6ª Cúpula do Brics: Sementes de uma nova arquitetura financeira
Os países do grupo Brics estão sentando as bases de uma nova arquitetura financeira, com o Acordo de Reservas de Contingência e a criação de seu próprio banco de desenvolvimento.
Por Ariel Noyola Rodríguez, no jornal Granma
Publicado 13/07/2014 12:32
Um dia depois da final da Copa Mundial de Futebol no Brasil, terá lugar nesse país a 6ª Cúpula dos Brics (siglas do Brasil, Rússia, Índia, China e a África do Sul). Fortaleza e Brasília serão as cidades anfitriãs do encontro, a ser realizado nos dias 14, 15 e 16 de julho, para assentar finalmente uma arquitetura financeira de novo tipo, sob a consigna: “Crescimento inclusivo: Soluções sustentáveis”.
Diferentemente das iniciativas de regionalização financeira asiática e sul-americana, os países do Brics, ao não conformarem um espaço geográfico comum, além de estarem menos expostos a sofrer turbulências financeiras em simultâneo, incrementam a efetividade de seus instrumentos defensivos.
Um fundo de estabilização monetário denominado Acordo de Reservas de Contingência (CRA, do inglês Contingent Reserve Arrangement) e um banco de desenvolvimento, chamado Banco Brics, exercerão funções de mecanismo multilateral de apoio às balanças de pagamento e fundo de financiamento para os investimentos. De fato, o Brics tentará afastar-se, cada vez mais, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, instituições edificadas, há sete décadas, sob a órbita do Departamento do Tesouro estadunidense. Em meio da crise, ambas as iniciativas abrem espaços de cooperação financeira frente à volatilidade do dólar e alternativas de financiamento para países em situação crítica, sem se submeterem a condicionalismos, mediante programas de ajuste estrutural e reconversão econômica.
Como consequência da crescente desaceleração econômica mundial, tem-se tornado mais complicado para os países do Brics atingir taxas de crescimento superiores a 5%. A persistente queda do preço das matérias-primas para uso industrial, derivada de uma menor demanda do continente asiático e do retorno de capitais de curto prazo para Wall Street, tem impactado negativamente no comércio exterior e nos tipos de câmbio. À exceção do leve aumento do valor do yuan, as moedas dos países do Brics têm perdido pontos porcentuais frente ao dólar (desde 8,80 a rúpia índia até 16 o rand sul-africano) entre maio de 2013 e junho do ano em curso.
Neste sentido, o CRA BRICS – com um capital total de US$ 100 bilhões, anunciado em março de 2013, com contribuições da China, de US$ 41 bilhões; do Brasil, Índia e a Rússia, com US$ 18 bilhões cada um; e a África do Sul, com US$ 5 bilhões — uma vez em andamento reduzirá substantivamente a volatilidade cambiária sobre os fluxos de comércio e investimento entre os membros do bloco.
Os céticos argúem que o CRA terá importância secundária e que só exercerá funções complementares às do FMI. Deixam de lado que, em contraste com a Iniciativa Chiang Mai, por exemplo (integrada por China, Japão, Coreia do Sul e dez economias da Associação das Nações do Sudeste Asiático), o CRA BRICS poderá prescindir do aval do FMI para realizar seus empréstimos, com o qual garante maior autonomia política frente a Washington. A guerra de divisas das economias centrais contra as economias da periferia capitalista exige sua execução à brevidade.
Por outro lado, o Banco Brics tem despertado muitas expectativas. Esse banco, que iniciará suas operações com um capital de US$ 50 bilhões (com contribuições de US$ 10 bilhões e US$ 40 bilhões em garantias de cada um dos membros), terá possibilidades de ampliar-se em dois anos para US$ 100 bilhões e em cinco anos para US$ 200 bilhões, e contará com capacidade de financiamento de até US$ 350 bilhões, para projetos de infraestrutura, educação, saúde, ciência e tecnologia, meio ambiente, etc.
Contudo, para o caso da América do Sul, os efeitos a médio prazo apresentam um caráter dual. Nem tudo é cor de rosa nos mercados de crédito. Por um lado, o Banco Brics bem poderia contribuir a reduzir os custos de financiamento e fortalecer a função contracíclica da Corporação Andina de Fomento (CAF), através do aumento de créditos em momentos de crise e assim descartar os empréstimos do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD). Por outro lado, não obstante, como fornecedor de créditos, o Banco Brics entraria em concorrência com outras entidades financeiras de influência considerável na região, como o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social do Brasil), a CAF e os bancos chineses, com maior influência (o China Development Bank e o Exim Bank of China). E parece impossível que as mencionadas instituições financeiras façam convergir suas ofertas de crédito de modo complementar, sem afetar suas próprias pastas de emprestadores.
Caso os empréstimos do Banco Brics sejam denominados em yuan, a moeda chinesa avançará na sua internacionalização e afiançará gradualmente sua posição como meio de pagamento e moeda de reserva, em detrimento de outras divisas.
Mais além da consolidação de um mundo multipolar, o CRA e o Banco Brics representam as sementes de uma arquitetura financeira, que está emergindo, numa etapa da crise cheia de contradições, caracterizada tanto pela cooperação como pela rivalidade financeira. (Excertos extraídos da Rede Voltaire) •
O Brasil, Rússia, Índia, China e a África do Sul, as cinco economias emergentes mais dinâmicas do planeta, conformam o grupo Brics, uma poderosa associação que representa de conjunto 43% da população mundial, 30% da superfície terrestre, 18% do Produto Interno Bruto global e 35% das reservas de divisas. As produções dos membros da associação contribuíram com mais de 50% do crescimento econômico mundial, na última década. Goldman Sachs assegura que para o ano 2035 o Brics poderá converter-se em um núcleo econômico muito maior que o G-7, integrado pelas principais potências industriais.
Também argumenta que o potencial econômico do Brasil, Rússia, Índia e a China é tal que poderiam converter-se nas quatro economias dominantes para o ano 2050. Caracteriza-os um enorme território (39,7 milhões de quilômetros quadrados), o que lhes fornece dimensões estratégicas continentais e uma gigantesca quantidade de recursos naturais.