Mídia brasileira viola direitos humanos, dizem especialistas
As violações de direitos na mídia brasileira, principalmente em relação a crianças e adolescentes, foram debatidas nesta quinta-feira (18) no último dia do seminário Andi 21 anos – A Mídia Brasileira e os Direitos Humanos: Avanços e Desafios, realizado em Brasília nesta semana.
Publicado 18/06/2015 18:01
Um dos assuntos abordados foi a aprovação, na comissão especial, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/1993, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos, e sua relação com os chamados “programas policialescos” e as mídias que tratam o adolescente autor de ato infracional como bandido.
Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e secretária Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Angelica Moura Goulart disse que a sociedade civil precisa se organizar para conseguir derrubar a proposta, que será votada no plenário da Câmara no dia 30. Como se trata de PEC, para ser aprovada são necessários os votos favoráveis de, no mínimo, 308 dos 513 deputados.
No primeiro dia de debates do seminário da Andi, o assunto foi tema central das discussões.
“O que temos hoje é uma situação de constatação e impotência diante das aberrações na mídia, principalmente em relação a crianças e adolescentes. O fato de ter cometido ato infracional não retira desses meninos o direito de cidadão. Isso não fica claro e as organizações ficam sem recursos para enfrentar a enxurrada de violações [na mídia]”, informou Goulart.
De acordo com a diretora da Andi, Miriam Pragita, no segundo semestre deste ano a entidade apresentará um trabalho de pesquisa de monitoramento de violações na mídia que, segundo ela, revelam um constante desrespeito à legislação brasileira sobre o respeito aos direitos humanos.
Para a presidente do Conanda, “esse instrumento será uma celebração para o momento de retrocessos, de falta de entendimento. Grande parte do que assistimos é uma campanha da mídia para derrubar, desconstruir princípios construídos nos últimos 25 anos”, explicou Goulart. Ele destacou que o trabalho poderá basear qualquer confrontação com os meios de comunicação que argumentam que regular a mídia é fazer censura.
Presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude, Maria Roseli Guiessmann afirmou que a mídia tem o papel fundamental de assegurar os direitos das crianças e adolescentes, inclusive para esclarecer que eles são punidos e podem ser presos quando cometerem alguma infração.
“Apesar do Estatuto da Criança e do Adolescente [ECA] colocar internação e não prisão, parece até uma tarefa impossível levar ao conhecimento da população que temos crianças trancadas o dia todo em uma cela. São vários termos que levam a sociedade a acreditar que não há nenhuma responsabilização. É inquestionável o poder da mídia de passar essas informações.”
Guiessmann acrescentou que o ECA é descumprido nessas situações, já que a internação deveria vir acompanhada de medidas socioeducativas para reinserção dos adolescentes na sociedade.
Também foram debatidos hoje os instrumentos atuais de regulação da mídia, entre eles a classificação indicativa de programas do Ministério da Justiça, o papel fiscalizador do Ministério das Comunicações e da Anatel e a autorregulação dos próprios veículos.
Para a coordenadora executiva do Intervozes, Bia Barbosa, é necessário um acompanhamento sistemático dos meios de comunicação, publicizar os casos de violação apurados, punir com instrumentos mais efetivos e multas mais altas os veículos, inclusive com suspensão da outorga, e informar a população sobre os canais de denúncia.
“Precisamos desconstruir a ideia de que regulação é censura. Se conseguirmos a classificação indicativa desses programas, já será um avanço. Algumas coisas não poderiam sequer passar na televisão. Isso é proteger as crianças, proteger os direitos humanos e não cercear a liberdade de expressão. O discurso da maioridade penal é inflado pelos programas policialescos", concluiu Bia.