Para aprender, à mão é melhor

Estudo das universidades de Princeton e da Califórnia mostra que escrever à mão garante maior e melhor memorização e compreensão da informação do que teclar no computador.

Por Cássio Leite Vieira

Escrever a mão
O signatário da seção Mundo de Ciência da revista Ciência Hoje é velho o suficiente para ter visto a passagem da máquina de escrever para o computador nas redações de jornais e revistas e a posterior (e triste) substituição do charmoso bloquinho de repórter pelos teclados dos laptops pela nova geração de jornalistas. Agora, artigo mostra que há pelo menos uma vantagem em ser "das antigas": escrever à mão é melhor que teclar quando o assunto é memorizar informação e garantir um aprendizado de mais alta qualidade.
 
A troca da escrita pelo ato de teclar também vale para estudantes. Em salas de aulas – e também nas coletivas de imprensa – laptops abundam. Certo, eles têm muitas vantagens quando comparados à velha caneta esferográfica ou ao quase hoje primitivo lápis – dá saudade ver aquelas antigas redações de filmes de Hollywood com os repórteres carregando, na orelha, os lápis amarelos com ponta de borracha e sacando-os imediatamente para anotar o ‘furo’ do dia nos… bloquinhos de reportagem.
 
Agora, pesquisa de Pam Mueller, da Universidade de Princeton (EUA), e Daniel Oppenheimer, da Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA), mostra que quem toma nota à mão aprende mais e melhor. Para chegar a esse resultado, eles dividiram estudantes em dois grupos: os que anotavam à mão e os que o faziam com laptops. Ao final, os dois grupos – que assistiram a aulas sobre biologia, religião, bioquímica, matemática, economia etc. – foram julgados nos quesitos memória, entendimento, capacidade de síntese e de generalização.
 
Os voluntários que anotaram à mão – apesar de terem perdido no que diz respeito à quantidade de dados registrada – acabaram se saindo melhor nos itens acima. Os resultados estão em Psychological Science. E o início do título é criativo: ‘A caneta é mais poderosa que o teclado’.
 
Fazer sem pensar 
 
Por quê? Mueller e Oppenheimer acreditam que escrever à mão requer um processo cognitivo distinto do envolvido em teclar. Segundo eles, quem anota manualmente tem que ouvir, digerir e resumir a informação, pois não se tem a velocidade obtida ao se datilografar. E assim se captura a essência do conteúdo, obrigando o cérebro a se esforçar, o que aumentaria a compreensão e a retenção dos dados.
 
Ao se teclar, o cérebro não processaria o significado da informação, pois a velocidade da datilografia não deixaria muito tempo para se elucubrar sobre o conteúdo daquilo que se anota. Ou seja, teclar é algo, digamos, robotizado. Ou, como se diz popularmente, ‘fazer sem pensar’, ‘ligar no automático’.
 
 

Os voluntários que teclaram registraram maior
quantidade de dados, mas não foram capazes de elucubrar
sobre o conteúdo daquilo que digitaram.
(foto
: Krzysztof Szkurlatowski/ Freeimages)
 
E se… fosse pedido aos estudantes que usassem laptops para que pensassem sobre o que anotavam, tomando notas com as próprias palavras, em vez de copiar literalmente o que o professor dizia? De novo, os que escreviam à mão foram melhor nos testes.
 
E se… os dois grupos fossem testados sobre os conhecimentos uma semana depois da aula, podendo estudar a partir das anotações? Mais uma vez, vitória para os que tomaram notas à mão.
 
Para os autores, os que escrevem à mão acabam, com as próprias palavras, recriando o contexto, fazendo observações auxiliares, sínteses, conexões, conclusões pessoais etc.
 
E deveria contar também o aspecto visual das anotações, como flechas, interrogações, exclamações, grifos, rabiscos, desenhos etc.? Mueller, em entrevista à CH, diz que outros estudos na mesma linha sugerem que essa estratégia é benéfica. “Qualquer coisa que force você a relacionar e rearranjar o material certamente irá ajudar”, disse a pesquisadora.
 
Outras distrações 
 
Os computadores usados pelos alunos no experimento não estavam conectados à internet. Isso quer dizer que não havia distrações que tiram, como já mostraram estudos, a atenção dos estudantes nas aulas (correio eletrônico, mensagens, novidades em páginas de comunidades sociais etc.).
 
Cindi May resumiu bem os resultados, em reportagem na Scientific American.  “A pesquisa de Mueller e Oppenheimer serve para nos lembrar que, mesmo quando a tecnologia nos permite fazer mais em menos tempo, ela nem sempre melhora o aprendizado.”
 
Adendo: vai aqui observação sem significância estatística – pois baseada na observação de um só pré-adolescente –, mas talvez pertinente: as crianças de hoje aprendem primeiro a teclar e depois a escrever à mão – esta última atividade tornou-se algo de que eles parecem não gostar e que lhes imputa caligrafia indecifrável. São capazes de passar horas e horas teclando, mas queixam-se de dor nas mãos ao ter que escrever mais do que 10 linhas para uma tarefa escolar.
 
A escrita à mão vai acabar? Cartas à redação, por favor.
 
Fonte: Ciência Hoje