Diogo Santos: Mais uma vitória da Revolução Francesa

O terremoto civilizacional causado pela Grande Revolução Francesa pôs abaixo a Época do ordenamento natural das sociedades, governadas por normas eternas. Na outra face da moeda, a Revolução Francesa pariu uma nova Época, a Modernidade, e a Razão é, por excelência, sua coluna mestra. 

Por Diogo Santos*

Desde então, a História dos homens e mulheres é marcada pelas batalhas entre as forças sociais que lutam pela realização das promessas abertas pela Modernidade e as forças que negam o papel civilizacional da Razão. Hoje, é o capital financeiro o principal adversário do mundo aberto pela Revolução Francesa.

A ideologia neoliberal saiu dos porões do conservadorismo após a crise do modo de regulação fordista, da chegada do capital financeiro aos governos dos EUA e da Inglaterra e da derrota do bloco socialista. Hayek e companhia não buscavam construir uma teoria capaz de iluminar as decisões dos governos. A receita indicada era baseada em um único pressuposto sem necessidade de comprovação: quanto mais livre o Mercado, mais livres os indivíduos. O Mercado não é só a melhor maneira de organizar a economia, mas também de organizar a sociedade. Ou seja, não há espaço para a ação humana. Qualquer caminho conscientemente alternativo levará a um resultado pior em termos de bem-estar coletivo. Logo, não há espaço para a Política. Como se vê, não há Ideologia mais adequada para pavimentar o caminho do domínio da finança desregulada sobre as nações.

A economia é, portanto, o campo prioritário de ação da Ideologia neoliberal. E nesta campanha eleitoral, a presidenta Dilma resistiu exemplarmente às tentativas do mercado financeiro de impor a ela sua Agenda. Não só se manteve distante da proposta do Banco Central independente, vendida pela oposição como a panaceia, como denunciou com todas as letras a tentativa de construção de um quarto poder ao qual é vedada a participação do povo. Não só defendeu a atual política de controle da inflação, como enfatizou que a redução da meta de inflação traria desemprego. Não só reforçou a política de crédito executada dos bancos públicos, como expôs a intenção da oposição de diminuir o BNDES.

Como admitem os próprios economistas neoclássicos, o mercado financeiro liberalizado tem como uma de suas funções “disciplinar” os governos e impor a “boa” condução da política econômica. Entenda-se: não importa a escolha popular, a chantagem do capital financeiro é sempre mais poderosa. Nesta segunda pós-eleitoral, previsível como o nascer do sol, o noticiário econômico conservador no Brasil e fora dele já buscava transformar em verdade única os interesses da fração rentista dos capitalistas. O portal da Revista The Economist trás matéria intitulada “Um país dividido”1 e afirma que a Presidenta reeleita terá que incorporar as ideias para a economia de seu adversário, Aécio Neves. Enumera como mudanças indispensáveis uma menor interferência do governo nos negócios e a independência do Banco Central. O jornal Valor Econômico traz a informação de que o governo já estaria estudando a adoção de mandato fixo para o BC2, prontamente desmentido pelo ministro Guido Mantega3. Além disso, há a movimentação especulativa no mercado de capitais brasileiro, mais uma vez gerando volatilidade na taxa de câmbio.

A mesma edição do jornal Valor Econômico, no entanto, traz matéria que afirma que nos EUA “a fatia do patrimônio do país nas mãos do 0,1% das famílias mais ricas subiu de 7%, no fim dos anos 1970, para 22% em 2012”4, conforme o gráfico abaixo:

Retirado do Jornal Valor Econômico de 27 de outubro de 2014

Em 1920, o patrimônio dos 90% mais pobres nos EUA representavam 15% do total nacional, subiu para 36% até meados dos anos 1980 e caiu desde então chegando a 23% em 2012, “o mesmo nível observado em 1940”. No país exemplo da desregulamentação financeira, o neoliberalismo conseguiu a façanha de reverter todo o ganho distributivo ocorrido no pós Segunda Guerra Mundial.

A Ideologia neoliberal ao afirmar que não é possível às sociedades construir instituições capazes de gerar um mundo mais homogêneo social e economicamente, retira de cena o instrumento mais poderoso de nossa Época, a Razão. Não é estranho que a hegemonia do capital financeiro traga resultados como o descrito acima, pois o retrocesso civilizacional é a condição de seu sucesso.

A conclusão que se segue é que a reeleição da Presidenta Dilma Rousseff, e nos marcos econômicos estabelecidos por ela, coloca o Brasil, como nunca antes, na vanguarda da luta da Razão contra o mundo deixado à deriva, como quer o neoliberalismo.

* Diogo Santos é graduando em Economia pela UFMG e Membro da Comissão Política do PCdoB em Minas
___________________

A Riven Country. The Economist, São Paulo, 27 de outubro de 2014. 

2 Safatle, Cláudia. Governo Estuda Mandato fixo no BC. Valor Econômico. Brasília, 27 de outubro de 2014.

3 Simão, Edna; Rodrigues, Lorenna; Marchesini, Lucas; Campos, Eduardo. Mantega: Questão da autonomia do BC é menor frente a tudo que fizemos. Valor Econômico. Brasília, 27 de outubro de 2014. 

4 Lamucci, Sergio. EUA têm maior concentração de riqueza desde os anos 20. Valor Econômico. Washingon, 27 de outubro de 2014.