Até ex-ministro de FHC sabe: “Aumentar juros agora não tem sentido”

“Aumentar os juros agora não tem o menor sentido do ponto de vista de inflação.” A declaração é do ex-presidente do BNDES Luiz Carlos Mendonça de Barros, e acontece a uma semana da próxima reunião do Copom, que sinaliza alta da Selic. A manifestação, vinda de um dos gurus econômicos do PSDB e um ex-ministro do governo FHC, mostra que a crítica à perspectiva de retomada da trajetória de elevação dos juros vem de todos os lados.

Luiz Carlos Mendonça de Barros

Em entrevista ao Valor Econômico, Mendonça de Barros avalia que a inflação do país não é de demanda, mas provocada pelo câmbio e pela correção de preços administrados. Portanto, a redução de juros não tem efeito sobre ela.

“Quem está acompanhando inflação há mais tempo no Brasil tem uma visão clara de que, quando se tem um choque externo de preços na dimensão que tivemos no ano passado – de câmbio e correção de preços públicos –, esse choque leva pelo menos dois anos para passar pelo sistema de preços ao consumidor. Como nós temos uma economia indexada, ainda, tudo o que depende do INPC e o do IPCA – dissídio coletivo, aluguéis –, vai receber impacto de 10% a 11% em 2016 e não há juros que façam esses preços baixarem. São contratos legalmente indexados a um índice de preços”, defende.

Questionado sobre o preço dos alimentos, ele afirma que boa parte da estrutura de alimentos no Brasil trabalha com os preços do mercado internacional, em dólar. E completa: “Esses preços tiveram aumento incrivelmente alto no ano passado, e eles representam cerca de 40% no IPCA”.

Com a ineficácia da estratégia de controlar esse tipo de inflação com aumento de juros, o economista defende que a autoridade monetária deveria comunicar de forma clara uma convergência para o centro da meta em dois anos.

O ex-presidente do BNDES cita que, no próprio Boletim Focus, a inflação para 2017 está na casa dos 5%, 5,2%. “ Se você tem uma inflação neste ano de 6,5%, é absolutamente normal, não tem como enfrentar isso, porque ela reflete essa indexação no sistema econômico. Pode matar todo mundo de fome, que a inflação não vem pro centro da meta”, dispara.

Segundo ele, “impor de novo um aumento de juros em uma economia que está degringolando” resultaria em uma “relação de custo-benefício absurda”. Mendonça de Barros analisa ainda que o BC errou, no passado, quando baixou os juros em um quadro de excesso de demanda. Hoje, contudo, o problema é o inverso, afinal, a demanda já despencou.

“Mas não é subir os juros que vai resgatar a credibilidade do Banco Central. Pelo contrário, acho que eles vão ser acusados rapidamente, à medida que o tempo passar, de estarem cometendo um erro que não poderia ser cometido. Se pegar os preços que não são influenciados pelo câmbio, por preço público, você vê que eles já estão refletindo a falta de demanda”, analisa.

O economista classifica como uma “sandice” a visão de alguns colegas mais jovens que defendem a retomada da alta da Selic como forma de manter a credibilidade do banco. “ A visão deles é que, como nós assumimos o compromisso com o centro da meta, nós perderemos a credibilidade se se não aumentarmos os juros”, critica.

Mendonça de Barros lembra que há sete anos o Fed – Banco Central norte-americano – tenta levar a inflação nos EUA para 2% . “Não conseguiu ainda e não perdeu credibilidade por causa disso.”