Publicado 27/04/2015 10:26 | Editado 04/03/2020 16:25
As mobilizações do dia 15 de março surpreenderam pela quantidade de participantes presentes nas ruas de várias cidades do país. Porém, seu centro não foi reivindicatório, mas de protesto contra a corrupção. Tentou-se passar a ideia de que se tratava de um movimento espontâneo de catarse contra a situação em que se encontra o país, expressado nas cores verde e amarelo, sem estrutura de apoio ou organização, algo semelhante ao ocorrido em junho de 2013.
O argumento de um movimento espontâneo passou a ser desmontado já nas disputas para afirmar o número de participantes em cada cidade. A imprensa, ao divulgar os números, registrava, ao mesmo tempo, o número de participantes anunciado pela polícia e o anunciado pelos organizadores. Esses anunciavam sempre um número bem maior do que o anunciado pela polícia e são os que financiaram os carros de som, a manutenção de blog para mobilizar gente, a confecção de faixas, o aluguel de ônibus para levar gente, tudo igualzinho como fazem os partidos e sindicatos de esquerda. Claro que essa mobilização teve efeito multiplicador e muita gente foi aderindo, se mobilizando e fazendo seus próprios cartazes.
Quem são os principais organizadores? São três os principais:
Movimento Brasil Livre – MBL, organização fundada em 2014 com o objetivo de promover a economia de mercado [neoliberalismo] como solução para o país. Alguns de seus membros são filiados ao Instituto Liberal e ao Instituto Von Mises. Em 2014, eles apoiaram a candidatura de Aécio Neves; e para 2015, eles têm como objetivo derrubar o governo Dilma e consolidar o fora PT como forma de desgastar o nome do ex-presidente Lula como candidato pós-Dilma. Em seu site, apoiam claramente o impeachment;
Estudantes Pela Liberdade – EPL, uma OSCIP brasileira filiada ao Students For Liberty, organização financiada pelos irmãos Hoch [David Hoch e Chales Hoch], que têm como negócio atividades no ramo da exploração de petróleo, gás, oleodutos, refinarias e produção de produtos químicos e fertilizantes. O interesse dos irmãos Hoch no Brasil é a Petrobras;
Movimento Vem Pra Rua, que criou outros movimentos virtuais, paga blogueiros para postar mensagens e fazer mobilizações. É ligado ao PSDB e tem como objetivo fazer oposição ao governo e ao PT.
Bem, se alguém pensou que as mobilizações de 15 de março e 12 de abril foram o reflexo da pura indignação de cidadãos contra a corrupção, enganou-se totalmente, e ainda foi manipulado em seus sentimentos por interesses outros que não são o combate à corrupção no país. E os manipuladores de subjetividades ingênuas apresentaram, no dia 15 de abril, em Brasília, uma “Carta do Povo Brasileiro” para parlamentares e partidos citados em vários escândalos de corrupção. Essa carta é o marco do abandono das mobilizações de ruas e a estreia na sua nova estratégia: o lobby político junto ao Congresso Nacional.
E por que os organizadores das mobilizações abandonaram as ruas?
Penso que foi porque as ruas passaram a ter um tom forte contra a corrupção e não ao real interesse dos organizadores. Além disso, o escândalo das contas secretas no HSBC e a Operação Zelotes [pagamento de propina para aliviar as multas tributárias de rentistas e empresários], escândalos bem mais graves que o do Petrolão, onde muitos dos aliados dos organizadores estão envolvidos, não foram nem mencionados pelas entidades organizadoras das mobilizações. Não foi gratuito, portanto, que, nas manifestações do dia 12 de abril, alguns manifestantes carregaram cartazes que diziam que “sonegação não é crime”.
Somam-se a isso o fato de que as mobilizações do dia 12 de abril foram bem menores que as primeiras, embora muito significativas e com uma capacidade bem maior que a dos grupos de esquerda, porém trouxe uma diversidade de reivindicações, não foi só protesto. Essas reivindicações foram ignoradas pelos meios de comunicação que, fazendo coro com o objetivo dos organizadores, sintetizaram tudo no tripé: fim da corrupção, fora Dilma e fora PT. Acho que os organizadores pressentiram que poderiam perder a disputa nas ruas, que as mobilizações poderiam virar um movimento forte contra a corrupção e não contra a derrubada do governo.
Além disso, pesquisa do Datafolha, realizada no dia 12 de abril, demonstrou o seguinte: no dia 15 de março, 83% dos participantes nas mobilizações eram eleitores de Aécio Neves; já no dia 12 de abril, 82%, ou seja, nas duas manifestações, a maioria era de eleitores de Aécio Neves [PSDB]; e mais, apenas 15% do total dos participantes saíram de casa com a intenção de pedir o impeachment da Dilma. Esses dados podem ter orientado os organizadores a optarem pelo lobby político junto aos setores conservadores e corruptos do Congresso Nacional para darem continuidade ao seu único objetivo estratégico: o pedido de impeachment contra a presidente Dilma. Pois os organizadores das manifestações são defensores do capitalismo, e o capitalismo só funciona nos grandes negócios, nacionais e internacionais, movido pela corrupção e pela propina. A ideologia do livre mercado é conversa para boi dormir.
*Uribam Xavier é professor do Departamento de Ciências Sociais da UFC.
Fonte: Blog do Eliomar
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