava Jato.
"Não vi isso [tentativa de obstruir a Lava Jato]. A não ser, uma certa impropriedade em relação à referência ao Supremo. Sempre vem essa história: já falei com os juízes ou coisa do tipo. Mas é uma conversa entre pessoas que tem alguma convivência e estão fazendo análise sobre o cenário numa posição não muito confortável", minimizou Mendes.
De volta ao Senado, Jucá ocupou a tribuna para dizer que nunca fez nenhuma ação para impedir a investigação da Lava Jato. “Falei naquele período como senador da República e como aspirante ao comando do PMDB”, minimizou.
Ele e Temer se esforçam para que todos engulam a história da carochinha de que Jucá era apenas um coadjuvante na articulação do PMDB. Um aspirante e, portanto, o que disse na conversa com Machado, eram apenas ilações sem efeito prático. Ao mesmo tempo, tenta criar uma distância política e pessoal com Temer, como se fosse um “recém-chegado”, desconhecido pela maioria.
O senador peemedebista é um dos articuladores de Temer, não é à toa que ganhou a presidência do PMDB e o Ministério do Planejamento. É parte do grupo seleto que começou a se articular há cerca de duas décadas atrás, que inclui outros quatro antigos aliados e amigos: Eliseu Padilha, Moreira Franco, Henrique Eduardo Alves e Geddel Vieira Lima.
Político de Roraima, Jucá era um dos senadores alinhados ao Renan Calheiros, mas ganhou espaço nas manobras do golpe com Eduardo Cunha. Nesse período, ficou conhecido como “escudo de Temer”, sendo uma das principais vozes escaladas para defendê-lo das, até então, acusações de articular um golpe.
Enquanto dizia a Sérgio Machado por telefone que o impeachment era a saída para barrar a Lava Jato, Jucá dava declarações para a grande imprensa afirmando que a acusação de golpe era uma “apelação”.
"Hoje a Dilma é uma certeza de desastre, o Michel (Temer) pode ser uma possibilidade de acerto", disse Jucá em pronunciamento da tribuna do Senado, após a decisão da Câmara de aprovar o impeachment.
No áudio revelado pela Folha de S. Paulo na segunda-feira (23), vazado das investigações da Procuradoria-Geral da República (PGR), Jucá chegou a dizer que era preciso “estancar sangria" da Lava Jato. “Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria”, disse ele.
Não é o que você está pensando
Como um marido flagrado pela esposa com a amante, Jucá diz que a “sangria a que me refiro é à situação de gravidade econômica e social do país”. Mas não conseguiu explicar a conversa seguinte em que Machado diz que, “com o negócio que o Supremo fez [autorizou prisões logo após decisão de segunda instância], vai todo mundo delatar". E ele responde: "Exatamente, e vai sobrar muito. O Marcelo, e a Odebrecht, vão fazer [delação]".
Jucá está no PMDB, mas já foi filiado ao PSDB até o começo de 2003. Com exceção do governo Collor, ocupou funções políticas em todas as demais gestões presidenciais, incluindo o governo José Sarney.
É investigado oficialmente em dois inquéritos na Lava Jato no Supremo, sob a relatoria do ministro Teori Zavascki, sendo um deles chamado de "quadrilhão" que apura o esquema de desvio de recursos da Petrobras, em benefício de diversos partidos.
É ainda investigado em inquérito que tramita no STF desde 2010, o qual apura “possível existência de crime de falsidade ideológica, desvio de contribuições previdenciárias e contra a ordem tributária”, relatado pelo ministro Gilmar Mendes. Também é investigado num suposto esquema de compra de medidas provisórias da Operação Zelotes, que tem a ministra Cármen Lúcia como relatora.
Na semana passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao STF a abertura de mais um inquérito contra integrantes da cúpula do PMDB para apurar o suposto pagamento de propina na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Nesse caso, além de Jucá, também são alvos o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e os senadores Valdir Raupp (PMDB-RO) e Jader Barbalho (PMDB-PA). Se o inquérito for aberto, será o sétimo envolvendo Jucá.