Fernando Mousinho: As mães de Chernobil 

Em meados de 1991, desembarcaram no aeroporto Jose Marti, em Havana, milhares de jovens, crianças e adultos da Bielorussia, Ucrânia e Rússia para receberem tratamento de saúde, afetados que foram pela radiação do acidente da usina nuclear de Chernobil. Eram tempos extremamente difíceis para a Ilha. Certamente os piores vividos até então pela Revolução. Tempos de “período especial”. 

Por Fernando Mousinho*

A União Soviética acabara de desintegrar-se, o que provocou o desabastecimento de petróleo, alimentos e outros produtos vitais à sobrevivência do povo cubano. Estima-se em 85% a quebra da economia do país. Cuba, antes acusada de ser fantoche da União Soviética, passou a ser acusada de não seguir aquele país nos rumos do neoliberalismo.

Caiu o Muro de Berlim e caiu Moscou, enquanto Havana manteve-se livre. Apesar da falta de material didático e de insumos, conservou-se a qualidade da educação e da saúde. A mortalidade infantil – já baixa – surpreendentemente decaiu. Mais uma prova que a Revolução é original e soberana. E que pé atrás, nem prá tomar impulso.

Não foi noutra, mas em circunstâncias de guerra que o governo cubano acolheu os filhos desses tão longínquos povos, com o compromisso de devolver-lhes a saúde plena. E, em milhares de casos, impedir a perda precoce da vida.

Foram 9.107 crianças e jovens com idades de 2 a 18 anos e 1.270 adultos que receberam tratamento de leucemia, intervenções cirúrgicas cardiovasculares, transplantes de medula óssea e enxerto de rins. Além de assistência odontológica e psicológica.

Todos, sem exceção, foram tratados segundo o princípio de que em Cuba a saúde é gratuita para todos. E mais, que em Cuba não se divide sobra, mas sim, o que se tem.

Uma solidariedade internacionalista, mas também uma demonstração de que, no socialismo, a vida humana não é mercadoria. Uma solidariedade por todos sentida, mas que, só o amor de mãe é capaz de sintetizá-la tão bem.

Portanto, a ‘Carta das Mães de Chernobil’ à Organização Mundial de Saúde, à Organização Panamericana de Saúde e à opinião pública internacional, é um testemunho da pujança da revolução cubana em todos os sentidos. Diz o texto na íntegra:

“Cumprimos o sagrado dever de agradecer e reconhecer às crianças cubanas, seus pioneiros, ao Ministério e trabalhadores da saúde, ao pensador e arquiteto da saúde mundial, o presidente Fidel Castro, e ao seu povo, por serem capazes de transformar os sonhos em realidade, o sofrimento e o egoísmo humano em fraternal serviço para enfrentar, junto a outros povos do mundo, a crua realidade das catástrofes a que a humanidade periodicamente está submetida”.

Enquanto países ricos e que se dizem civilizados exportam soldados e armas de destruição em massa, Cuba cultiva a vida. Apesar de mais meio século de bloqueio dos Estados Unidos – único na história da humanidade – é o melhor país da América Latina para maternidade e o 33º do mundo neste quesito, segundo a organização Save the Children.

O sistema de saúde de Cuba é referência mundial. Atualmente é o país que concentra o maior número de médicos por habitante. A taxa de mortalidade infantil é a mais baixa das Américas e do Terceiro Mundo, 4,9 por mil, inferior a do Canadá e dos Estados Unidos. Da mesma forma, a expectativa de vida dos cubanos, de 78,8 anos, é comparável a das nações mais desenvolvidas.

A campanha internacional humanitária denominada Operação Milagre, conveniada com a Venezuela, que consiste em operar gratuitamente pessoas pobres vítimas de cataratas e outras doenças oftalmológicas, em 2011 recuperou a visão de mais de dois milhões de pessoas de 35 países. O crack, além de outras drogas, que tanto aflige milhões de lares do mundo inteiro, em Cuba é inexistente.

As principais instituições internacionais reconhecem esse desenvolvimento social e humano. O Fundo de População das Nações Unidas constata que Cuba “adotou há mais de meio século programas sociais muito avançados, que possibilitaram ao país alcançar indicadores sociais e demográficos comparáveis aos de países desenvolvidos”.

São constatações com as quais fazemos coro. Até porque centenas de brasileiros afetados pelo acidente radioativo ocorrido em Goiânia em 1987, conhecido como Césio-137, e que rendeu o filme “O pesadelo de Goiânia”, também receberam tratamento de saúde gratuito em Cuba.
Portanto, o exemplo das ‘Mães de Chernobil’ é digno de ser seguido por todos aqueles que acreditam na solidariedade fraterna entre os povos.

Este é um depoimento de quem acompanhou os dois casos de perto. Incluindo o desembarque até visitas frequentes ao bucólico balneário de Tarará, local de convalescença dos afetados.

*Assessor técnico da Liderança do PSB na Câmara dos Deputados