Diego Angelo Bertozzi: A bolha chinesa
Não foi preciso muito para que se gritasse sobre a enésima traição consumada pelo “reformista” Xi Jinping, presidente da República Popular da China e secretário-geral do Partido Comunista Chinês.
Por Diego Angelo Bertozzi, em Marx21
Publicado 13/07/2015 16:17
Bastou que a “bolha acionária” – aquela que deveria ter causado o colapso da economia chinesa e o surgimento de um 1929 com olhos de amêndoa – se esvaziasse um pouco para que se voltasse a apontar o dedo contra o dirigismo e o estatismo chinês; e, por fim, contra o excesso de “ideologismo” que ainda impera nas salas de Zhongnanhai. [sede do Partido Comunista Chinês – N. do T.]
Mas o contrário é que seria estranho: a potência asiática é governada por um partido comunista que, não obstante o aprofundamento da reforma econômica e da abertura aos mercados internacionais, sempre reafirmou a centralidade da economia pública e o caráter estratégico do seu colosso estatal, verdadeiro braço “armado” da projeção internacional de Pequim.
Bastou que o governo interviesse com decisões para estabilizar o mercado acionário chinês, depois de dias de pesadas perdas na bolsa de Xangai, ao ponto de registrar uma queda de mais de 30% em comparação com o mês de junho, e ao término de um crescimento de 150% em um ano. Para o Daily Telegraph, tudo estava claro: era simplesmente uma pantomima grega; “enquanto os ocidentais estão com as atenções concentradas na Grécia, uma crise financeira potencialmente muito mais significativa se está desenvolvendo no outro lado do mundo, aquela que alguns estão começando a chamar de o 1929 chinês”.
Imediatamente, especialistas e economistas atuavam como bombeiros e entre estes Qu Hongbin [1], economista chefe do HSBC para a China, que em uma nota especificou que “os efeitos do mercado financeiro na China são menores do que se acredita, porque as ações representam menos de 15% dos bens em poder das famílias chinesas e a emissão acionária menos de 5% do financiamento do conjunto da sociedade” e que, ao contrário, “para a família média chinesa, o crescimento do consumo é guiado principalmente pelo crescimento do rédito, não pela valorização da riqueza. A maior parte das famílias mantém a própria riqueza em espécie e depósitos, não em ações”. São poucas as preocupações também no front das empresas porque, ainda segundo Qu Hongbin, “a maior parte delas não se baseiam nos títulos acionários como fonte de financiamento, e uma parte enorme do setor bancário chinês não está estreitamente ligada ao mercado acionário”. Enfim, tanto as empresas como as pessoas físicas veem no mercado acionário a ocasião para lucros a curto prazo e não como uma indicação de bem-estar, sinalizando uma forte diferença com o ocidente”. A mesma argumentação foi apresentada pelo The Economist: as famílias chinesas investem pouco no mercado acionário e este último representa apenas 15% do PIB [2].
Mas vamos à causa do escândalo, vale dizer, às intervenções decididas pelo Conselho de Estado (o governo) e que, aliás, deram imediatamente resultados positivos: a proibição aos investidores que têm mais de 5% das ações de uma sociedade de venderem títulos nos próximos seis meses; a mobilização de numerosas agências de intermediação e gestores de fundos para a aquisição de ações por um valor de bilhões de dólares e, por fim, o convite feito às maiores empresas do Estado a não venderem ações e de as adquirirem ao máximo possível para a salvaguarda da estabilidade do mercado.
E eis que, segundo diversos comentários publicados no autorizado China Morning Post [3] (Hong Kong) e, mais nas entrelinhas, por The Economist, o decantado empenho a favor do “papel decisivo” do mercado se revelou um blefe diante da necessidade de salvaguardar o poder e o domínio do partido comunista. Uma “intervenção desenfreada” do governo pôs assim um “enorme ponto de interrogação sobre o empenho do líder para abraçar plenamente o capitalismo de mercado”. E eis a sentença de lesa-majestade do mercado que condena um governo (aquele que é a expressão do Partido Comunista Chinês), que não consegue abandonar sua história e sua ideologia: “A China não traçou jamais uma linha clara na escolha entre uma economia planificada de molde maoísta e o livre mercado, não obstante três décadas de reforma gradual de natureza capitalista. O governo central continua a abraçar alguns elementos da economia liberal, mas a última intervenção demonstra que está ainda caminhando sobre o fio da navalha entre as duas ideologias opostas”. Em suma, o que o partido comunista espera para se tornar um partido liberal normal? E quando vai parar de pedir a intervenção da política e do Estado em face da falência do mercado?
Teimosos, esses chineses!
Tradução de José Reinaldo, editor do Portal Vermelho