A alquimia do amor

Cearense, ele aprendeu no mar a fazer um badejo ou uma corvina na brasa que até Deus perdoava o pecado da gula. Pratos comuns, como o virado à paulista, ele preparava com apuro e, durante a semana, eram disputados entre meio-dia e duas horas da tarde por esfomeados peões da construção civil e até mesmo engravatados executivos.

Por Roniwalter Jatobá
 

A alquimia do amor

Conhecido como Batista, era cozinheiro do boteco Caminho da Lua, em Santo Amaro, na zona sul paulistana. Se quisesse poderia propor a alguém uma sociedade na área gastronômica, pois, com certeza e, em pouco tempo, iria figurar entre os donos de restaurantes de origem nordestina que começaram como lavadores de pratos e se deram bem em São Paulo.

 
Ali pelas oito da noite, já com panelas, pratos, caçarolas e cozinha brilhando na rigorosa limpeza, o Batista chegou até a minha mesa. De outras vezes, falou de sua vida: viera de uma cidadezinha do litoral do Ceará, onde viviam ainda seus pais. Eram pobres: o pai, pescador; a mãe cuidava da casa e de uma turma de filhos. Mas, naquela hora, o bar fecha não fecha, o que ele queria mesmo era falar de algo mais íntimo: o fim de seu casamento paulistano após dois anos de lua de mel.
 
Durante muito tempo, não vi mais o Batista. Mas outro dia ele me veio à lembrança ao ler uma pesquisa realizada pela equipe da professora Cindy Hazan, da Universidade de Cornell, em Nova York, nos Estados Unidos. Depois de entrevistar mais de cinco mil pessoas, Cindy e os pesquisadores chegaram à conclusão que uma paixão não dura mais do que dois anos e meio.
 
– Há uma série de evidências de que o que chamamos de grande amor é criado por um coquetel de substâncias químicas cerebrais – informou a professora. – Em determinado momento, o efeito acaba.
 
Voltei outro dia ao Caminho da Lua. O Batista não trabalha mais ali. Uma pena: fiquei sem saber maiores detalhes da sua separação, para entender melhor o problema, já que ninguém ainda sabe quem é mais suscetível – o homem ou a mulher? – à alquimia do amor.