Justiça de SP decide por reintegração de posse da reitoria da USP

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu pela imediata reintegração de posse da reitoria da Universidade de São Paulo (USP), na Cidade Universitária, na Zona Oeste da capital, que está ocupada desde o dia 1º de outubro por estudantes que reinvidicam eleição direta para reitor da universidade. O desembargador Xavier de Aquino, da 2ª Câmara de Direito Público de São Paulo, foi o relator da decisão de segunda (4), que vai contra a decisão anterior. 

No dia 9 de outubro, uma decisão inédita do desembargador José Luiz Germano, da 2ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, concedeu 60 dias para que os estudantes desocupassem o prédio da Reitoria esperando que as partes abrissem um diálogo.

"Certamente, é muito mais prejudicial à imagem da USP, sendo a universidade mais importante da América Latina, a desocupação de estudantes de um de seus prédios com o uso da tropa de choque, sem contar possíveis danos à integridade física dos estudantes, ratificando, mais uma vez, a tradição marcadamente autoritária da sociedade brasileira e de suas instituições, que, não reconhecendo conflitos sociais e de interesses, ao invés de resolvê-los pelo debate democrático, lançam mão da repressão ou da desmoralização do interlocutor”, escreve o magistrado. “Aqui, não se olvide que sequer escapa desse 'pensamento único', infelizmente, a maioria da mídia e da própria sociedade, amalgamada, por longos anos, nessa tradição de pensamento autoritário.”

Com a nova decisão favorável a reintegração, os administradores da universidade poderão acionar a polícia para que seja cumprida a ordem de reintegração de posse a qualquer momento.

Em nota, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) Livre da USP manifestou "completo repúdio à decisão judicial" que pede a reintegração de posse. A nota foi divulgada no site do grupo (veja abaixo).

O desembargador afirmou que se trata de um "caso extremamente grave, que vem atrapalhando o bom andamento da universidade" e, além disso, "existem alunos ordeiros" que "pretendem ter continuidade nos seus dias letivos".

"Ocorreram vários incidentes durante este domínio, tais como depredações do próprio do Estado, quebra de vidraças, bloqueio das vias de acesso ao campus, havendo inclusive notícia da participação dos baderneiros autodenominados 'black bloc' que lá permanecem", justificou, ainda, em sua decisão.

"Neste passo, com todas as vênias da Turma Julgadora, concedo a liminar pleiteada, a fim de que os alunos e pseudo-alunos abandonem de imediato a reitoria da USP e, se for o caso, requisite-se força policial, através do seu titular com quem antes de proferir o despacho entrei em contato, para a retomada do prédio", completou.

Ocupação

Manifestantes tentaram ocupar na tarde de 1º de outubro a reunião do Conselho Universitário, dentro da Reitoria, onde eram discutidas mudanças na forma de eleição do reitor e do vice-reitor. Os estudantes usaram marretas, pé de cabra e até uma placa de trânsito para forçar a porta da sala onde acontecia o encontro. O conselho rejeitou as eleições diretas, mas aprovou mudanças na escolha dos nomes que irão compor a chamada lista tríplice.

Depois da decisão, os alunos decidiram, em assembleia, ocupar o prédio. O Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) manifestou apoio à ocupação e à greve decretada pelos estudantes. A entidade considerada um “total desrespeito a decisão do Conselho Universitário aos anseios e à luta dos estudantes, funcionários e professores da USP por democratização na Universidade de São Paulo”.

Os estudantes reivindicam a aprovação da eleição direta para os cargos de reitor e de vice-reitor da universidade. A decisão do juiz de 1ª instância ocorreu após reunião de conciliação entre representantes dos estudantes, funcionários, professores e a direção da USP, em que não conseguiram chegar a um acordo.

O juiz julgou que a Reitoria não estava aberta a um diálogo com os estudantes e preferiu optar pelo uso da força. Além disso, informou que as reivindicações de estudantes, professores e funcionários, prevendo a democratização da gestão da USP, apontam um possível benefício da ocupação, que seria mais importante que a "interdição parcial de funcionamento administrativo da USP" e os "danos de pequena monta ao seu patrimônio".

