Pesquisadora aborda campanha de desinformação sobre a Síria
Claude Fahd Hajjar, vice-presidente da Federação de Entidades Americano-Árabes (Fearab-América), denuncia reiteradamente a desinformação midiática empregada contra o governo do presidente da Síria, Bashar Al-Assad, com o intuito de legitimar a ingerência e a agressão militar iminente do Ocidente contra o país. Nesta semana, Claude deu uma palestra sobre o tema no Centro Cultural Árabe-Sírio, na capital paulista.
Publicado 29/08/2013 15:39
No contexto em que as declarações agressoras contra a Síria se intensificam, com a promoção ativa dos Estados Unidos, do Reino Unido e da França, entre os cinco membros de Conselho de Segurança da ONU, pela intervenção militar no país, a análise do papel da mídia ocidental neste esforço de legitimação da violação da soberania síria é imprescindível.
A empreitada não é recente, porém, e além de encaixar-se nos moldes da xenofobia ocidental contra o mundo árabe e o mundo islâmico, especificamente, serve também aos propósitos geoestratégicos da hegemonia agressora no Oriente Médio.
“A conveniente alienação da imprensa no Ocidente resultou em um desconhecimento do povo sírio, de suas escolas, institutos de pesquisa, música, de seu nível de vida, o que a impediu a população no Ocidente de ver a Síria laica, agradável e acolhedora”, diz Claude, em sua apresentação.
A especialista, autora do livro "Imigração Árabe: 100 Anos de Reflexão", ressalta os diferentes “mantras”, como os classifica, usados reiteradamente contra o governo sírio, sobretudo a partir da eclosão do conflito, em 2011. São exemplos dos conceitos falhos repetidos: “Ditador Bashar Al Assad reprime com violência as manifestações pacíficas de seus opositores”, e “O governo do Ditador Bashar Al Assad não permite a entrada da imprensa na área do conflito da Síria”, embora um relatório de observadores da Liga Árabe tenha contabilizado, lembra Claude, 170 correspondentes credenciados no país, em 2012.
A menção às fontes também é crucial na análise do discurso transmitido pela mídia. De acordo com Claude, predominam nas matérias sobre a violência na Síria fontes de limitados grupos da oposição ao governo, especialmente do Observatório Sírio de Direitos Humanos (sediada no Reino Unido), do Exército Sírio Livre (ESL) e do Conselho Nacional Sírio.
Sobre o primeiro, por exemplo, Claude diz que “foi exposto como uma frente de propaganda absurda operado por Rami Abdul Rahmam, a partir de sua casa na zona rural da Inglaterra”, com apoio e financiamento da União Europeia. Ainda assim, é citado pela mídia como fonte imparcial e fidedigna.
Agências e emissoras como a Reuters, a France Press, a britânica BBC e a árabe Al-Jazeera, com sede no Catar, são elencadas por Claude como principais promotoras da propaganda e do discurso anti-Assad.
Além disso, enviados brasileiros foram instruídos pelo cônsul sírio no Brasil (ao dar-lhes credenciais para a cobertura no país) sobre os procedimentos de segurança a serem seguidos na Síria, através de contatos com a própria Embaixada brasileira, mas a opção de recorrer, ao contrário, a contatos na oposição, expôs os enviados a situações de risco, afirma a pesquisadora.
Sobre a emissora árabe Al-Jazeera, Claude afirma que a rede investia na criação de fatos e na exacerbação dos acontecimentos, ao transmitir, por exemplo, manifestações e distúrbios em localidades e regiões na verdade pacíficas. “Os acontecimentos na Síria foram de inicio relatados no formato de uma campanha de terror e de desinformação”, diz.
Promoção da agressão e desinformação
Alvo de importantes críticas por parte dos observadores da mídia não-ocidentais, a rede Al-Jazeera teve sua credibilidade profundamente afetada pela cobertura sobre a Síria. A emissora chegou a discutir a necessidade de reformulações e mudanças de perspectivas, ainda que de forma insuficiente, já que baseava a sua defesa às críticas ao argumento exposto como falho por Claude de que o governo sírio dificultava o acesso dos seus jornalistas ao país.
Além disso, a capacidade interna de transmissão da informação, sobretudo por emissoras consideradas favoráveis ao governo, também foram atacadas pelos grupos paramilitares, que são financiados desde o exterior, por vizinhos como o Catar, a Arábia Saudita e a Turquia, além das potências europeias e dos EUA.
“Com o dinheiro de Qatar e da Arábia Saudita, os mercenários que se autodenominam Exército Sírio Livre atacaram por mais de cinco vezes as diferentes estações de transmissão da “Al Ikbarie Surie” uma espécie de Syria News, jornalismo 24 horas no ar”, explica Claude.
A pesquisadora denuncia também que membros do ESL “sequestraram e mataram diversos jornalistas, inclusive âncoras da TV Syria, como o jornalista Mohamad Said, e veiculam notícias desencontradas para gerar pânico e insegurança na população”.
Sobre as acusações de uso de armas químicas, o papel da mídia dominante vai ao mesmo sentido, e culmina na promoção ativa da proposta de intervenção militar contra o governo sírio. Claude ressalta a introdução a esta tendência, ou “novela”, como a denomina: “Obama avisou o presidente Bashar Al-Assad das ‘enormes consequências’ de ter cruzado a ‘linha vermelha’, ao alegadamente utilizar armas químicas”.
“A mídia ocidental, em coro, acusa implacavelmente o governo sírio de assassínio em massa, conclamando a ‘comunidade internacional’ a resgatar o povo sírio. A Síria transpõe a ‘linha vermelha’ sobre armas químicas”, diz Claude.
O recurso à intervenção dita “humanitária” contra o governo sírio constrói-se, fundamentalmente, através da mídia, tanto com a sua “desinformação”, como afirma a pesquisadora, quanto no uso de discursos supostamente heroicos, legitimadores da violação da soberania síria e do Direito Internacional, com a promoção evidente da opção pela agressão.