Dilma: América Latina não admite medidas unilaterais e golpistas
Em seu discurso nesta quarta-feira (10) durante a 2ª Cúpula União Europeia – Celac, na Bélgica, a presidenta Dilma Rousseff rechaçou qualquer proposta de impor sanções contra a Venezuela, ideia aventada pelos EUA, e apontou as prioridades na educação e nas relações comerciais com o bloco.
Publicado 11/06/2015 10:42
Diante dos integrantes da cúpula, da qual participam líderes de países europeus e do continente americano, Dilma destacou a atuação da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) na promoção de um diálogo político com a Venezuela, “buscando contribuir ao pleno respeito, por todos, ao Estado democrático de Direito e à Constituição”.
E advertiu: “Nós, países latino-americanos e caribenhos, não admitimos medidas unilaterais, golpistas e políticas de isolamento. Sabemos que tais medidas são contraproducentes, ineficazes e injustas. Por isso, rechaçamos a adoção de quaisquer tipos de sanções contra a Venezuela”.
Fim do bloqueio a Cuba
Reforçando esse princípio, Dilma saudou os avanços nas relações diplomáticas entre Cuba e EUA e das relações comerciais com a União Europeia, mas afirmou que o “o fim do anacrônico embargo – que, há mais de cinco décadas, vitima o povo cubano – é imprescindível para completar essa mudança”.
A presidenta destacou que o Brasil mantém uma forte relação de cooperação com Cuba, que garantiu o financiamento do megaporto de águas profundas em Mariel. “Ao mesmo tempo, Cuba contribuiu para o Programa Mais Médicos que ampliou o atendimento básico de saúde para 63 milhões de brasileiros”, lembrou.
Dilma com Evo Morales, presidente da Bolívia |
Relações comerciais
A presidenta também reafirmou que o Brasil e o Mercosul têm condições de apresentar propostas comerciais à União Europeia nos próximos "dias ou meses", com o objetivo de estabelecer um acordo de livre comércio. Segundo Dilma, a União Europeia já possui acordos comerciais com 26 países da América Latina e do Caribe.
“O Mercosul quer agora consolidar essa relação, avançando nas negociações com a União Europeia. Essa é uma prioridade na agenda externa do Mercosul e do Brasil. Estamos prontos para dar início, ainda este ano, ao intercâmbio simultâneo de ofertas de acesso a mercados, para que possamos concluir acordo abrangente e equilibrado, em 2015”, salientou Dilma.
Crise econômica
Em entrevista coletiva, a presidenta comentou a situação econômica dos países chamados emergente. Segundo ela, apesar da recuperação lenta, economias como Brasil e China estarão num processo de retomada a partir do ano que vem.
“Apesar do fim do superciclo das commodities, que se encerrou, eu acho que todos esses países terão uma recuperação, Brasil, China, África do Sul e Rússia", afirmou Dilma, que considera ter havido uma mudança de patamar no crescimento na América Latina. "De um lado, por conta dos minérios, como cobre, e de outro lado, por conta do preço do petróleo”, disse.
Sobre a elevação da inflação, Dilma afirmou: "A causa da inflação não é estrutura, é conjuntural. Era isso que estava querendo dizer. O outro lado é o fato de que, além disso, nós sofremos as consequências do ajuste cambial. Esse ajuste cambial não fomos nós que provocamos, nós sofremos o efeito dele".
Confira a integra do discurso da presidenta Dilma na II Cúpula da EU-Celac.
Saúdo os Presidentes do Conselho Europeu, Donald Tusk, e da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, pela realização desta II Cúpula Celac-UE.
Felicito igualmente o Presidente do Equador, Rafael Corrêa, pelo trabalho de seu Governo na presidência da Celac.
A Celac, que aqui dialoga com a UE, é expressão de uma região que se redescobriu.
Somos uma zona de paz, livre de armas de destruição em massa e na qual estão consolidados a democracia e o Estado de Direito.
Uma região que vem obtendo grandes êxitos no combate à pobreza e na redução das desigualdades.
Uma região que cultiva o entendimento e o consenso, respeitando a diversidade de seus membros.
De fato, o reatamento das relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos removeu os últimos resquícios da Guerra Fria na América Latina e no Caribe.
Os presidentes Raúl Castro e Barack Obama deram prova de coragem política e contaram com a importante contribuição do Papa Francisco.
O fim do anacrônico embargo – que, há mais de cinco décadas, vitima o povo cubano – é imprescindível para completar essa mudança.
O Brasil manteve com Cuba uma forte relação de cooperação na última década. Financiamos o investimento de um megaporto de águas profundas em Mariel, Cuba. Ao mesmo tempo, Cuba contribuiu para o Programa + Médicos que ampliou o atendimento básico de saúde para 63 milhões de brasileiros.
Assim, saudamos os recentes movimentos de reaproximação da União Europeia com Cuba, inclusive com visitas de alto nível, como a do presidente Hollande, e a da Alta Representante Mogherini.
Ressalto igualmente a determinação do povo colombiano e do Presidente Santos em sua persistente busca de solução política para um dos mais longevos conflitos na região. A opção pela paz negociada na Colômbia é inestimável para todos nós da América Latina e Caribe e para o mundo.
Nós, países latino-americanos e caribenhos, não admitimos medidas unilaterais, golpistas e políticas de isolamento. Sabemos que tais medidas são contraproducentes, ineficazes e injustas. Por isso, rechaçamos a adoção de quaisquer tipos de sanções contra a Venezuela.
A Unasul trabalha arduamente para promover o diálogo político na Venezuela, buscando contribuir ao pleno respeito, por todos, ao Estado democrático de Direito e à Constituição.
