R$ 21 bilhões em fraudes: Zelotes abafa sonegadores do poder econômico
Instaurada para apurar um dos maiores esquemas de sonegação fiscal já descobertos no país, envolvendo empresas, bancos e veículos de comunicação, como a Rede Globo, a Operação Zelotes se transformou em mais um instrumento da polarização política que contaminou diversas esferas das instituições brasileiras.
Por Dayane Santos
Publicado 30/10/2015 11:39
Os fatos em torno da quarta fase da operação, deflagrada na última segunda-feira (26), demonstram isso. A Zelotes tinha como objetivo investigar fraudes em julgamentos no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), ligado ao Ministério da Fazenda. O esquema foi revelado a partir de uma investigação do próprio ministério que, posteriormente, comunicou o fato à polícia.
Com um montante de prejuízo estimado até agora em R$ 21,6 bilhões em fraudes, a operação sofreu uma mudança de foco nas investigações. Depois de ficar sete meses quase no anonimato por parte da imprensa, a Zelotes se direciona para investigar um suposto envolvimento de Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula.
Vamos aos detalhes: em 494 páginas do documento da Polícia Federal sobre a investigação da Zelotes, não consta o nome do filho do ex-presidente Lula. Então, por que e como a polícia conseguiu um mandado de busca e apreensão ao escritório dele?
A juíza
Ao receber o pedido da PF, a juíza federal Célia Regina Ody Bernardes, da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, responsável pela investigação da Operação Zelotes, autorizou a operação e encaminhou o pedido para apreciação do procurador José Alfredo de Paula e Silva, do Ministério Público Federal. Esse procurador teria feito um aditamento à operação, solicitando que as empresas de Luís Cláudio Lula da Silva fossem incluídas entre as que seriam submetidas a um mandado de busca e apreensão – o que foi acatado pela juíza federal.
O procurador baseou seu pedido em uma suspeita sobre um contrato de R$ 1,5 milhão firmado entre uma das empresas investigadas (Marcondes e Mautoni) e a LFT Marketing Esportivo, de propriedade de Luís Cláudio. “É muito suspeito que uma empresa de marketing esportivo receba valor tão expressivo de uma empresa especializada em manter contatos com a Administração Pública.”
Portanto, a empresa do filho de Lula foi incluída na investigação baseado apenas na suspeita de um procurador. Em nove meses de investigações, os delegados não encontraram tal suspeita sobre qualquer contrato.
Também foi o que bastou para que se propusesse a quebra de sigilo e fiscal do filho do ex-presidente, mas quanto aos grupos que representam o poder econômico, como o Grupo RBS, afiliada da Rede Globo, a Gerdau, os bancos Bradesco, Santander, Safra, Pontual e Bank of Boston, as montadoras Ford e Mitsubishi, investigados e que as provas apontam o pagamento de propina a integrantes do Carf para anular multas tributárias milionárias, nada se fez até agora.
Para se ter uma ideia do disparate, o documento da Polícia Federal, publicado pelo O Cafezinho, revela, por exemplo, o envolvimento de sócios das Organizações Globo num esquema que chega a mais de R$ 600 milhões. Apesar do montante ser 598 vezes maior que o verificado no contrato de Luís Cláudio, não se verificou a mesma preocupação na apuração nem por parte dos envolvidos na investigação, muito menos por parte da imprensa, que se dedicou em vasculhar e tornar pública cada contrato da empresa do filho do ex-presidente.
Agora, após a busca e apreensão na sede das empresas LFT Marketing Esportivo e da Touchdown Promoção de Eventos Esportivos Ltda, a PF decidiu tomar o depoimento de Luís Cláudio. No entanto, a juíza Célia Regina Ody Bernardes disse que desconhece o pedido da Polícia Federal.
Em nota, a juíza afirmou: “Sou a única juíza com atribuição para os procedimentos judicializados da Operação Zelotes. Digo procedimentos, e não processos, pois ainda não foi oferecida nenhuma denúncia por parte do MPF. Somente haverá processo penal propriamente dito se vier a ser recebida eventual denúncia oferecida pelo MPF.”
O que a juíza não explicou foram as informações que dão conta de que ela é irmã de Napoleão Bernardes, prefeito de Blumenau, Santa Catarina, que é do PSDB. Segundo o jornalista Eduardo Guimarães, “há muita coisa na internet sobre Celia Regina que sugere que ela é simpática ao PSDB”. De acordo ele, na eleição do ano passado, quando a campanha de Aécio Neves acusou os Correios de atuarem em favor de Dilma, a empresa tentou notificar o tucano por via judicial de que sua acusação era caluniosa e poderia gerar uma ação judicial.
“Adivinhe, leitor, quem julgou a tentativa dos Correios de notificar Aécio e deu parecer favorável a ele? Ela mesma, Célia Regina”, salientou o jornalista. E acrescenta: “Pelos seus laços políticos e familiares, ela deveria se declarar impedida de atuar contra o filho de um inimigo político de seu irmão”.
A defesa
A defesa de Luís Claudio apontou outras “ilegalidades e excessos” e entrou com um mandado de segurança junto ao TRF (Tribunal Regional Federal) reivindicando a devolução imediata de todos os materiais apreendidos nas empresas do filho de Lula, bem como a anulação de todas as consequências jurídicas da busca e apreensão.
De acordo com o pedido, a LFT firmou um contrato legítimo com a Marcondes e Mautoni, para prestar serviço de consultoria em marketing esportivo para a contratante, conforme a própria Polícia Federal corroboraria no âmbito das investigações: “O relatório policial deixou claro que a empresa Marcondes e Mautoni, que realizou pagamentos à LFT, tinha projetos relacionados à área esportiva – o Projeto Mostra Itinerante – Caminho da Copa. Tal situação justifica, à toda evidência, a prestação de serviços pela LFT”.
A defesa sustenta ainda que a simples suspeita de um procurador não é prova suficiente para autorizar uma medida tão gravosa como a de busca e apreensão, que prejudica atividade comercial da empresa buscada além de ferir sua imagem perante ao mercado.
O presidente do PT, Rui Falcão, afirma que a ação revelou uma perseguição do consórcio midiático. “A única busca e apreensão que vimos foi na casa do filho do Lula. Tem um monte de tubarão, e você vai ficar correndo atrás de um peixinho que sequer tem provas contra ele?”, questionou Falcão.