O legado intangível dos megaeventos esportivos
Todo dia é comum ouvir ou ler que investir bilhões em Olimpíadas e Copa do Mundo é jogar dinheiro fora, pois esses recursos deveriam ir para educação e saúde. Que colocar bilhões em eventos enquanto áreas importantes patinam chega ser absurdo.
Por Hugo Valadares*, no portal da UJS
Publicado 18/02/2014 14:44
Entretanto, para além do legado estrutural, tão discutido nos últimos tempos, há diversas questões e legados intangíveis e não mensuráveis que uma análise superficial e rasa, como tantas pessoas têm insistido em fazer, impede de observar.
Para aprofundarmos o debate sobre a vinda dos grandes eventos, analisemos algumas situações. Antes do atual período, o Brasil jamais seria cogitado para sediar acontecimentos desse porte, e isso tem impacto direto na forma como o país é visto no cenário internacional. Na ONU, antes o Brasil sequer era ouvido, não podia dar nenhuma cartada na governança global. Hoje luta por um assento permanente no conselho de segurança, que no fundo é o órgão que decide os rumos dos conflitos no mundo.
Esta mudança na imagem se refletiu em eleições de instituições internacionais muito importantes: em 2011, o brasileiro José Graziano foi eleito diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), sendo o primeiro latino-americano a alcançar tal cargo. Recentemente, o diplomata Roberto Azevedo foi escolhido para ser diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). A implicância direta disso é que em disputas relevantes, o Brasil pode atuar como importante mediador. Além de que, em discussões nas quais estejamos presentes, ter voz ativa e ser respeitado como liderança regional e mundial faz toda diferença.
Pode-se exemplificar este fato com o caso, tempos atrás, de um imenso embate entre a Bombardier e a Embraer sobre uma questão relativa aos incentivos financeiros do governo Canadense (país sede da empresa) que fez a brasileira perder uma concorrência. No final, a Embraer ganhou a disputa na OMC. Outro debate em curso é relativo aos subsídios aos produtos agrícolas nos Estados Unidos e na França. Isso faz com que os produtos desses países sejam mais baratos e tomem mercado no mundo. Se o Brasil ganhar esse embate, o impacto direto será a geração de mais empregos, mais gente no campo, mais safra e mais dinheiro na nossa economia.
Para além destes casos, uma boa imagem internacional pode atrair mais investidores que venham abrir empresas no Brasil, gerar empregos e divisas e, novamente, empregar mais gente e fazer o país crescer. Amigos brasileiros residentes do Velho Continente foram testemunhas de que em cursos de formação de empresários, a orientação é para que se invista aqui, pois o retorno é garantido e as instituições são confiáveis. Não é por acaso que recentemente, na Europa, o Brasil saiu em todos os jornais importantes por ter se tornado a 6ª. maior economia do mundo.
Se trazer a Copa e a Olimpíada fosse apenas uma questão de aplicar recursos, nenhum país iria querer sediar tais eventos. Seguindo essa linha, então deveríamos acabar com investimentos em esporte, porque não precisamos de medalhas olímpicas se tem gente passando necessidade. Por essa lógica, também não deveríamos investir em cultura, pois isso não deveria ser mais importante que um leito no hospital. Também não poderíamos construir praças, parques, ciclovias, porque a prioridade, segundo esta rasa discussão, tem que ser educação e saúde!
O Brasil tem que dar conta de todos os desafios e isso acontece de maneira simultânea. Antes vivíamos num país que os estrangeiros não sabiam muito bem o que havia além de futebol, mulher bonita e carnaval. Simplesmente não era levado a sério. Agora somos respeitados, a economia anda, temos a taxa de desemprego dos sonhos de países desenvolvidos e temos moral por trazer os maiores eventos do mundo. Não devemos acreditar na imprensa que só quer ver o circo pegar fogo porque o governo federal não é dirigido por seus aliados. Sempre fomos uma grande nação e de grandes pessoas. Mas agora, o mundo sabe disso.
*Doutor em Engenharia Elétrica pela UNICAMP, ex-presidente da ANPG e membro da Direção Nacional da UJS