Brasileiros vencem desafios para instalar torres de estudo sobre clima
A Estação Científica do Uatumã, uma área de 250 hectares no coração da Reserva de Desenvolvimento do Uatumã, é base da cooperação científica entre Brasil e Alemanha. No local, estão instaladas três torres de pesquisa com equipamentos para estudar a interação entre a Floresta Amazônica e a atmosfera, sendo duas de 80 metros e uma de 325 metros.
Por Felipe de Oliveira, da Ascom do MCTI
Publicado 28/08/2015 16:43
As estruturas fazem parte do Experimento de Grande Escala de Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA), fruto de uma cooperação entre Brasil e Alemanha. As condições climáticas e a logística foram os principais desafios enfrentados por quem ajudou a transferir o projeto científico do papel para o coração da maior floresta tropical contínua do mundo.
A primeira equipe chegou na Reserva em setembro 2009. Liderados por Hermes Xavier, servidor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI), 22 homens, entre funcionários do Instituto e comunitários da reserva, abriram 15 quilômetros de estrada. Eles aproveitaram uma trilha criada por exploradores ilegais de Pau-Rosa para abrir o caminho. "O Pau-Rosa é uma árvore que tem um óleo muito usado na fabricação de perfumes. O ramal [trilha] estava desativado há 30 anos e a natureza já estava se regenerando nesse espaço", explica Xavier. "Abrimos uma trilha de 3 metros de largura na mata fechada para permitir a passagem de quadriciclos e caminhonetes."
Em 13 dias, a estrada já ligava a beira do Rio Uatumã ao local onde foi instalada a primeira torre de 80 m. "A cada tempestade, a estrada ficava cada vez mais enlameada. A água tomava conta do ramal", conta o servidor do Inpa. "Primeiro usávamos um quadriciclo para nos locomover e transportar as peças da torre, um trajeto que durava cerca de três horas; depois, passamos a usar um trator para trazer as estruturas metálicas. Em um determinado trecho [de ladeira], nenhum dos veículos conseguia transitar, e o material precisou ser carregado nas costas."
Dez meses depois, foi montada a segunda estrutura de 80 m. "Por quase dois anos, a equipe passou as noites em acampamentos improvisados com madeira de árvores, que já haviam caído e lonas. Deixávamos a reserva somente nos feriados ou nos dias de folga", relembra Xavier. No local é proibido caçar e derrubar árvores, mesmo que já estejam condenadas. "Toda a semana vinham barcos com água e alimentos."
Infraestrutura e nova fase
Os acampamentos foram substituídos somente em 2012. Eles deram lugar a um alojamento para 35 pessoas e outro, para 20 pessoas, foi construído em 2014. Banheiros, cozinha e uma área para lavar roupas foram erguidos. A estrada também foi recuperada. A Universidade Estadual do Amazonas (UEA) cedeu R$ 2 milhões na terceira fase do projeto LBA, quando foi iniciada a construção do Observatório de Torre Alta da Amazônia (ATTO, na sigla em inglês), que foi inaugurado no último sábado (22). "Poucas pessoas acreditavam que seria possível construir uma torre de 325 metros na Floresta Amazônica. Nossa equipe nunca duvidou", garante Hermes Xavier.
A água é bombeada de um igarapé a alguns quilômetros da Estação. A energia elétrica no local é oriunda de geradores. Por mês, são cerca de 5 mil litros de diesel para alimentar os geradores e abastecer as caminhonetes e quadriciclos.
No total, 108 servidores do Inpa, entre pesquisadores e técnicos, e quatro funcionários da Fundação Eliseu Alves participam do LBA. Um deles é Amauri Rodrigues Pereira. "Nossas vidas giram em torno das nossas famílias e desse projeto. Às vezes, passamos datas comemorativas aqui. Já comemorei dois aniversários na Estação", conta o paranaense de 51 anos, radicado na Amazônia desde 1992. "Tenho orgulho em saber que fazemos parte de um projeto científico que tem como objetivo estudar para preservar a Amazônia. Não sou cientista, mas faço parte da ciência brasileira."
Pereira perdeu as contas de quantas vezes precisou caminhar na estrada cheia de lama para buscar peças para os veículos. "Quando falta material para os veículos, a solução é improvisar, ou ir até Manaus, que são pelo menos cinco horas de viagem. Deitar na lama para arrumar um dos carros é melhor do que fazer todo o caminho de volta", detalha.
Na Estação Científica há sempre, no mínimo, dois funcionários. As equipes que fazem manutenção do alojamento e dos equipamentos se revezam numa escala onde 20 dias de trabalho equivalem a dez dias de folga.
Adir Vasconcelos Brandão faz parte do grupo que se reveza para manter a Estação Científica pronta para receber os pesquisadores. Com 61 anos, ele relata que os últimos quatro anos estão sendo especiais. "Os alemães nos ensinam a falar um pouco de inglês e a gente ensina o português", detalha Adir, que é conhecido como Careca. O dia inesquecível para ele foi há dois meses, quando o cachorro Fritz, cuidado por brasileiros e alemães, foi atacado por uma das onças que vivem na reserva. "Conseguimos afastar a onça fazendo barulho na mata. O Fritz ficou bastante machucado, mas agora, depois de ficar dois dias internado numa clínica [veterinária] de Manaus, ele aprendeu que com onça não se brinca."
Em 15 de setembro, começa uma nova fase para a Estação Científica do Uatumã. Cerca de 50 cientistas brasileiros e alemães chegam ao local para a primeira Campanha Científica de Cooperação entre Brasil e Alemanha. Até o fim de outubro, pesquisadores e estudantes dos dois países vão instalar equipamentos nas torres e fazer medições. Para melhor recepcionar os visitantes e poupar energia, um poço artesiano está sendo perfurado. Além disso, os geradores serão trocados por equipamentos mais potentes e econômicos.
Hermes Xavier (foto acima) liderou o primeiro grupo que chegou, em 2009, na Reserva Desenvolvimento do Uatumã para abrir as estradas que permitiram a chegada dos equipamentos das três torres de pesquisas montadas na Floresta Amazônica.
Aqui mais fotos da Estação Científica do Uatumã.