A terceirização e a mídia burguesa
Nesta quarta-feira (22) o fato mais relevante do cenário nacional foi a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da terceirização sem limites, medida que afetará diretamente dezenas de milhões de brasileiros.
Publicado 23/04/2015 16:57
Uma notícia de tal magnitude deveria, teoricamente, ser manchete em todos os jornais, que dedicariam inúmeras páginas noticiando a votação e apresentando gráficos e estudos sobre os impactos econômicos e sociais. Teoricamente seriam feitas entrevistas não só com especialistas, mas com a população. Aliás, as famosas pesquisas de opinião do Ibope ou do Datafolha seriam inevitáveis para aferir o quanto de apoio tem uma medida de tal impacto na vida do povo. Isso tudo claro, na teoria, pois a dura realidade da luta de classes destrói quaisquer ingênuas ilusões em torno de mitos como “liberdade de imprensa” e “isenção jornalística”.
Terceirização – Quando os argumentos não bastam
Vejam as capas das edições dos jornalões nesta quinta-feira (23). Em nenhuma delas a aprovação da terceirização ampla mereceu a manchete, ocupadas pela exploração política do balanço da Petrobras, assunto importante, mas nem de longe com o impacto social do que foi aprovado pela Câmara. Nas chamadas sobre o assunto terceirização destaca-se apenas a “derrota do governo” (cujo líder orientou contra a votação). As matérias sobre a aprovação do PL 4330 prendem-se ao factual, e mesmo assim com grande superficialidade. Isso porque a mídia não pretende alertar o povo sobre o que está em jogo, temendo uma reação. A terceirização ampla é tão indefensável, que por mais que se chame “especialistas” para provar por A + B que a terceirização será muito boa, a imensa maioria dos trabalhadores, mesmo aqueles que “detestam política”, sentem que estão para perder algo importante. O raciocínio é mais ou menos assim: “entre ficar desempregado e trabalhar terceirizado, o melhor é trabalhar terceirizado, mas entre trabalhar com carteira assinada e trabalhar terceirizado só um louco prefere ser terceirizado”. De fato, pergunte a qualquer dos defensores da terceirização se abrem mão da carteira assinada – caso tenham – para se tornarem terceirizados. A precarização do trabalho é óbvia, a perda de direitos é evidente e a demissão de trabalhadores com carteira assinada para serem substituídos por terceirizados ganhando menos será inevitável. Isso, nenhum “especialista” consegue esconder do povo.
Terceirização – Os especialistas convenientes
O jornal O Globo, que foi contra a criação do 13º salário, hoje é a favor da terceirização. Na edição desta quinta-feira (23), a cobertura modesta sobre a votação do PL 4330 (somente uma página) tem como cereja do bolo a opinião de Gesner Oliveira, apresentado apenas como “ex-presidente” do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Para Gesner, colocar limites à terceirização “é ruim para o país e os trabalhadores”. O Globo optou por não ouvir a opinião de um trabalhador, mas sim do proprietário de uma consultoria (GO – Gesner Oliveira – Associados) especializada em assessorar grandes empresas, qualificação que o jornal julgou irrelevante informar aos leitores. Mas sem dúvida, Gesner é um sujeito moderno e progressista, vejam como ele responde à pergunta que liga terceirização à precarização: “não vejo nexo causal. Isso independe do debate da terceirização. Qualquer empresa tem que estar atenta à sua cadeia de suprimentos, que não use trabalho escravo, informal”. Vejam que avançado. Ele é contra o trabalho escravo. E confia que a empresa, sem normas que a obriguem a tal, estará “atenta” aos direitos dos seus trabalhadores… Esta é a nossa mídia hegemônica. Mas se chamar de mídia burguesa ela também atende.
O Estado de S. Paulo chama Stédile de “fora da lei”
Editorial do jornal O Estado de S. Paulo desta quinta-feira (23) a pretexto de atacar o PT, condena o ato do governador de Minas, Fernando Pimentel, de condecorar o líder do MST, João Pedro Stédile, com a Medalha da Inconfidência. O jornal da família Mesquita diz que Stédile é “um notório fora da lei”. Stédile é uma liderança política de uma organização social reconhecida internacionalmente. Não é foragido, nem tão pouco é condenado por qualquer crime. Com esta condição viaja livremente pelo Brasil e pelo exterior. Recentemente Stédile, que é católico (como o Estadão, aliás) foi recebido pelo papa. No entanto, o jornal assaca contra sua honra com a tranquilidade de uma entidade acima do bem e do mal. Tal fato revela a soberba e a truculência como marcas de uma nova postura que a direita vem assumindo no Brasil, aproximando-se do fascismo. Isso é fruto de uma ofensiva política que tenta acuar a esquerda, mas também é mostra da profunda confiança do consórcio oposicionista na aliança tácita com parte do poder judiciário, o que garantiria ao braço midiático direitista salvo conduto para toda sorte de abusos e ao seu braço parlamentar anteparo para projetos golpistas. Mas o que O Estado de S. Paulo e os seus parceiros precisam entender é que, apesar dos desejos ocultos, a democracia ainda vigora no Brasil. A ditadura militar, que o Estadão tanto apoiou e que permitia chamar opositores políticos de “terroristas”, além de condená-los à tortura e à morte, foi derrotada. Lembrá-los disto é travar sempre a luta de ideias de forma incessante, nas ruas, nas redes, nas academias, nas urnas e, se necessário, mesmo nos tribunais, onde a verdade de vez em quando dá as caras.
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