Geraldo Galindo: Marina e a "nova política"

Impressiona a quantidade de eleitores que se dispõem a votar em Marina Silva por ela supostamente representar a ‘nova política’. Pesquisas revelaram percentual elevado de pessoas antes indecisas ou dispostas a anular o voto que viram nela uma opção.

Por Geraldo Galindo*, especial para o Vermelho

Marina Silva - George Gianni

E esse enorme segmento do eleitorado – incluindo parcela considerável da juventude – pensa que a ex-senadora seria uma alternativa à mesmice do cenário político e a negação aos partidos políticos tradicionais. Deveríamos então debater melhor se a acriana seria mesmo a representação da denominada ‘nova política’.

Marina iniciou sua militância política no PT, onde passou três décadas. Foi deputada estadual, senadora e ministra nos dois mandatos de Lula. Do PT saiu para o PV onde foi candidata a presidente. Do PV saiu e foi para a Rede, que não conseguiu se legalizar. Assim, se filiou ao PSB onde entrou dizendo que voltaria para a Rede. No PSB, onde se encontra momentaneamente, ela tem a companhia de pessoas sérias e de esquerda como Lídice da Mata e Luíza Erundina, mas a sigla abriga figuras abertamente direitistas, como os da família Bornhausen (Veja a declaração de Erundina sobre a negação aos partidos por parte de Marina)

O candidato a vice de Marina, Beto Albuquerque, é tido como interlocutor dos interesses da Monsanto, multinacional norte-americana de transgênicos, e foi beneficiário em financiamento de campanhas da indústria armamentista e de bebidas, de quem Marina jura não querer apoio algum.

Devemos lembrar ainda que Marina era ministra do meio ambiente no governo Lula quando eclodiu o chamado "mensalão", alvo constante da indignação desse eleitorado descontente com a política, pois naquele episódio teriam sido escancaradas as relações promíscuas entre os partidos da velha política. Era um ótimo momento para que ela saísse do partido – saiu cinco anos depois – e passasse a defender a ‘nova política’, mas preferiu ficar, talvez pensando que Luiz Inácio a alçaria à condição de candidata à sua sucessão. E quando decidiu sair em 2009, não devolveu o mandato que pertencia ao PT. Isso é um aspecto importante. Os que defendem essa tese vaga da ‘nova política’ devem saber que os mandatos pertencem aos partidos, tanto que veio depois a lei da fidelidade partidária que dá às agremiações o direito de questionar na justiça as vagas perdidas aos que usam os partidos para objetivos exclusivamente pessoais.

Portanto, como uma pessoa que passou 30 anos num partido demonizado pela mídia e pelas forças conservadores pode ser vista como uma alternativa nova? E cabe lembrar que o marido dela ocupava cargo importante no governo do PT do Acre e só pediu exoneração após o acidente com o avião fantasma.

Como uma personalidade que transita por partidos ao sabor das conveniências pode representar o novo? Figuras como FHC, Lula, Eduardo Campos, MIchel Temer, ACM e alguns outros líderes políticos nacionais e regionais, considerados por Marina como representação de forma superada de fazer política, não passaram a carreira política trocando de partidos – e neste aspecto, são mais coerentes do que a ex-senadora.

Religiosidade

A religiosidade Marina é também item a ser bem analisado pelos que nela veem o novo. Neste ponto, ela defende teses abertamente reacionárias, como o ensino do criacionismo nas escolas públicas, ou seja, pretende trazer para as nossas crianças e adolescentes a versão bíblica da existência do mundo, um verdadeiro atentado ao estado laico e à ciência. A outrora beata católica convertida ao neopentecostalismo – sim, ela também muda de Igreja – tem até vídeo ao estilo dos RR Soares e Edir Macedo propalando suposta cura de uma doença não resolvida pela medicina por de um milagreiro da Assembleia de Deus. Isso demonstra a que nível chegou o fundamentalismo da candidata. (Assista)

Aqui cabe lembrar que quando ministra de Lula, Marina contratou como consultor do ministério o preposto da Assembleia de Deus, Roberto Firmo Vieira, que utilizava as instalações do ambiente de trabalho para realizar cultos que incluía a presença da própria ministra e dos funcionários convocados. Pergunto: é uma nova forma de fazer política usar o dinheiro do contribuinte para a contratação de um pastor que vai usar a estrutura do Estado pra fazer pregação religiosa? E se Marina tem certeza de que foi curada de uma doença incurável por um membro de sua igreja, então seria simples pra ela resolver o problema da saúde no Brasil: bastaria substituir o programa Mais Médicos por outro que se chamaria ‘Mais Pastores’.

Ademais, as posições de Marina sobre o casamento entre os homossexuais, pesquisas com células tronco e direito ao aborto são contaminadas pelo fervor religioso de cunho conservador, posições frontalmente contrárias a quem almeja algo novo na política.

Papel do Estado

Mas é no terreno da economia e da visão do papel do estado que o eleitor em busca de uma nova política deveria analisar com mais rigor o que a candidatura Marina Silva significa. Os interlocutores escalados para tratar e falar do assunto são dois próceres do neoliberalismo no Brasil: Otto Lara Rezende e Eduardo Giannetti que defendem o estado mínimo, política já aplicada no Brasil nos oito anos de FHC e que deixou o país em insolvência. A nova política econômica de Marina é a velha política econômica dos desastrosos governos do neoliberalismo no Brasil e na América Latina. E agravada: Marina já anunciou que se eleita colocaria em lei a independência do Banco Central, uma antiga exigência dos banqueiros e especuladores nacionais e internacionais, que nem FHC, submisso que era aos rentistas, ousou implementar. Talvez essa proposta tenha sido uma exigência de Neca Setúbal, herdeira dona do Banco Itaú, uma das mais influentes formuladoras do estafe de Marina e principal financiadora da campanha.

Por fim, temos a questão da chamada governabilidade. Os que querem uma nova política devem ter em conta que é muito difícil – ou quase impossível – governar sem uma razoável base parlamentar e social. Marina sabe disso e quando integrante do governo Lula viu de perto como é necessário ter apoio no Congresso Nacional para não incorrer em riscos institucionais. Pois eis que agora, neste caso, efetivamente, Marina nos apresenta uma proposta de ‘nova política’ ao afirmar que ela governará com os melhores quadros do PT e do PSDB. Ela parte do ilusório pressuposto de que dois partidos com diferenças programáticas tão marcantes conviveriam num eventual governo dando-lhe sustentação. Esse pressuposto delirante não leva em conta o posicionamento dos partidos, parte do princípio de que ambos aceitarão a miraculosa ideia sem questionamentos. Deve ser por essas e por outras que o grupo que integra a Rede é chamado de “sonhático” nos meios políticos.

Concluindo, Marina não é nem representa nada que se possa chamar de ‘nova política’, no sentido de inaugurar novas políticas em benefício da maioria de nosso povo. A história política dela, as posições que vem adotando, as contradições entre seu discurso e prática, como vimos, indicam o contrário. A incorporação no discurso da velha política neoliberal de triste lembrança dos brasileiros, que resultou na entrega do patrimônio público, arrocho salarial, taxas de juros elevadas, baixo crescimento econômico menos investimento no social significa atraso, retrocesso, ataque às conquistas recentes de nosso povo. Se engana quem pensa ser ela uma terceira via na disputa eleitoral. Marina é no momento a segunda via da direita brasileira.

*Geraldo Galindo é secretário estadual de comunicação do PCdoB-BA