Por desenvolvimento com inclusão social, economistas lançam manifesto
Renomados economistas brasileiros, que representam diferentes universidades do País, lançaram manifesto de apoio ao desenvolvimento econômico atrelado à inclusão social e não à austeridade.
Publicado 07/11/2014 13:12
Publicada no site Avaaz de petições da comunidade, o documento contabilizava mais de 400 assinaturas e conta com nomes como Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp e Facamp), Marcio Pochmann (Unicamp) e João Sicsú (UFRJ). O texto diz que a maioria da população brasileira rejeitou “o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais”.
Para os economistas, o caminho correto para o Brasil não é focar na tríade juros altos, com câmbio valorizado e corte excessivo de gastos públicos, política essa defendida pelos derrotados nas urnas e que, segundo eles, traria a recessão e a perda dos avanços sociais.
"Desde 26 de outubro, contudo, a difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da economia brasileira. Sem o contraponto propiciado pela campanha e pelo horário eleitoral gratuito, os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas”, afirma o documento.
"Nosso recado é: não volte atrás, não venha com uma política contrária àquela em que a sociedade vem mostrando que é favorável ao longo do tempo. Façamos as correções necessárias, mas sem abandonar as estratégias de longo prazo que são defendidas pela sociedade brasileira e por um segmento importante de economistas", pontuou Luiz Carlos Delorme Prado, economista da UFRJ.
Segundo ele, o caminho para um desenvolvimento econômico que continue a reduzir desigualdade social é "uma reforma tributária que passa por aumentar impostos diretos, como Imposto de Renda, e reduzir tributos indiretos".
No manifesto, o grupo rechaça a política de juros mais altos, com maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública. Para ele, é preciso devolver os impostos na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos. “O reforço da austeridade fiscal e monetária deprimiria o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária, menor crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda nacional.
Leia o documento na íntegra:
"Economistas pelo desenvolvimento e pela inclusão social
A campanha eleitoral robusteceu a democracia brasileira através do debate franco sobre os rumos da Nação. Dois projetos disputaram o segundo turno da eleição presidencial. Venceu a proposta que uniu partidos e movimentos sociais favoráveis ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão social. A maioria da população brasileira rejeitou o retrocesso às políticas que afetam negativamente a vida dos trabalhadores e seus direitos sociais.
É de se esperar que o pluralismo de opiniões fortaleça nossa democracia depois da pugna eleitoral. Desde 26 de outubro, contudo, a difusão de ideias deu a impressão de que existe um pensamento único no diagnóstico e nas propostas para os graves problemas da sociedade e da economia brasileira.
Sem o contraponto propiciado pela campanha e pelo horário eleitoral gratuito, os meios de comunicação propagaram quase exclusivamente a opinião que a austeridade fiscal e monetária é a única via para resolver nossos problemas.Isto vai na contramão da opinião de economistas de diferentes matizes no Brasil, mas reverbera o jogral dos porta-vozes do mercado financeiro. Estes defendem solucionar a desaceleração com a “credibilidade” da adesão do governo à austeridade fiscal e monetária, exigindo juros mais altos e maior destinação de impostos para o pagamento da dívida pública, ao invés de devolvê-los na forma de transferências sociais, serviços e investimentos públicos.
Subscrevemos que este tipo de austeridade é inócuo para retomar o crescimento e para combater a inflação em uma economia que sofre a ameaça de recessão prolongada e não a expectativa de sobreaquecimento.
O reforço da austeridade fiscal e monetária deprimiria o consumo das famílias e os investimentos privados, levando a um círculo vicioso de desaceleração ou mesmo queda na arrecadação tributária, menor crescimento econômico e maior carga da dívida pública líquida na renda nacional.
Entendemos que é fundamental preservar a estabilidade da moeda. Também somos favoráveis à máxima eficiência e ao mínimo desperdício no trato de recursos tributários: este tipo de austeridade, sim, denota espírito público e será sempre desejável. Rejeitamos, porém, o discurso dos porta-vozes do mercado financeiro que chama de “inflacionário” o gasto social e o investimento público em qualquer fase do ciclo econômico.
Tampouco compreendemos o argumento que associa a inflação ao gasto público representado por desonerações que reduzem custos tributários e subsídios creditícios que reduzem custos financeiros. A inflação, aliás, manteve-se dentro da meta no governo Dilma Rousseff a despeito de notáveis choques de custos como a correção cambial, o encarecimento da energia elétrica e a inflação de commoditiesno mercado internacional.
A austeridade agravou a recessão, o desemprego, a desigualdade e o problema fiscal nos países desenvolvidos mesmo tendo sido acompanhada por juros reais baixíssimos e desvalorização cambial. No Brasil, a apreciação cambial estimulada por juros reais altos aumenta o risco de recessão, ao acentuar a avalanche de importações que contribui para nosso baixo crescimento.
É essencial manter taxas de juros reais em níveis baixos e anunciar publicamente um regime fiscal comprometido com a retomada do crescimento, adiando iniciativas contracionistas, se necessárias, para quando a economia voltar a crescer. A atual proporção da dívida pública líquida na renda nacional não é preocupante em qualquer comparação internacional.
O que nos preocupa é a possibilidade de recessão e a carência de bens públicos e infraestrutura social reclamada pela população brasileira. Atendê-la não é apenas um compromisso político em nome da inclusão social, é também uma fronteira de desenvolvimento, estímulo ao crescimento da economia e em seguida da própria arrecadação tributária.
Esta opinião divergente expressa por parte importante dos economistas brasileiros não pode ser silenciada pela defesa acrítica da austeridade, como se o mantra que a louva representasse um pensamento único, técnico, neutro e competente.
Um dos vocalizadores desse mantra chegou a afirmar que um segundo governo Dilma Rousseff só seria levado a caminhar em direção à austeridade sob pressão substancial do mercado, o que chamou de "pragmatismo sob coação".
Esperamos contribuir para que os meios de comunicação não sejam o veículo da campanha pela austeridade sob coação e estejam, ao contrário, abertos para o pluralismo do debate econômico em nossa democracia.
Maria da Conceição Tavares (UFRJ)
Luiz Gonzaga Belluzzo (Unicamp e Facamp)
Ricardo Bielschowsky (UFRJ)
Marcio Pochmann (Unicamp)
Pedro Paulo Zahluth Bastos (Unicamp)
Rosa Maria Marques (PUC-SP)
Alfredo Saad-Filho (Soas – Universidade de Londres)
João Sicsú (UFRJ)
Maria de Lourdes Mollo (UNB)
Vanessa Petrelli Corrêa (UFU)
Carlos Pinkusfeld Bastos (UFRJ)
Alexandre de Freitas Barbosa (USP)
Lena Lavinas (UFRJ)
Luiz Fernando de Paula (UERJ)
Hildete Pereira Melo (UFF)
Niemeyer Almeida Filho (UFU)
Frederico Gonzaga Jayme Jr. (UFMG)
Jorge Mattoso (UNICAMP)
Carlos Frederico Leão Rocha (UFRJ)
Rubens Sawaya (PUC-SP)
Fernando Mattos (UFF)
Pedro Rossi (UNICAMP)
Jennifer Hermann (UFRJ)
André Biancarelli (Unicamp)
Bruno De Conti (Unicamp)
Julia Braga (UFF)
Ricardo Summa (UFRJ)
William Nozaki (Fesp)"
Fonte: CartaCapital e Valor