Otan comanda grandes exercícios de guerra no Oriente Médio
A Jordânia é o cenário, a partir deste fim de semana e até 10 de junho, dos maiores exercícios militares já realizados no Oriente Médio, patrocinados por grandes potências da Otan e envolvendo 13 mil soldados, de 24 países. A operação coincide com as eleições presidenciais na Ucrânia, na Síria e no Egito.
Por Charles Hussain, de Beirute; Martha Ladesic, de Nova York; e Pilar Camacho, de Bruxelas para o Jornalistas sem Fronteiras
Publicado 26/05/2014 09:12
“A Síria e o Irã são os alvos principais destas manobras gigantescas, que representam um ostensivo ato de intimidação contra as comunidades muçulmanas xiitas do Oriente Médio”, comenta Yussef Ayub, analista político libanês. “Seja o que for que tantas tropas venham fazer, de uma coisa estou certo: não é em solução pacífica de problemas que pensa quem organiza e comanda esta operação”, acrescenta.
Os Estados Unidos contribuem com quase metade dos efetivos envolvidos: seis mil soldados. Entre os outros países participantes estão o Reino Unido, França, Canadá, Itália, Turquia, Polônia e República Tcheca, da Otan, as petroditaduras integradas no Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) – Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar, Bahrein, Omã, Kuwait – o Egito, o Iraque, o Cazaquistão, este da Ásia Central ex-soviética, e o Paquistão.
As tropas norte-americanas presentes integram dois corpos expedicionários de fuzileiros, um grupo expedicionário aéreo e uma “task force” naval, além de uma brigada de artilharia e uma divisão de tanques.
“O cenário das manobras é o Oriente Médio, mas o alcance de uma ação com esta envergadura é muito mais amplo, atinge a Eurásia, o Corno da África, o Norte da África e a África Subsaariana, o próprio Leste da Europa, e envolve as mais estratégicas e conflituosas rotas mundiais do momento”, sublinha em Bruxelas um alto responsável militar representando um país europeu junto da Otan.
“Não tenho qualquer dúvida de que estas movimentações se integram no objetivo de ‘redesenhar o mapa do Oriente Médio’, que está por detrás de todas as guerras e intervenções militares desenvolvidas na região pelas administrações de Bush e Obama”, segundo Allen Stone, assessor de um congressista democrata de Nova York.
A base de operações é o Centro de Treino de Operações Especiais Rei Abdullah, na Jordânia, perto de Amã, e que, sobretudo desde o início da ingerência militar estrangeira na Síria, serve cada vez mais “como uma plataforma permanente de intervenção no Oriente Médio ao serviço dos Estados Unidos, dos seus aliados na Otan e de organizações regionais como o CCG”, explica Yussef Ayub.
“Petróleo, matérias primas, ligações estratégicas, situações de conflito real e potencial” são as motivações gerais destes “descomunais exercícios”, afirma Allen Stone. “De certa maneira retomam as grandes coligações militares formadas para as guerras do Iraque e do Afeganistão, mas, na atual conjuntura, não podem deixar de ser entendidos como uma ameaça à Rússia e às suas posições em relação à Síria e ao Irã; a presença de tropas de países vizinhos da Rússia e que já integraram o império de Moscou é um exemplo óbvio dessa intenção”, acrescentou o assessor do Congresso norte-americano.
“Repare para o calendário de acontecimentos dos próximos dias e para os exércitos participantes nas manobras e perceberá a universalidade deste mega exercício”, sugeriu Yussef Ayub. “Entre 25 de maio, com os exercícios já decorrendo, e 10 de Junho, dia do encerramento, estão marcadas eleições presidenciais na Ucrânia, na Síria e no Egito, todas elas a realizar em contextos de guerra civil e golpes de Estado em que participam exércitos também envolvidos nestas manobras”, explicou.
Ayub enumerou: “A Otan está presente nos acontecimentos na Ucrânia e na guerra na Síria; a Turquia e a Jordânia são as principais bases de ataque estrangeiro à Síria, sustentado pela Otan e pelos países do Conselho de Cooperação do Golfo; o exército egípcio, um dos principais aliados dos Estados Unidos na região, deu o golpe de Estado que agora vai institucionalizar através de eleições”.
“A realização de exercícios com esta ou qualquer outra envergadura no Médio Oriente tem forçosamente a presença implícita de Israel”, considera o alto responsável militar europeu em Bruxelas. “A relação privilegiada de Israel com os Estados Unidos e a Otan não permite qualquer dúvida de que os objetivos traçados para estas manobras terão prioritariamente em conta os interesses israelitas tanto em relação à questão palestina como à Síria e ao próprio Irão, mesmo que haja desacordos entre israelitas e americanos sobre este assunto, mas que não contam nada em termos militares operacionais”, sublinha.
Nas manobras estão integrados sete mil civis de organizações não governamentais e empresas privadas de segurança para tarefas relacionadas com “apoio aos militares em tarefas ofensivas e defensivas, assistência humanitária e missões de segurança”. Entre as organizações presentes estão várias que têm servido de apoio à CIA nos cenários de guerra civil na Síria e de levantamentos populares associados à chamada “Primavera Árabe".
“Os exercícios chamam-se Eager Lion (Leão Ansioso)”, lembrou o analista libanês Yussef Ayub. “Não conheço o que está na cabeça de quem assim os baptizou, mas tenho a certeza de que se há alguma ‘ânsia’ em jogo ela só pode ser por mais guerra”.
Fonte: Jornalistas sem Fronteiras