Senhoras e senhores,
Saúdo o tema escolhido para esta Cúpula: "Construindo nosso futuro comum: trabalhando para conseguir sociedades mais prósperas, coesas e sustentáveis para nossos cidadãos.”
O potencial da nossa parceria reflete-se no crescente volume de comércio birregional que, entre 2000 e 2014, passou de 90 bilhões para 267 bilhões de dólares.
Os acordos comerciais que a União Europeia já possui com 26 países da América Latina e do Caribe lhe garantiram posição de destaque como sócio comercial da região.
O Mercosul quer agora consolidar essa relação, avançando nas negociações com a União Europeia. Essa é uma prioridade na agenda externa do Mercosul e do Brasil. Estamos prontos para dar início, ainda este ano, ao intercâmbio simultâneo de ofertas de acesso a mercados, para que possamos concluir acordo abrangente e equilibrado, em 2015.
Somos 600 milhões de latino-americanos e caribenhos, em processo de forte mobilidade social, constituindo novos e dinâmicos mercados internos.
Formamos sociedades cada vez mais urbanas, nas quais crescem demandas por educação, moradia, saúde, transporte e saneamento de qualidade.
Consideramos ainda imprescindível estimular o empreendedorismo por meio do incentivo à cooperação que beneficie as micro e pequenas empresas. Chegamos este ano a um marco histórico: 10 milhões de microempreendedores e de micro e pequenas empresas.
Se investimentos e comércio unem nossas economias, a educação, sem dúvida, aproxima nossas sociedades. Ela é o principal fator de fortalecimento da cidadania e assegura que a inclusão social seja permanente.
Rompe o círculo vicioso da desigualdade e resgata a dívida social que ainda aflige milhões de latino-americanos e caribenhos.
Com educação de qualidade, lançamos as bases para o futuro, gerando oportunidades, nos projetando no mundo da ciência e da tecnologia, buscando a inovação de processos e produtos. Com a educação forjamos o passaporte de nossas sociedades para a economia do conhecimento.
A melhoria dos níveis educacionais é para nós uma necessidade e uma enorme oportunidade de parceria entre as duas regiões.
O intercâmbio científico e tecnológico irá acrescer valor a nossas economias e às nossas sociedades.
Sem dúvida, é preciso fortalecer o nosso intercâmbio acadêmico e tecnológico, criando e ampliando programas que facilitem maior contato entre as instituições de ensino e de pesquisa latino-americanas, caribenhas e europeias.
O Brasil, por exemplo, tem metade dos bolsistas (47.610 de 101.446) do Programa Ciência sem Fronteiras em universidades e centros de pesquisas europeus. Valorizamos muito a inclusão de um novo eixo sobre educação superior no Plano de Ação 2015-2017 que hoje aprovamos, abrangendo as ações de formação, compartilhamento de conhecimento e transferência de tecnologias.
Essa medida complementará a Iniciativa Conjunta Celac-UE de Pesquisa e Inovação. Queremos que nossas Universidades, nossos laboratórios e instituições de pesquisa cooperem.
Um outro eixo importante da parceria UE-Celac ocorre na área da formação profissional, que garanta o acesso dos nossos países aos modernos padrões europeus de ensino técnico.
Senhores e Senhoras chefes de Estado e de Governo
A mudança do clima é outro grande desafio com que nos defrontamos. Vencê-lo exige sentido de urgência, coragem política e o entendimento de que cada um deverá contribuir para essa luta segundo suas responsabilidades diferenciadas e respectivas capacidades.
Queremos fazer da COP 21 em Paris um marco na governança ambiental.
O Brasil defende a adoção de um acordo ambicioso e equilibrado no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.
A resolução brasileira adotada, em 2009, estabeleceu uma redução voluntária de no mínimo 36% das emissões de gases de efeito estufa, no horizonte de 2020, com base em 2005.
Estamos contribuindo decisivamente para a redução das emissões globais, uma vez que, em 2015, já atingimos 72% dessa ambiciosa meta. Esse resultado vem sendo obtido por meio de três iniciativas principais:
1ª a redução drástica do desmatamento;
2ª a ampliação das fontes renováveis de nossa matriz energética e
3ª a adoção da política de agricultura de baixo carbono.
Defendemos o princípio das responsabilidades comuns porém diferenciadas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Adotamos voluntariamente um esforço significativo de redução de emissões.
Acreditamos, no entanto, ser imprescindível que a cooperação na área do clima entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento se dê por meio do financiamento de ações de mitigação, crédito de carbono e transferência de tecnologia sustentáveis.
Nós, países em desenvolvimento, estamos provando que um modelo socialmente justo e ambientalmente sustentável é possível. O Brasil tem se esforçado nessa direção. Aprovamos na conferência Rio+20 que é possível preservar, conservar, crescer e incluir.
Há exatos três anos, essa conferência nos legou um caminho comum rumo ao desenvolvimento sustentável.
Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem adotados sob o patrocínio das Nações Unidas constituirão a base da Agenda de Desenvolvimento Pós-2015, que aprovaremos em setembro próximo. Nosso desafio é torná-la realidade efetiva e concreta para bilhões de seres humanos. Precisamos ser igualmente ambiciosos em matéria de financiamento, cooperação, construção de capacidades nacionais e transferência de tecnologias, sobretudo em favor dos países em desenvolvimento.
É isso que define o futuro das nossas relações Celac-UE. Que esse futuro seja a construção de um mundo cada vez mais justo, mais igual, que viva em paz, sem os preconceitos que levam à intolerância. O mundo do diálogo entre parceiros.
Muito obrigada.