Brasil perde Vanja Orico: dama do cinema, da televisão e do teatro
Nesta quarta-feira (28) faleceu Vanja Orico, intelectual que interpretou o Brasil através de gestos e olhares. Por acaso, transformou-se em atriz e cantora. Acaso mesmo. Aconteceu que estava passeando por Roma, a capital italiana, e curiosa aproximou-se de uma equipe que realizava a cena de um filme. Resolveu cantar e encantou o diretor Federico Fellini.
Por Luiz Carlos Prestes Filho*
Publicado 29/01/2015 11:16
- Foto: Divulgação
No outro dia, com violão nas mãos, interpretou profissionalmente a canção "Meu Limão, Meu Limoeiro, Meu Pé de Jacarandá", cena sue foi incluída no filme daquele que foi um dos maiores cineastas de todos os tempos.
Vanja foi uma mulher valente, sobre a qual tive a honra de realizar um filme documentário, há 10 anos.
Sem medo ajoelhou-se frente a veículos militares, que avançavam sobre estudantes em passeata no Rio de Janeiro, gritando: "Não atirem, somos todos brasileiros".
Este ato de bravura lhe custou a fama. Foi eliminada de qualquer programa da TV Globo, empresa que apoiou o regime fascista que assumiu o poder no Brasil após o golpe civil-militar de 1964.
Nem o reconhecimento internacional de seu talento, comprovado pela Palma de Ouro de Cannes do filme "O Cangaceiro" de Lima Barreto", impediu a violência dos seus algozes. Sua arte foi silenciada.
Sim, Vanja foi silenciada até a morte. A esta grande atriz foi negado em vida o reconhecimento de sua grandiosidade artística e humana.
Amigos sinceros, como Geraldo Vandré, nunca a abandonaram. Entre estes o meu pai, Luiz Carlos Prestes, e minha mãe, Maria. As portas da casa deles sempre esteve aberta para ela. Pois, a camarada Vanja sempre estava disposta a vender o seu carro ou apartamento para ajudar a realização da revolução socialista no Brasil. Inclusive, comparecendo, ao lado do meu pai e mãe, em comícios de porta de fábrica para distribuição de panfletos e apresentações.
Existia uma força sobrenatural nesta mulher, orgulhosa em ter sangue de índios e negros nas veias.
A morte abre uma nova perspectiva. A da real possibilidade das novas gerações reconhecerem o seu papel fundamental na História da arte dramática nacional. Entender, visualizar e provar que está foi e sempre será a grande Dama do cinema, da televisão e do teatro. A outra é pura invencionice da mídia. Pessoa que não sofreu nem uma décima parte do que sofreu a Vanja Orico. Sofreu com dignidade e estoicismo implacável.
*Luiz Carlos Prestes Filho é formado em direção de filmes documentários pelo Instituto de Cinema da União Soviética.
**Título original: "Brasil perde Vanja Orico – a Verdadeira Dama do Cinema, da Televisão e do Teatro Brasileiro".