EUA ameaçam Afeganistão economicamente para manter suas tropas
O jornal estadunidense The New York Times classificou de “teimoso” o impasse sobre um acordo de longo termo para a permanência de tropas dos Estados Unidos no Afeganistão, que estaria causando “preocupações” principalmente ao setor comercial. A relevância dada à questão passa ao lado da situação de violência disseminada e sistemática que a população afegã atravessa, apesar de a justificativa para a permanência dos soldados estadunidenses ser exatamente a questão securitária.
Publicado 11/12/2013 10:10
Segundo o artigo do New York Times, “todo indicador da confiança econômica tornou-se negativo nos dias em que o presidente [afegão] Hamid Karzai insiste em adiar a assinatura do acordo, que pavimentaria o caminho para uma presença contínua de tropas americanas e bilhões de dólares em ajuda internacional anual depois de 2014.”
O artigo cita o aumento dos preços dos alimentos e do combustível, a diminuição dos créditos bancários, das viagens domésticas e do investimento privado. “Até o preço do carvão, uma commodity essencial durante o inverno brutal afegão, aumentou consideravelmente por causa do movimento agudo da taxa de câmbio e da nuvem de incerteza sobre o futuro do país.”
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Estaria montado, assim, o cenário de pressão grave sobre o governo de Karzai para a assinatura de um acordo que manteria a presença e a atuação militar dos EUA sobre o Afeganistão, que desde 2001, tem índices gradualmente elevados de violência e desestabilização.
Um dos motivos da “teimosia” do governo afegão para não assinar de uma vez o acordo é justamente o impacto devastador desta presença sobre as vidas dos civis, com casos disseminados de violações, ações de violência direta e o alto número de “baixas” entre a população comum, sobretudo vítimas de ataques com aviões não tripulados (drones) estadunidenses, que causa a revolta generalizada contra as tropas do país.
Além disso, a difícil aproximação diplomática entre o governo afegão e o grupo Talibã, removido do poder na invasão estadunidense, é outro fator que mantém a guerra inalterada e a violência profunda. A falta de negociação com esses atores também é determinante, e a atuação dos EUA no país não favorece as possibilidades de um diálogo político.
De acordo com o New York Times, a economia afegã depende “quase completamente de ajuda internacional”, um grande fator de pressão estrangeira sobre o governo para a aceitação de acordos militares como o proposto pelos EUA. A devastação da economia afegã é apenas mais um exemplo do potencial destrutivo da intervenção militar e da guerra que já dura 12 anos. Ainda assim, os “especialistas” citados pelo jornal “predizem” que o Afeganistão será incapaz de financiar suas atividades administrativas.
Em 2012, o país foi incluído na lista dos 42 menos desenvolvidos do mundo, elaborada pela Organização das Nações Unidas. O desemprego é alto e tende a piorar; segundo o New York Times, 400.000 afegãos entrarão para o mercado de trabalho a cada ano nos próximos cinco anos, embora o número de postos deva diminuir.
Apesar de o jornal enfatizar a crítica “de muitos” contra a decisão de Karzai de “colocar em risco a tão necessária ajuda financeira”, também são massivos os protestos contra a presença e a atuação militar norte-americana em diversas províncias do país, reconhecida como a maior causa de desestabilização e violência.
O candidato presidencial nas eleições de 2009 e de 2014, Abdullah Abdullah, é citado pelo jornal para expressar que Karzai estaria “perdendo o tempo da nação, e é a nação quem paga o preço (…). Incerteza é a prior coisa que você pode impor a um país, especialmente num tempo em que precisamos focar no caminho adiante.”
Mais uma vez, o foco é na preocupação do mercado internacional e do doméstico sobre as condições para o consumo e o investimento, enquanto o empobrecimento na zona rural, gravemente afetada pela violência generalizada e persistente, não ganha tanta atenção.
Karzai responde que são os EUA os que prejudicam a economia, assim. Em entrevista ao jornal francês Le monde, na terça (10), ele acusa o país de “guerra psicológica contra a nossa economia, encorajando comércios a deixarem o Afeganistão, encorajando o capital a deixar o Afeganistão, aterrorizando a população afegã sobre as consequências de 2014.”
Com informações do New York Times,
Moara Crivelente, da redação do Vermelho