Ministério Público recomenda adiamento do edital de OS nas escolas
Após identificar pontos inconstitucionais no edital de chamamento de Organizações Sociais (OS) para administrar 23 escolas em Goiás, o Ministério Público Federal, o Ministério Público (MP-GO) e o Ministério Público de Contas do Estado recomendaram o adiamento da convocação até que as irregularidades sejam solucionadas.
Publicado 18/02/2016 12:26
A recomendação, divulgada ontem (16), foi feita à secretária estadual de Educação, Raquel Teixeira. O governo goiano tem dez dias para se manifestar.
De acordo com os promotores e procuradores, a iniciativa do governo de Goiás fere a valorização dos profissionais de educação, estipula valores a serem repassados às entidades sem divulgar os critérios utilizados na sua definição e ainda foi estabelecido sem diálogo com a comunidade escolar, entre outras irregularidades.
“Chegamos à conclusão que o projeto referencial é inconstitucional”, disse o promotor do MP goiano Fernando Krebs, um dos que assinam o texto. “Vai piorar a qualidade da educação. Vai promover a terceirização, a privatização às avessas da escola pública”, afirmou.
O edital de chamamento das OS foi publicado no final de dezembro. Na segunda-feira (15), ocorreu a abertura de envelopes com as propostas. Nenhuma das dez organizações participantes entregou a documentação completa. Uma nova sessão foi agendada para o próximo dia 25.
“Se o edital não for suspenso, vamos recorrer à Justiça e pedir uma decisão liminar.” Caso o edital não seja adiado, a intenção é levar a questão ao conhecimento da Procuradoria-Geral da República para uma eventual ação direta de inconstitucionalidade.
Irregularidades
De acordo com a recomendação dos ministérios públicos, ao abrir possibilidade de 70% dos docentes e até 100% dos servidores administrativos das escolas geridas por OS serem empregados privados, o edital viola a determinação constitucional de valorização dos profissionais da educação. Além disso, segundo os procuradores, a contratação de docentes para o ensino público só pode ocorrer por meio de concurso.
Os valores dos repasses às OS também são questionados na recomendação. O edital de chamamento não deixa claro quanto será transferido para as entidades, apenas estipula que o valor mínimo de repasse por aluno será de R$ 250, e o máximo, de R$ 350. De acordo com os ministérios públicos, os valores são muito diferentes dos praticados atualmente e o governo do estado não explicou os critérios utilizados para defini-los.
Outra ilegalidade do edital, segundo os MPs, é a previsão de repasse de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para as OS, destinando a verba a despesas com o pessoal que prestará o serviço educacional.
Os promotores e procuradores argumentam que a Lei 11.494/2007, conhecida como Lei do Fundeb, é clara ao estabelecer que os recursos só podem ser aplicados no pagamento da remuneração de profissionais da educação no efetivo exercício do cargo e que integrem a estrutura do Estado, ou seja, que sejam concursados.
Os integrantes dos MPs apontam ainda uma série de problemas quanto às OS da área de educação que foram credenciadas pelo estado de Goiás para participar do edital. Na análise dos promotores e procuradores, nenhuma das 11 organizações qualificadas para o certame atende aos requisitos previstos na legislação. Em várias delas, os responsáveis respondem a processos judiciais, inclusive criminais, o que atenta contra a exigência de idoneidade moral, por exemplo.
A recomendação questiona ainda a capacidade profissional de algumas OS e destaca que há, inclusive, o caso de uma que tem como responsável um médico veterinário, que não apresenta histórico de atuação na educação. A recomendação, na íntegra, está disponível na internet.
Procurada, a Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte de Goiás (Seduce) diz que aguardará ser oficialmente notificada antes de se pronunciar.
Processo
A partir deste ano, Goiás começará a transferir a administração de escolas estaduais às OS, que são entidades filantrópicas. O modelo, que já é aplicado no sistema de saúde do estado, é inédito no Brasil em escolas. A implementação começa em 23 escolas e deverá chegar a 200 até o final do ano.
Desde a divulgação, o projeto provoca polêmica. Estudantes e professores chegaram a ocupar 28 escolas e a sede da Seduce em protesto contra a medida. Para movimentos sociais, a medida significa a privatização da educação pública. A Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG) divulgou nota na qual afirma que a medida “constitui um processo de terceirização da oferta da educação pública”.