Paraguai: Conflito no campo pode ser usado para avanço neoliberal

No sábado (17), o Paraguai sofreu um atentado realizado, supostamente, pelo EPP – Exército do Povo Paraguaio. Trata-se do sequestro e assassinato de quatro seguranças da fazenda Lagunita, propriedade do brasileiro Renato Recender, localizada na região de São Pedro, município de Tacuatí.

Por Mariana Serafini, especial para o Portal Vermelho

Camponesa protesta no Paraguai

O atentado aconteceu por volta das 15h30, quando um grupo armado sequestrou os seguranças da fazenda e os levou para cerca de 3 km de distância. Um dos sequestrados foi liberado e conseguiu pedir ajuda, porém a polícia só chegou após os outros quatro já terem sido executados.

A questão agora ganha contornos complexos. O atentado aconteceu em uma das regiões no Paraguai onde mais existem grupos camponeses que resistem ao sistema de grandes produtores de soja e lutam pela reforma agrária. O ministro do interior do Paraguai, Francisco de Vargas, já sinalizou que o governo vai intensificar a luta contra os “grupos terroristas”, porém, o ativista dos Direitos Humanos, Abel Irala, afirmou que pela primeira vez um ministro do interior tratou o EPP desta forma.

Em entrevista a veículos de comunicação do Paraguai, Irala sinalizou sua preocupação quanto às medidas neoliberais que o governo de Horácio Cartes pode tomar a partir do atentado. Ele acredita que este crime pode dar margem para o aumento da perseguição e criminalização dos movimentos sociais, medida essa já intensificada durante o governo de Federico Franco (Partido Liberal).

Irala deixa claro que a situação precisa ser analisada sob várias perspectivas, mas não se pode deixar de descartar que o Paraguai já conta com serviços de inteligência ligados aos Estados Unicos, cujo objetivo é desarticular a resistência campesina. Entre os grupos estão: CIA, Plano Colômbia e Mossad – inteligência secreta de Israel. Segundo ele, já faz tempo que o Paraguai se prepara para a luta “antiterrorista” e este atentado dá carta verde para o país intensificar as negociações com os Estados Unidos. "Nós sabemos que há um trabalho de inteligência que vem sendo desenvolvido na região com o apoio de importantes grupos internacionais na questão da segurança e inteligência na luta contra a insurgência, e se chama CIA, Gaula [Grupo de Ação Unificada Pela Libertação Pessoal] e Plano Colômbia", denuncia.

Golpe Legitimado e criminalização dos movimentos sociais

O atentado aconteceu dois dias depois de o novo presidente ter tomado posse, por isso, o ativista dos Direitos Humanos afirma que “os primeiros cem dias do governo serão voltados penas para intensificar ações de repressão aos grupos campesinos com a desculpa de combater o terrorismo”. Vale lembrar que o líder camponês Lorenzo Areco foi assassinado um dia antes da posse de Cartes no município de Yby Yau e o governo não fez nenhum pronunciamento a respeito. Este foi o quarto assassinato seletivo realizado nos últimos dez meses no Paraguai.

Em entrevista ao Portal Vermelho, um dia antes do atentado, Cecília Vuyk, militante do Movimento 15 de Junho – movimento social criado para lutar pela questão da reforma agrária – já sinalizava preocupação quanto à intensificação da perseguição à luta campesina.

Segundo ela, foi um erro a esquerda paraguaia ter concorrido novamente às eleições presidenciais, isso legitimou o Golpe Parlamentar realizado em 21 de junho de 2012 que depôs o então presidente Fernando Lugo. Agora que o país volta, supostamente, ao regime democrático, a solidariedade internacional com os movimentos sociais perde a intensidade. Assim, a luta camponesa pela reforma agrária fica mais vulnerável às medidas extremistas sinalizadas pelo governo de Horácio Cartes.

O militante do mesmo movimento, Alberto Britez, considera que “o governo do partido Colorado vai desenvolver um capitalismo moderno vinculado ao agronegócio sobre um sistema quase feudal que ainda existe no Paraguai”.