O Ocidente escolheu o pior caminho: a guerra
Seguramente são abomináveis e de todo rejeitáveis os atentados terroristas perpetrados no último dia 13 de novembro, em Paris, por grupos terroristas de extração islâmica. Tais fatos nefastos não caem do céu. Possuem uma pré-história de raiva, humilhação e desejo de vingança.
Por Leonardo Boff*
Publicado 27/11/2015 14:49
Estudos acadêmicos feitos nos Estados Unidos evidenciaram que as persistentes intervenções militares do Ocidente com sua geopolítica para a região, e a fim de garantir o suprimento do sangue do sistema mundial que é o petróleo, rico no Oriente Médio, acrescido ainda pelo fato do apoio irrestrito dado pelos USA ao Estado de Israel com sua notória violência brutal contra os palestinos, constituem a principal motivação do terrorismo islâmico contra o Ocidente e contra os USA (veja a vasta literatura assinalada por Robert Barrowes; Terrorism: Ultimate Weapon of the Global Elite, em seu site: warisacrime.org – War is a Crime).
A resposta que o Ocidente tem dado, a começar com George W. Bush, agora retomado vigorosamente por François Hollande e aliados europeus mais a Rússia e os EUA, é o caminho da guerra implacável contra o terrorismo – seja interno na Europa, seja externo contra o Estado Islâmico na Síria e no Iraque. Mas esse é o pior dos caminhos, como criticou Edgar Morin, pois guerras não se combatem com outras guerras, nem o fundamentalismo com outro fundamentalismo (o da cultura ocidental, que se presume a melhor do mundo e com o direito de ser imposta a todos).
A resposta da guerra que, provavelmente, será interminável pela dificuldade de derrotar o fundamentalismo ou grupos que decidem fazer de seus próprios corpos bombas de alta destruição, insere-se ainda no velho paradigma pré-globalização, paradigma enclausurado nos Estados-nações, sem se dar conta de que a História mudou e tornou coletivo o destino da espécie humana e da vida sobre o planeta Terra. O caminho da guerra nunca trouxe paz, no máximo alguma pacificação, deixando um lastro macabro de raiva e de vontade de vindita por parte dos derrotados que nunca, na verdade, serão totalmente vencidos.
O paradigma velho respondia guerra com guerra. O novo, da fase planetária da Terra e da Humanidade, responde com o paradigma da compreensão, da hospitalidade de todos com todos, do diálogo sem barreiras, das trocas sem fronteiras, do ganha-ganha e das alianças entre todos. Caso contrário, ao generalizar as guerras cada vez mais destrutivas, poderemos pôr fim à nossa espécie ou tornar a Casa Comum inabitável.
Quem nos garante que os terroristas atuais não se apropriem de tecnologias sofisticadas e comecem a usar armas químicas e biológicas que, por exemplo, colocadas nos reservatórios de água de uma grande cidade, acabe produzindo um dizimação sem precedentes de vidas humanas? Sabemos que estão se habilitando para montar ataques cibernéticos e telemáticos que podem afetar todo o serviço de energia de uma grande cidade, dos hospitais, das escolas, dos aeroportos e dos serviços públicos. A opção pela guerra pode levar a esses extremos, todos possíveis.
Devemos tomar a sério o que sábios nos alertaram como Eric Hobswbam ao concluir seu conhecido A era dos extremos: o breve século 20 (1995:562): “O mundo corre o risco de explosão e implosão; tem que mudar… a alternativa para a mudança é a escuridão”. Ou então do eminente historiador Arnold Toynbee, depois de escrever dez tomos sobre as grandes civilizações históricas, nos vem esta advertência em seu ensaio autobiográfico Experiências (1969:422): “Vivi para ver o fim da História humana tornar-se uma possibilidade intra-histórica, capaz de ser traduzida em fato não por um ato de Deus, mas do próprio homem”.
O Ocidente optou pela guerra sem trégua. Mas nunca mais terá paz e viverá cheio de medo e refém de possíveis atentados, que são a vingança dos islâmicos. Oxalá não se realize o cenário descrito por Jacques Attali em seu Uma breve história do futuro (2008): guerras regionais cada vez mais destrutivas a ponto de ameaçarem a espécie humana. Aí a Humanidade, para sobreviver, pensará numa governança global com uma hiperdemocracia planetária.
O que se impõe, assim nos parece, é o reconhecimento da existência de fato de um Estado Islâmico e, em seguida, formular uma coligação pluralista de nações e de meios diplomáticos e de paz para criar as condições de um diálogo para pensar o destino comum da Terra e da Humanidade.
Receio que a arrogância típica do Ocidente, com sua visão imperial e ao se julgar em tudo melhor, não acolha esse percurso pacificador, mas prefira a guerra. Então torna a ganhar significado a sentença profética de M. Heidegger, conhecida depois de sua morte:
Não devemos ingenuamente esperar a intervenção divina, pois o nosso destino está entregue à nossa responsabilidade. Seremos o que decidirmos: uma espécie que preferiu se autoexterminar a renunciar à sua vontade absurda de poder sobre todos e sobre tudo ou então forjarmos as bases para uma paz perpétua (Kant) que nos conceda viver diferentes e unidos, na mesma Casa Comum.