Custo da crise não deve ser pago pelos mais pobres, diz Bertotti
O ano de 2016 tem seu início marcado pelo debate em busca de medidas efetivas que permitam ao Brasil sair da crise que se abateu sobre nossa nação. Essa crise tem um viés econômico e outro político, que se retroalimentam, e precisa ser enfrentada com a aplicação do programa de governo que elegeu a presidenta Dilma em 2014.
Publicado 01/02/2016 12:27 | Editado 04/03/2020 16:55
Um programa no qual a linha-mestra prima pelo desenvolvimento com distribuição de renda, reforçada pela consigna proposta pelo PCdoB que diz, em outras palavras, que o custo dessa crise deve ser pago pelo andar de cima e não pelo andar de baixo de nossa sociedade.
José Bertotti (*)
Os embates de 2015 em torno do falacioso pedido de impeachment da presidenta Dilma foi utilizado como moeda de troca pelo presidente da Câmara dos Deputados para salvar a própria pele. Esses embates levaram de lado a lado milhões de brasileiros às ruas e demonstraram a capacidade de organização dos setores progressistas da nossa sociedade na defesa da democracia e do estado democrático de direito.
Nessa mobilização deve-se destacar o papel da Frente Brasil Popular, que congregou partidos e organizações sociais e unificou distintos setores de nossa sociedade em defesa da pauta democrática, como condição básica para o início da retomada do processo de enfrentamento da crise econômica e do processo de desenvolvimento em nosso país. Esse embate ainda não chegou a seu desfecho, mas já permitiu desnudar a verdadeira política da oposição, qual seja a de fomentar um ambiente de instabilidade econômica onde só interessa o aprofundamento da crise como tentativa de deslegitimar o governo recém-eleito.
Prova disso foi a aprovação das chamadas pautas-bomba no Congresso Nacional, patrocinadas por Eduardo Cunha, que de fato pautou e liderou a oposição em 2015. Essas pautas, que oneravam o orçamento sem previsão de novas receitas foram, posteriormente, vetadas pela presidenta Dilma, vetos esses mantidos nos duros embates que se travaram no final de 2015, no Congresso Nacional, para recompor a base de sustentação do governo, criando um ambiente levemente mais favorável para que o ano de 2016 seja marcado pelo debate de propostas sobre os rumos do país.
Retração do PIB
Some-se a isso, a publicação no final de dezembro de 2015 da Medida Provisória que permite a realização de acordos de leniência com empresas que admitirem sua culpa em processos de corrupção e fraude, sem dispensar o devido processo legal às pessoas físicas causadoras de danos ao erário. A não realização desses acordos com as empresas envolvidas na operação lava-jato no ano de 2015 foram responsáveis pela retração de 2% no PIB no ano que se encerrou, causando a demissão de milhares de trabalhadores e a falência de empresas fornecedoras da cadeia de petróleo e gás do Brasil.
Já em 2016, a primeira reunião do Conselho de Política Monetária manteve a taxa de juros em 14,25% ao ano, não atendendo às expectativas do mercado e causando severas críticas da grande imprensa, que atua articulada junto ao mercado financeiro e não divulga o impacto dessa taxa de juros nas finanças públicas do Brasil.
Só para exemplificar, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2015 previa um total de despesas de R$ 2,863 trilhões, das quais R$ 1,356 trilhão (47%) destinavam-se ao pagamento de juros e amortizações da dívida pública (PLOA 2015, pág 97). Essa realidade pode e deve mudar em 2016 à medida em que se galvanize na sociedade um sentimento de que essa sangria oriunda dos altos juros deve ser extirpada de nosso receituário econômico.
Crise e capitalismo
Precisamos ter clareza do que está em jogo no Brasil de hoje tendo em vista o que se passa no mundo. O atual sistema econômico mundial é hegemonizado pelo capitalismo que se beneficia de suas crises cíclicas para justificar a retirada de direitos dos trabalhadores como esforço necessário para encontrar alternativas para a crise gerada no seio do próprio sistema. Na periferia do sistema capitalista essa crise gera outro subproduto que é o barateamento das ações de empresas locais, permitindo que os detentores do grande capital possam adquirir a preço de ocasião essas empresas, coisa que acontece agora aqui em nosso país.
Semana passada, a ONG inglesa Oxfam publicou o seu estudo sobre concentração de riqueza no mundo. Ela informou e listou 62 pessoas que detêm a mesma quantidade de dinheiro que metade da população mundial, inclusive dois brasileiros. Um absurdo por si só que demonstra a iniquidade desse sistema. Porém, a receita aplicada nos EUA e Europa desde a culminância da crise de 2008 foi a retirada de direitos sociais e o congelamento de salários da classe trabalhadora, que, evidentemente, alimentam essa absurda concentração de riqueza.
Na contramão dessas medidas, o Brasil inicia o ano de 2016 anunciando o aumento real do salário mínimo para R$ 880,00, que significa 11,6% de aumento, dos quais 1,32% estão acima da inflação medida em 2015.
De fato, as saídas para a crise envolvem um debate em torno de mais investimentos na produção de bens e serviços que não só criem mais e melhores empregos, mas que disponibilizem para a maioria da população responsável por essa produção uma elevação da sua qualidade vida a partir do uso e benefício desses bens e serviços produzidos por ela mesma.
(*) José Bertotti é presidente do Comitê Municipal do PCdoB Recife.