Dirceu é preso com base em delação, mas provas não são apresentadas
Apesar de delatores informarem que o esquema de propina na Petrobras funcionava desde o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso (PSDB), os investigadores da Lava Jato disseram que o grande “criador” do esquema foi o ex-ministro José Dirceu, preso nesta segunda-feira (3), na 17ª fase da Operação Lava Jato.
Publicado 03/08/2015 12:20
A prisão veio acompanhada de velhos fatos “novos”. A base para a prisão foram os depoimentos da delação premiada de Júlio Camargo, que teria admitido aos investigadores o pagamento de propina ao ex-ministro, e do empresário Milton Pascowitch.
“Temos claro que Dirceu era aquele que tinha a responsabilidade de definir os cargos na administração de Lula”, disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima em coletiva de imprensa sobre a nova fase da investigação. Como fez questão de falar da “administração Lula”, o delegado foi indagado se o ex-presidente poderia ser investigado: “Nenhuma pessoa está livre de ser investigada" e em seguida reforçou o alvo, sem citar nomes, “há investigações em andamento, grande parte em sigilo".
Pela declaração do procurador, Dirceu foi preso por exercer a função de ministro, que de acordo com a Constituição Federal, deve exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República.
Segundo os procuradores, eles têm “provas suficientes" para efetuar a prisão de José Dirceu, apesar das tais provas não terem sido apresentadas. Segundo os procuradores, Renato Duque foi indicado para a diretoria de Serviços da Petrobras por José Dirceu – tese baseada na função que Dirceu exercia como ministro da Casa Civil. A partir disso, teria organizado o esquema de pagamento de propinas.
O delegado da Polícia Federal em Curitiba Márcio Adriano Anselmo disse que a quantia seria superior a R$ 20 milhões. Alguns repasses eram feitos "em espécie, mensalmente", não apenas à JD Consultoria, mas a "pessoas ligadas a José Dirceu", afirmou. Depois disse que a JD Consultoria teria recebido, no total, R$ 39 milhões. Aí cabe a pergunta: afinal, são R$ 20 milhões ou R$ 39 milhões?
Apesar do ex-ministro informar que esses pagamentos foram de serviços de consultoria prestados a essas empresas, o que aliás é uma prática de diversas lideranças políticas, somente as consultorias feitas por pessoas ligadas ao PT são alvo de investigações e prisões.
De acordo com os investigadores, os delatores informaram que os pagamentos foram feitos sem que qualquer serviço fosse prestado, por causa da "influência de Dirceu no PT". Ricardo Pessoa, por exemplo, teria dito aos procuradores que contratou Dirceu para prospectar negócios no Peru e na Espanha e que fez aditivos ao contrato original sem que houvessem novos serviços a serem prestados, mas depois afirmaram que os aditivos foram feitos porque “Dirceu precisava de dinheiro para despesas pessoais”. Afinal, tinha ou não tinha motivos?
Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão de José Dirceu e sócio dele na JD Consultoria também foi preso, em Ribeirão Preto. Outro detido é Roberto Marques, ex-assessor do petista.
No despacho do juiz federal Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava Jato, ele afirma que a prisão de Dirceu é porque o ex-ministro “teria insistido” em receber dinheiro de propina em contratos da Petrobras mesmo após ter deixado o governo, em 2005. Isso mesmo: teria.
No pedido de prisão, Moro afirma ainda que as provas levantadas até agora na Lava Jato apontam que o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, também investigado, foi indicado para o cargo por influência de Dirceu.
"As provas até o momento colhidas revelam que Renato de Souza Duque, o ex-diretor de Serviços e Engenharia da Petrobras, teria sido nomeado ao seu posto por influência de José Dirceu e de associados deste e que, na divisão dos valores de propina dirigidos à Diretora de Serviços e Engenharia, parte caberia a José Dirceu e ao seu grupo. José Dirceu teria persistido em receber sua parcela, mesmo depois de ter deixado o cargo de Ministro da Casa Civil", escreveu Moro no despacho.
Enquanto as investigações contra o tucano Antonio Anastasia, senador pelo PSDB de Minas Gerais, podem ser arquivadas por conta de ter apenas o depoimento de delator, o juiz afirma que os pagamentos a Dirceu foram confirmados por suspeitos de intermediar a propina no esquema, que firmaram acordo de delação premiada para livrar a própria pele de eventuais penas.
Moro escreveu que, em um dos depoimentos, Camargo afirmou que repassou cerca de RS$ 4 milhões da parcela de propina destinada à Diretoria de Serviços da Petrobras a José Dirceu. De acordo com o juiz, o delator não deu mais detalhes nessa ocasião.
Moro também cita o comprovante de pagamento por Milton Pascowitch da reforma de um imóvel em Vinhedo para utilização de Dirceu. O valor foi de pouco mais de R$ 1 milhão.
Leia o trecho do depoimento de Pascowitch sobre a tal reforma: