RJ: Marinha e comunidade quilombola fecham acordo sobre demarcação
A luta centenária pela regularização fundiária da Comunidade Remanescente de Quilombo da Ilha da Marambaia, no Rio de Janeiro, está próxima do fim. Hoje (27), será assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), costurado pelo Ministério Público Federal (MPF), entre os quilombolas, a Marinha – que administra uma base militar na ilha – e o governo federal.
Publicado 27/11/2014 10:35
O documento assegura a permanência dos atuais 430 quilombolas e a continuidade das atividades militares, além de acabar com as disputas travadas entre as partes na Justiça nos últimos 12 anos.
Um dos principais articuladores do TAC, o procurador Daniel Sarmento explica que, com o acordo, os dois lados tiveram que ceder. A Marinha mantém o cais, fica com todas as áreas de treinamento e continua responsável pelo transporte na ilha, incluindo o de moradores e de visitantes convidados – pois é necessário convite para entrar no local. Já a comunidade terá mais facilidade para receber visitas, atracar os barcos de pesca mais próximos às moradias, reformar e construir casas – o que chegou a ser proibido em decisões da Justiça, a pedido dos militares.
O acordo, que também foi mediado pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), deixa de fora a Área de Proteção Ambiental (APA) Mangaratiba, reivindicada pela comunidade. Os moradores, no entanto, continuam podendo entrar no local e acessar fontes de água doce. “Havia preocupação com a superpopulação da comunidade que prejudicasse o meio ambiente”, explica o procurador. O mesmo cuidado a Marinha deverá ter durante os treinamentos, alerta ele.
O presidente da Comunidade Remanescente de Quilombo da Marambaia, Nilton Alves, comemora o fim do impasse. “O território foi dividido em áreas coletivas e específicas. Eles [militares] ficam com os locais de treinamento. Nós [quilombolas], com as moradias, áreas de plantio e pesca, de onde tiramos o sustento”, disse. Ele acrescenta que o acordo também deixa sob domínio da comunidade áreas históricas, como a antiga senzala. Antigamente, Marambaia servia de entreposto de africanos escravizados, que eram comercializados no Rio, à época capital do império.
A Marinha, por meio de nota, considerou o acordo um marco significativo. Esclareceu que o TAC conciliou três aspectos constitucionais: a titulação da comunidade quilombola, a preservação do meio ambiente e a defesa nacional. A força também se compromete a continuar oferecendo serviços de saúde, educação e transporte, pois a ilha só é acessível por barco.
“De uma certa forma, a presença da Marinha, inibe as grandes traineiras e viabiliza a pesca artesanal por nossos pescadores, que não podem ir muito longe”, acrescenta Nilton.
Para começar a valer, o procurador Daniel Sarmento esclarece que o TAC precisa ser reconhecido pela Justiça. A partir de então, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) tem 270 dias para emitir o título de posse coletiva, que não permite a venda.
O TAC substitui todas as ações entre as partes na Justiça. Em 2002, para garantir a titulação da comunidade, o MPF entrou com ação civil pública. Depois, a Marinha ganhou ações de reintegração de posse. Para o MP, por acabar com as divergências, a medida poderia ser usada para outras comunidades quilombolas, como a do Rio dos Macacos e de Alcântara, que convivem com bases militares da Marinha e da Aeronáutica, na Bahia e no Maranhão.
Fonte: Agência Brasil