Os clientes
No dia 22 de março Bruxelas foi alvo de ataques terroristas reivindicados pelo "Estado Islâmico" em que morreram 35 pessoas e mais de 300 ficaram feridas. No dia 25, a cidade iraquiana de Alexandria foi vítima de um outro ataque terrorista reivindicado igualmente pelo "ISIS" em que morreram 32 pessoas e 80 foram feridas.
Por Ângelo Alves, no Jornal Avante
Publicado 01/04/2016 17:07
No dia 27, em Lahore, no Paquistão, um ataque reivindicado pelo autodenominado "Jamaat ul Ahrar" (uma cisão dos talibã) matou 72 pessoas e feriu 359.
Poderíamos continuar com dezenas de outros relatos de ataques terroristas ou de conflitos militares que só no ano de 2014 vitimaram diretamente cerca de 200 mil seres humanos. Conflitos alimentados pelos complexos industriais militares das grandes potências imperialistas, num negócio de bilhões, dominado pela Otan, em que seis dos seus membros (EUA, França, Alemanha, Itália, Espanha, Dinamarca) são responsáveis por 56% do total de "exportações" de armas em todo o mundo (com os EUA à cabeça com 33%), tendo como seus principais "clientes" países como a Turquia, Israel, o Egito, Marrocos, a Jordânia, os Emirados Árabes Unidos, o Qatar e… a Arábia Saudita, o segundo maior importador de armamento do Mundo, apenas suplantado pela Índia.
Olhando para esta lista de "clientes" da Otan faz-se luz sobre uma afirmação de sempre do Partido Comunista Português: é preciso combater o terrorismo nas suas causas, e uma das causas é a política do militarismo e da guerra, da ingerência, da agressão a estados soberanos e de terrorismo de Estado. Do mesmo modo que os taliban e a própria Al-Qaeda foram criados, financiados, "educados" e treinados pela CIA para combater o "inimigo soviético" e controlar o Afeganistão, também o "moderno" terrorismo "islâmico" é um resultado da ação das potências imperialistas mundiais que visam redividir o Oriente Médio, mantendo a sua supremacia econômica e militar na região ou dos seus "clientes" regionais.
Numa recente entrevista a um diário português, o presidente do Instituto Islâmico Britânico afirmava que "o ISIS não apareceu do nada, sempre existiu, o ISIS é a Arábia Saudita". Tem razão, quer abordemos a afirmação do ponto de vista ideológico (o Wahhabismo e o Salafismo são a base ideológica comum do regime ditatorial saudita, do ISIS e da Al Qaeda) quer do ponto de vista do papel da Arábia Saudita, e seus aliados no "Conselho de Cooperação do Golfo", na estratégia imperialista de redivisão sectária e confessional na região, e em particular na Síria.
Estão já hoje abundantemente documentadas as ligações dos principais "clientes" da Otan no Oriente Médio aos grupos de mercenários e criminosos que atuam na Síria. O fortalecimento do "ISIS" resulta da criação do "Exército Sírio Livre" que nas suas fileiras integra ou integrou organizações terroristas como a "Frente Al-Nusra" e o "ISIS" e cujos "combatentes" foram treinados em campos de treino na Turquia. "Exército" de "libertadores" que teve como um dos seus principais "dirigentes" Ibrahim al-Badri, o atualmente conhecido "califa" Abu Bakr al-Bagdadi, o "chefe" do "Estado Islâmico" no Iraque e Síria, com conhecidas ligações com o senador norte-americano John Mc-Cain.
Não há hipocrisia que apague a evidência: o terrorismo que assola o continente europeu nasceu do caos criado pelas sucessivas intervenções imperialistas no Oriente Médio, na Ásia Central e na África. Nasceu da guerra que desde a primeira invasão do Iraque no século passado foi feita a todos os estados da região do Oriente Médio que cometerem esse terrível crime de não se vergar à dominação imperialista. O terrorismo que vimos em Bruxelas alimenta-se ideologicamente do ódio emanado das teorias do "choque de civilizações" e também do racismo e xenofobia presentes nas políticas europeias ditas de migrações. Mas não só. As armas, os veículos, os enormes "custos operacionais" de organizações terroristas como estas não caem do céu. E o rasto do dinheiro leva-nos, mais uma vez, à Otan e aos seus "clientes".