Audiovisual independente: mercado que está fervendo

Dois acontecimentos importantes acontecem este mês no Rio de Janeiro, na área do cinema e do audiovisual. Um dos grupos mais conhecidos entre os muitos outros que se formaram na esteira da ampla difusão cultural desenvolvida de duas décadas para cá, no Brasil – o grupo Cinema Nosso, instalado em um casarão do século 19, na Lapa, no centro do Rio de Janeiro, e festejando doze anos de existência – promove pela segunda vez o Seminário Internacional sobre Audiovisual, Formação, Público e Mercado.

cinemundo.org

Nesta sua edição, com uma novidade: o Festival de Filmes e também de Games. O objetivo é formar público e analisar o mercado, estimular o empreendedorismo, contribuir na formação dos que estão iniciando a carreira e, com o 6º Festival CineMundo, que corre paralelo ao evento, tem início neste sábado (16) e vai até 23 de agosto, com o objetivo de criar uma importante vitrine para jovens realizadores de curtas, longas e, no caso deste ano, de criadores de games. Acontece ainda oficina de roteiro para games, competitiva e batalha de jogos além de concurso de novos games, batalha, e de painel de discussão sobre a expansão do audiovisual brasileiro.

O Seminário, com seus múltiplos braços, conta com o patrocínio da Caixa Cultural. Um dos seus parceiros é o Sebrae. Este ano, conta com um grupo de convidados de peso. Dentre eles, Rafael Linares Palomar (autor de Master Class, o Business do Transmídia), professor da Universidade Rey Juan Carlos de Madrid e nomeado para o prêmio Goya duas vezes pelos documentários Harraga e Un cineasta en La Condorniz; Arthur Protasio (palestra: Experiência e projetos em narrativas digitais para séries de TV, games e cinema), roteirista e designer de narrativas e Hildilene Medeiros (palestra: Empreendedorismo criativo e startups em audiovisual.)

Instituição sociocultural que trabalha pela democratização e pelo acesso da juventude ao audiovisual, o Cinema Nosso é uma ONG reconhecida como uma das maiores escolas populares da sua área na América Latina. Mais de 3500 adolescentes e jovens concluíram os seus cursos que priorizam respeito à diversidade, à pluralidade e à cultura popular.

O trabalho do Cinema Nosso começou com um grupo de franceses “interessados em fazer e discutir cinema no Brasil,” diz o diretor-geral do evento, o realizador Luis Nascimento (autor do filme Luto como mãe), que, antes de iniciar sua carreira de diretor de filmes, participou do elenco de Cidade de Deus. Esta conexão Brasil/França exibia filmes e promovia oficinas em São Paulo e em São Gonçalo, no Rio de Janeiro.

“O foco do Seminário,” explica Nascimento, “ é preparar o público jovem para o mercado do audiovisual por meio de debates e oficinas com profissionais com carreira bem sucedida. Nosso objetivo é a formação profissional, o intercâmbio de estudos, projetos, linguagens, e, principalmente a integração de estudantes universitários, produtores, professores e profissionais de mercado.”

Embora haja grande interesse pelo audiovisual independente para além do cinema apresentado nas salas convencionais com preços de ingressos altos e programação colonizada, que prioriza filmes blockbusters, Nascimento diz: “É difícil trabalhar com audiovisual, sobretudo independente, em um estado onde custa menos abrir uma farmácia ou uma igreja que uma sala de cinema. Somos assaltados com tributos porque o estado do Rio de Janeiro está mais interessado em dar isenções para a indústria de automóvel que concentra 53,4% das desonerações concedidas pelo governo e recebe 8,3 bilhões de investimentos nos últimos quatro anos gerando apenas 0,02% de aumento no PIB. Duas montadoras de automóveis do estado do Rio de Janeiro geram juntas, aproximadamente, quatro mil postos de trabalho direto – o mesmo das salas de cinema no estado e as produtoras das mais diversas linguagens do audiovisual.”

Sobre o fenômeno do extermínio das salas de rua, ele lembra que não ocorre apenas no Brasil. “Grandes salas se transformam em farmácias e em igrejas. E, como de hábito, é das periferias que surgem as grandes respostas para os problemas. As periferias do Brasil reinventaram os cineclubes e hoje arrebatam centenas de pessoas semanalmente dando vida a filmes que não chegariam jamais ao circuito comercial, como Mate com Angu, Cidadela, Arco Digital, Campus Avançado, Escola Livre de Nova Iguaçu, Bem TV.”

Mas e os festivais segmentados, as pequenas e médias mostras, as retrospectivas, a programação dos centros culturais, tudo isto parece que está fervendo. Ou não?

“Eles se tornaram os únicos espaços para a exibição dos filmes independentes. O Cidade de Deus 10 anos depois, filme que produzi, com direção de Cavi Borges e Luciano Vidigal, não estreou no cinema em circuito comercial. Mas já passou em mais de 200 cineclubes no Brasil, fora nos festivais e mostras. O problema é que este público não é contado pela Ancine (Agência Nacional de Cinema). Para a carreira oficial do filme é como se ele não existisse. São regras comerciais que distanciam ainda mais os filmes brasileiros dos brasileiros. A Ancine precisa reconhecer estes locais como espaços de exibição e reconhecer a quantidade de público frequentador habitual deles.”

Um exemplo dado por Nascimento: não há registros de qualquer sala de cinema no Município de Feijó, no Acre. “ No entanto,” ele diz, “ lá existe um cineclube com um público fiel. Mas para a Ancine não existe nem esse cineclube, que é o agitador cultural da região nem os espectadores que lá vão.”

Mais informações sobre o evento no site www.cinemundo.org

Fonte: Carta Maior