Assembleia geral


Estudantes colocam um cartaz com a frase 'A USP é nossa' em frente a entrada da reitoria, na Cidade Universitária, em São Paulo / Foto: Werther Santana/Estadão Conteúdo

Na quarta-feira (6), o movimento estudantil da USP está marcada uma assembleia geral de estudantes. De acordo com o DCE Livre da USP, que convoca a atividade no Facebook,  será definida uma nova agenda de mobilização.

Na quinta-feira (31), a reunião de negociação resultou em conquistas concretas para os estudantes. Mas quais são as conquistas? O termo de acordo proposto pela reitoria pode ser lido aqui e abaixo:

1) 25 anos depois, a USP abrirá um processo de estatuinte livre, autônoma e democrática, pautado pela participação de estudantes, funcionários e professores em um congresso que acontecerá em maio de 2014. Dentro da estatuinte, a universidade será obrigada a pautar o tema das eleições diretas para reitor, diretores de unidade e chefes de departamento.

2) Os blocos K e L serão devolvidos para moradia estudantil. Serão quase 500 novas vagas no CRUSP.

3) Os espaços de vivência do DCE e da APG também serão entregues de volta às entidades.

4) As bolsas estudantis serão, daqui em diante, reajustadas anualmente de acordo com a porcentagem de reajuste salarial de professores e funcionários.

5) Até 2014, todos os bandejões da USP terão café da manhã, almoço e jantar nos fins de semana, e novos postos de recarga de bilhete serão construídos na Física e na Química.

6) A universidade fará frente à SPTRANS, junto aos estudantes, para que se aumente a frota de circulares na USP e voltem as linhas extintas (177P/10, 107T/10, 7725).

7) Interior: serão formadas comissões paritárias nos campi para que as demandas de permanência sejam resolvidas ainda em 2014, com a reformulação dos planos diretores.

8) A universidade abrirá processo democrático de discussão do modelo de segurança da USP, a fim de contemplar todas as singularidades do tema, inclusive a violência contra a mulher.

9) O Núcleo de Consciência Negra não será retirado de seu local atual.

10) Está indicado a reposição de aulas ao término da greve, sem cancelamento de semestre letivo.

11) Mesmo com o fim da greve, será aberta uma mesa de negociação permanente entre a universidade e os estudantes, para que nossas demandas sigam sendo atendidas.

No entanto, o DCE Livre da USP alertava, antes mesmo da decisão de reintegração, que as conquistas não estavam garantidas. "A reitoria é esperta e, num processo de negociação, só fecha o acordo mediante a desocupação da reitoria e o fim da greve. Os estudantes, também, na última assembleia, ainda não assinaram o termo de acordo, pois querem avançar nos eixos de nosso movimento. Na opinião do DCE, o principal ponto a avançar é a respeito da punição. Exigimos que haja garantia de que nenhum ativista do movimento será punido por conta da greve e da ocupação atual, o que ainda não foi firmado claramente pela reitoria", diz um trecho de nota na página do Diretório Central.

Leia o texto do DCE da USP na íntegra:

O DCE da USP manifesta seu completo repúdio à decisão judicial, deferida hoje, pela reintegração de posse do prédio da reitoria.

Após duas decisões contrárias à reintegração, nos surpreende, agora, a sinalização de uma postura repressiva a um movimento que, notoriamente, é político e legítimo.

No momento, estão em curso negociações que têm avançado com base no diálogo e na democracia. O Comando de Greve Estudantil indicou hoje a aprovação do atual termo de acordo entre estudantes e reitoria. A decisão final sobre o tema será realizada já na quarta-feira às 18h no prédio de História.

Amanhã pela manhã, os advogados do DCE irão comunicar a Justiça tal situação, solicitando nova audiência de conciliação entre reitoria e estudantes, dado o atual desenvolvimento das negociações.

Deixamos claro: não iremos admitir nenhuma repressão ou reintegração de posse. Não iremos admitir nenhum golpe da reitoria em meio ao processo de negociação. Chamamos a que toda universidade e a sociedade se levantem em nome da democracia, do diálogo e do direito dos estudantes em se manifestar.

Sobretudo, convocamos os estudantes: estejam na assembleia geral de quarta, o que espaço em que poderemos consolidar nossas conquistas e ter um desfecho vitorioso ao nosso movimento, ampliando ainda mais a luta no próximo período.

Democracia na USP Já!

com agências